Por muito que se tente, uma mentira repetida indefinidamente não se transforma em verdade. Pode-se enganar muita gente durante muito tempo mas não se pode enganar toda a gente durante todo o tempo. Por muito que se tente, já não é possível – tantas são as evidências – fazer crer a partes cada vez maiores da população que, passar para grandes interesses privados empresas que devem pertencer a todos é benéfico para a maioria. Mesmo assim, usam-se todos os artifícios possíveis para beneficiar terceiros à custa dos bens públicos. É uma clara opção ideológica pelo ódio a tudo o que é Estado ainda que à custa dos mais desfavorecidos. Actualmente, os detentores do poder – de facto – já se dão ao luxo de promover privatizações a torto e a direito, porque sim. Nem sequer arquitectam uma razão minimamente verosímil. Está aqui um bom tema para o texto de Daniel Oliveira que recolhemos do “Expresso” de ontem.
AGORA ÀS CLARAS
Nos anos 80 e 90 começou, um pouco por toda a Europa, a vaga de privatizações. Passadas duas décadas, vale a pena ver se se cumpriram as promessas desse processo essencialmente ideológico. Prestaram-se melhores serviços? São mais baratos? Garantem maior igualdade de oportunidades no acesso a bens essenciais? As contas do Estado estão em melhor saúde? Os contribuintes pagam menos impostos? A Europa é um bloco económico mais forte? A tudo, a resposta é não. E em Portugal? A privatização das empresas de energias garantiu melhor serviço, a preços mais baixos, aos consumidores? As empresas que operam em Portugal passaram a ter custos de contexto mais favoráveis? Os serviços melhoraram? Também não. No essencial, europeus e portugueses não ganharam nada com as privatizações. E, no entanto, insiste-se no erro.
O Governo está a privatizar o que sobra. Empresas que dão lucro ao Estado, como os CTT. Empresas que são monopólios naturais, como a REN. Empresas que garantem o mais essencial dos bens, como as Águas de Portugal. Empresas fundamentais para a soberania económica, num momento em que o Estado não consegue controlar a variável monetária, como a TAP e a ANA. Não restando, para nenhum destes casos, os falsos argumentos do passado, fica o da necessidade de recursos financeiros para o Estado. Que o próprio Estado se encarrega de desmentir. Na EDP, oferece aos compradores dividendos que eram seus. Na RTP, avança-se com a ideia de pagar, em vez de receber, por uma privatização encapotada. Se olharmos para todas as propostas para a RTP que o ministro e o consultor com equivalência a ministro têm em cima das suas secretárias, percebemos que há apenas uma constante: dê dinheiro ou perca-se dinheiro, tudo o que interessa é garantir a existência de um novo canal privado de televisão. Ou seja, mais do que os interesses financeiros do Estado, são os negócios de terceiros que movem Relvas e Borges.
A única novidade é o descaramento. Foi exatamente assim que, grande parte das privatizações fundamentais, foram feitas. Só que depois de provada a falácia em que se basearam, resta a capacidade de impor, sem vergonha, o indefensável. Torna-se finalmente claro que os supostos liberais nunca defenderam menos Estado na economia. Apenas o querem ao serviço de poucos. Transformando os contribuintes num saco sem fundo onde se vai buscar a renda para negócios onde nunca se perde.
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