domingo, 17 de junho de 2012

TERROR NEOLIBERAL

A luta dos mineiros das Astúrias pelos seus postos de trabalho tem tido uma fraca divulgação, pela nossa comunicação social, atendendo à importância dos acontecimentos. O corte do apoio do Estado à formação e à segurança das minas de carvão fará com que muitas delas possam fechar, ao mesmo tempo que milhares de pessoas ficarão no desemprego. A reacção dos mineiros asturianos não se fez esperar, o que deu origem a muitos confrontos com a polícia como podemos visualizar nos vídeos postados neste blog há poucos dias. Trata-se de mais uma acção brutal de um governo de direita, com o aval das forças do neoliberalismo mundial. Para esta doutrina, problemas sociais criados por despedimentos em massa, são apenas danos colaterais, coisas de somenos importância.

O texto seguinte foi recolhido na 2 do “Público” de hoje e constitui uma espécie de homenagem àqueles que laboram numa das profissões mais perigosas do mundo, a de mineiro.


ASTÚRIAS: UM TRABALHO EM VIAS DE EXTINÇÃO

Cá em cima, há lutas de corpo a corpo, tiros, pedras a voar, feridos e detenções. Lá em baixo, a 800 metros de profundidade, sem sol, com frio e uma humidade altíssima, um pequeno grupo de homens resiste de outra forma. Também estão de greve, mas escolheram para protestar o exacto lugar onde trabalham — o fundo da mina de carvão de Santa Cruz del Sil, nas Astúrias, Espanha. As suas mulheres, que fazem vigília à entrada da mina, contaram que um dia eles desceram para trabalhar e não voltaram a subir. Isso foi há três semanas. Partilham 40m2 cada vez mais irrespiráveis. Um foi obrigado a subir pelo médico, já não conseguia respirar. Está muito estudada a saúde dos mineiros, que desenvolvem doenças crónicas graves, como enfisemas, e morrem mais e mais cedo do que na maior parte das profissões. Nos EUA, a maior taxa de mortalidade é nas comunidades de mineiros, década após década, sempre igual desde que estas estatísticas existem. Os homens desta imagem estão tranquilos e transmitem até uma inesperada suavidade. Olham a câmara nos olhos, só um a evita. Não construíram uma pose dura, artificial, e isso é um alívio para quem os observa. Sabemos que os mineiros são isso mesmo, não precisam de montar um falso cliché. Eles dizem que não saem do fundo da mina até haver uma solução e olhando para eles acreditamos. Noutras fotografias de César Manso, da agência France Press, vemo-los a conversar, a jogar às cartas, a dormir. Restam sete. Mas, tanto cá em cima como lá em baixo, todos lutam por uma profissão em vias de extinção. Ser mineiro de carvão, diz a União Europeia, vai acabar mais cedo ou mais tarde. Bruxelas quer energias mais limpas e quer que os Estados deixem de apoiar o sector. O primeiro-ministro Mariano Rajoy acaba de anunciar isso mesmo — um corte de 63%, o que fará desaparecer por inteiro o apoio do Estado à formação e à segurança das minas. Muitas poderão fechar. Milhares de pessoas terão de reinventar as suas vidas. Cá em cima, como há 150 anos, os caminhos-de-ferro estão bloqueados com toros. Há fogueiras e estradas cortadas e mineiros a disparar foguetes artesanais contra a Guarda Civil. A greve tem-nos dado remakes das imagens clássicas dos mineiros que conhecemos das fotografias de Sebastião Salgado — mas também do tempo em que ainda não havia fotografia. Estão nos desenhos de Vincent Van Gogh, que antes de inventar o impressionismo tanto se impressionou com o sofrimentos dos mineiros no fim do século XIX — e os retratou a carvão. E estão no Germinal, de Émile Zola, publicado uns anos antes. Como Van Gogh, Zola passou alguns meses numa pequena vila mineira para ver tudo de perto. O seu pretexto foi, justamente, uma greve. (Bárbara Reis)

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