quarta-feira, 3 de abril de 2019

RECONHECER E COMBATER AS DESIGUALDADES



A desigualdade da distribuição da riqueza é um flagelo a nível global ainda que a níveis diferentes de país para país. Esta situação traduz-se directamente nos graus de bem-estar de largas camadas da população e é fonte de intermináveis e sangrentos conflitos à escala da humanidade, com milhões de vítimas inocentes, em particular, entre os estratos mais pobres.
A autora do artigo de opinião seguinte, que recolhemos do “Público” de hoje, Catarina Albuquerque (*), começa por referir uma conhecida e chocante estatística segundo a qual “o 1% mais rico da população mundial detém mais de 50% da riqueza do planeta”. A ninguém no seu verdadeiro juízo lhe pode passar pela cabeça que os detentores destas riquezas fabulosas necessitem delas para terem uma vida digna. Mas, o pior de tudo é que poderiam investi-las para criação de empregos, preferindo em vez disso aplicá-las na especulação financeira.
De qualquer maneira, Catarina Albuquerque coloca no texto de que é autora o destaque no reconhecimento das desigualdades para que as mesmas possam ser combatidas.

O 1% mais rico da população mundial detém mais de 50% da riqueza do planeta e a disparidade está a crescer. Mas será que o enfoque no dinheiro ajuda a compreender as desigualdades? Ou atua como uma cortina de fumo que nos impede de ver outras causas? Ao desafiar noções instituídas, proponho cinco formas de alcançar mudanças objetivas para lidar com a desigualdade. 
1. Reconhecer quem foi “deixado para trás"
Precisamos de dados concretos sobre quem foi “deixado para trás” para implementar políticas, estratégias e orçamentos corretos. Muitos países não sabem quem é excluído do acesso aos serviços de abastecimento de água e saneamento, ou porquê. Isto, porque estes indivíduos são invisíveis. Uns estão confinados em casa (pessoas idosas, ou com deficiências), uns ‘fora de vista’ (longe dos centros administrativos) e outros são sem-abrigo, ou moradores de bairros informais. É preciso fazer perguntas difíceis: quem está a ser excluído, que desigualdades existem, porquê? Este é um tema central da Reunião de Ministros do Setor organizada pela Sanitation and Water for All.
2. Entender como as desigualdades se acumulam
As desigualdades funcionam por camadas, e o impacto acumula-se onde os indivíduos pertencem a mais do que um grupo discriminado. As pessoas com deficiências são estigmatizadas, mas se acrescentarmos as limitações culturais impostas às mulheres, e a discriminação contra certos grupos étnicos ou linguísticos, as desigualdades sentidas por mulheres deficientes pertencentes a uma minoria étnica são tremendas.
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3. Desafiar o estigma: a discriminação socialmente aceitável
O estigma é socialmente construído e aceite. As pessoas estigmatizadas, como os sem-abrigo, mulheres e raparigas menstruadas, refugiados, comunidades ciganas, os Dalits e mulheres que sofrem de fístula obstétrica são frequentemente vistas como inferiores – sem o reconhecimento de que a sua falta de acesso à água contribui para a sua estigmatização. Intervenções direcionadas podem abrir os nossos olhos para os nossos próprios preconceitos e propor ações para superá-los.
4. Rejeitar o mito do “efeito multiplicador": o último deve ser o primeiro
A ideia do “efeito multiplicador” é que ao oferecer melhores serviços aos que pagam mais, os serviços públicos aumentarão rendimentos e estenderão serviços aos mais vulneráveis. Mas a realidade é outra. Em muitos casos, os que vivem em áreas formais com bons serviços municipais pagam tarifas baixas; enquanto que os residentes de bairros informais, pagam muito mais, por serviços de pior qualidade. Os governos e as empresas de serviços públicos devem priorizar investimento nas áreas mais pobres.
5. Rever a nossa linguagem
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Para garantir igualdade no acesso aos serviços, temos que mudar a linguagem. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável exigem que não “deixemos ninguém para trás”, que nos foquemos nos mais pobres dos pobres, nos da “última milha”. Mas a perceção é que só abordaremos os “mais difíceis de alcançar” no final do processo; em vez de colocar essas pessoas em primeiro lugar. Para alcançar serviços inclusivos, a linguagem tem que reconhecer e combater as desigualdades, e não reforçá-las.
(*) CEO da parceria global da ONU Sanitation and Water for All

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