Tem sido repetidamente manifestado pelo Bloco de Esquerda que políticas de direita constituem o seu inimigo principal, independentemente de quem as defenda. Neste sentido, a linha que separa actualmente a direita da esquerda é constituída pela troika. A oposição às medidas de austeridade protagonizadas por aquela entidade definem quem se encontra à esquerda e defende políticas alternativas que coloquem um travão ao descalabro económico e à destruição do nosso tecido social. Na realidade, o PS encontra-se comprometido com estas políticas e, se não romper definitivamente com elas, será impossível encontrar-se um caminho que nos conduza à saída da crise.
No texto seguinte (*) é Henrique Neto, um conhecido empresário do PS, que reconhece a falta de ideias reinante no seu partido dentro do actual quadro espartilhado pelas políticas neoliberais.
A principal crise é a das ideias
O líder parlamentar do PSD Luís Montenegro afirmou em conferência de imprensa que “o PS andava há meses a tentar encontrar um motivo para fugir às suas responsabilidades e parece tê-lo encontrado”. E que motivo! O mais estúpido, incoerente e atabalhoado conjunto de medidas que a ignorância da realidade portuguesa poderia ter encontrado para dar cabo do que resta da economia. Espantosamente, o Ministro da Economia não abriu a boca.
De facto o PS tem grandes responsabilidades, disse-o ao longo dos anos e digo-o agora. E dificilmente o PS poderá superar essas responsabilidades enquanto andar a fugir de as enfrentar. Mas isso nada tem a ver com a incapacidade do actual Governo para fazer as reformas que o país precisa e com a falta de coragem para enfrentar os sectores rendeiros do regime e as oligarquias que vivem à custa do erário público. Ao mesmo tempo, meteu-se na cabeça do Governo que é preciso fazer bater no fundo a produção nacional, a classe média e os trabalhadores por conta de outrem, para recuperar a economia.
Trata-se de um erro trágico, de quem apenas conhece a economia aprendida nos livros: Pedro Passos Coelho, Vítor Gaspar, Álvaro dos Santos Pereira e, já agora, a Troika, no caso de ter partido daí, como se diz, a ideia peregrina de aumentar a participação dos trabalhadores na Taxa Social Única. Para mais, para financiar as empresas e, em particular, os grupos económicos mais ou menos monopolistas orientadas para o mercado interno e para a exploração das famílias e do sector exportador.
Compreende-se, Pedro Passos Coelho leva a sério o seu papel de retribuir aos seus patronos, enquanto Primeiro-Ministro, os favores de o terem colocado em posição de chegar a S. Bento. Na continuação, aliás, do percurso idêntico de José Sócrates, com a diferença apenas de que o anterior PM usou o endividamento do Estado até ao limite nesse favorecimento, o que deixou de ser possível. Agora, que o Estado está falido, a classe média e os trabalhadores que paguem a crise.
A reacção imediata do PS às medidas do Governo, através de Carlos Zorrinho, foi uma frustração, por esquecimento da máxima de António Guterres de que não há uma segunda oportunidade para provocar uma primeira impressão. Depois a coisa melhorou com a intervenção do líder, mas permanece o problema essencial do PS de António José Seguro: a falta de ideias para um programa consistente para a recuperação da economia portuguesa, baseado na mudança de paradigma usado pelo Governo, que parece ser o de concorrer com a China. A ideia vigente do Laboratório de Ideias do PS de não apresentar resultados até 2015 é tão frustrante quanto as incursões na economia do líder parlamentar.
O raciocínio do PS neste domínio de não fazer propostas concretas em alternativa às do Governo é simples e segue a habitual cartilha dos partidos em Portugal: apresentando ideias alternativas às do Governo, os partidos sujeitam-se ao desgaste provocado pelos ataques dos outros partidos e dos chamados especialistas na comunicação social. A outra possibilidade é a do PS não ter quaisquer ideias e, por força do raciocínio anterior, também não as procurar.
Seja como for é um erro, porque acredito que vivemos tempos de mudança e de pesquisa de novas soluções que ainda não estão nos livros o que faz um grande apelo à união do conhecimento prospectivo dos empresários e do poder político democrático. É essencial a união dos portugueses com a experiencia e a capacidade para desenhar uma nova estratégia para Portugal sair da crise, o que muitos leitores poderão pensar não ser possível. A esses leitores apenas posso assegurar que sem tentar, estudar e trabalhar para encontrar um modelo alternativo de desenvolvimento, não haverá com toda a certeza solução.
Pela minha parte, uma convicção e uma certeza. A convicção é a de que Portugal pode vencer a crise com uma estratégia igual ou semelhante à estratégia que apresentei, há quase um ano, em livro e já tinha, no essencial, apresentado em duas moções a dois congressos do PS há uma década. A certeza reside em que as actuais políticas do Governo PSD/CDS conduzirão inevitavelmente a mais empobrecimento da maioria dos portugueses e a uma democracia cada vez mais condicionada.
(*) Diário de Coimbra, 14/9/2012
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