O
facto fundamental no contexto do conflito israelo-árabe e que foi o ponto de
partida para a instabilidade permanente que se vive no Médio Oriente é o estado
judeu ser o “poder ocupante” de uma terra que pertence legitimamente à
Palestina e aos palestinianos. Enquanto esta injustiça não for resolvida, a paz
naquela zona do mundo será sempre muito escassa e constituirá apenas intervalos
de conflitos armados e sangrentos.
Nenhum
povo do mundo deixaria de reagir se visse a sua terra ocupada pela força por outros,
qualquer que seja o motivo evocado. Por isso, os palestinianos têm toda a
legitimidade de recorrer aos meios necessários para expulsarem o invasor do seu
território.
A
solidariedade para com o povo mártir da Palestina deve manifestar-se sempre que
possível e, é esse o motivo pelo qual aqui deixamos um artigo de opinião que Hikmat
Ajjuri (*) que transcrevemos do Público de hoje.
Os
mais recentes documentos do Daesh que vieram a público, em que se atesta o
recrutamento de jovens de 50 países, 30% destes de três dos mais poderosos
países europeus, devem ser motivo de alarme para todos nós.
Uma
organização terrorista como o Daesh, que usa uma religião monoteísta — o Islão
— como cobertura para todas as suas acções maléficas de lavagem cerebral e
recrutamento de jovens de 50 países, não pode ser derrotada apenas por meios
militares. Aliás, na verdade, a resposta militar contra o terrorismo, através
de todos os tipos de armas dos 60 países aliados, perpetua a guerra,
alimentando, mesmo que sem intenção, o processo de lavagem dos cérebros do
Daesh de jovens vulneráveis. Estes jovens, venham de onde vierem, sofrem,
seguramente, pelas suas queixas ignoradas ou por diversos tipos de injustiças
sociais, financeiras, políticas ou outras.
Os
recrutas que deixam o cómodo padrão europeu de vida para irem matar e serem
mortos sem pressão de ninguém, a não ser da sua própria vontade e convicções
erradas, não podem ser combatidos por qualquer tipo de militarismo ou armas de
destruição maciça.
As
horríveis imagens mostradas nos canais de TV, que chegaram e ainda continuam a
chegar de todos os campos de batalha, são repugnantes, pura e simplesmente pela
sua natureza desumana.
A
diferença entre a espécie humana e animal é exactamente o seu carácter de
humanidade, componente fundamental e integral de cada ser humano. O dever de
todos é garantir que esta humanidade prevaleça e que não exista um único ser
humano privado dela, sem olhar a pretextos, políticas, ganâncias, glórias ou
mesmo insanidades.
A
este respeito podemos considerar que, por exemplo, matar um jovem palestiniano
— que alegadamente tinha uma faca — com mais de 40 balas reais a uma distância
de 100 metros, ou matar uma criança palestiniana, às vezes a distância zero,
apenas para dissuadir os seus companheiros, acções de soldados israelitas, são,
definitivamente, actos desumanos, praticados por mãos de seres humanos.
Ironicamente, estas vítimas palestinianas estão a tornar-se os assassinos, aos
olhos daqueles que os condenam para absolver o real criminoso. Esta condenação
serve, por si só, o interesse das agências de recrutamento de
terroristas, como o Daesh.
Tendo
em conta que Israel é o poder ocupante e a Palestina e os palestinianos são os
ocupados, esta política irresponsável de alguns políticos ocidentais provoca e
atrai a atenção dos ditos jovens, em particular, daqueles que nasceram nas
democracias europeias e se alimentaram com o seu leite de igualdade e direitos
humanos. Quando as forças democráticas se unem e fazem alianças com ditaduras,
independentemente da natureza dessas alianças, as democracias ficam iguais às
ditaduras e não o contrário.
Contraditoriamente
os Estados Unidos, supostos guardiões da liberdade e da democracia mundial,
destruíram países para proteger a ONU e as suas resoluções, ao mesmo tempo que
também destruíram as resoluções da ONU para proteger um país, Israel.
Esta
confusão, equiparada à esquizofrenia política, levanta a dúvida de se esta
escola de pensamento envolve todas as pessoas nos Estados Unidos, ou se é
apenas a administração política à qual o mundo inteiro confiou a
responsabilidade de resolver o conflito israelo-palestiniano.
Um
rabino norte-americano, durante a guerra norte-americana no Vietname, disse que
numa “democracia, quando poucos são culpados todos são responsáveis”. Também um
ex-secretário norte-americano nos disse, nas suas memórias, que a
“Constituição” da ONU “é uma versão condensada da Constituição
norte-americana”. Eu, neste contexto, atrevo-me a dizer que estes pensamentos
inspiradores devem obrigar os norte-americanos a observar os seus valores,
traduzindo as suas palavras em actos — porque só assim a questão, que já foi
levantada pelo ex-presidente Bush júnior, “Porque nos odeiam?”, se tornará
legítima.
Mas,
até que este enigma seja resolvido, a Europa, o Velho Continente e fonte dos
valores humanos, é obrigada a intervir. Desta feita, com todo o seu poder
político originado a partir dos seus poderes económicos, científicos,
culturais, e, os mais importantes, geopolíticos.
O
verdadeiro desafio que a Europa enfrenta neste contexto e nesta fase é,
portanto, o pleno reconhecimento do Estado da Palestina, como meio para acabar
com este recrutamento humano e convencer os milhares de jovens alvo de lavagem
ao cérebro de que estão no caminho errado.
(*) Embaixador
da Palestina
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