Um dos aspectos mais significativos das recentes manifestações contra membros do Governo quando estes se preparavam para falar, em especial no que diz respeito ao inefável Relvas, teve origem onde menos se esperava, ou seja, em várias figuras de proa do PS. Para além da retórica, o que fica em política são as acções concretas que vão definir o que pretende quem as levou a cabo. As tomadas de posição de, por exemplo, Augusto Santos Silva e Francisco Assis, pela forma que tomaram, quase convertem Relvas de algoz em vítima, sem mais uma palavra que realce os antecedentes que originaram a contestação. Quando Assis afirma que “Miguel Relvas foi vítima de actos civicamente inaceitáveis e, por isso mesmo, absolutamente condenáveis. Ponto final. O resto não é para aqui chamado” está objectivamente a contribuir para o branqueamento de uma figura do Governo, execrável para a esmagadora maioria dos portugueses, um dos principais rostos do inferno em que o país se tornou para quase todos nós. É mesmo “o resto” que tem de ser “para aqui chamado” porque, não tenhamos dúvidas que sem “o resto” a contestação ao Governo, seja no seu aspecto colectivo seja na pessoa de cada um dos seus membros, não teria lugar.
Curiosamente ou talvez não, também o deputado do PSD, Campos Ferreira, no Correio da Manhã de hoje, afinava pelo mesmo diapasão de Assis ao afirmar sobre o mesmo tema que “não está em causa o direito à manifestação, ao descontentamento, ao protesto” quando é exactamente isso que ambos, cinicamente, colocam em causa. O que os dois membros da troika interna gostariam que acontecesse é que ninguém levantasse voz para contestar as malfeitorias a que estamos a ser sujeitos, cada vez de forma mais violenta. Em causa está mesmo o direito dos mais fracos erguerem a voz para reclamarem sobre os seus direitos espezinhados. Há “razões” mais que suficientes para olharmos o “futuro com preocupação”.
As dores de Relvas tomadas por Augusto Santos Silva em entrevista televisiva são hoje objecto da crónica que Viriato Soromenho Marques assina semanalmente no DN. Dando-lhe um tom algo irónico, que o tema pede, o professor universitário começa por afirmar: Tomei conhecimento do duplo incidente com o ministro Relvas através de uma entrevista televisiva ao ex-ministro socialista Augusto Santos Silva. A indignação deste era tanta, por causa dos maus tratos de que o primeiro teria sido vítima, que julguei ter ocorrido uma nova "Noite Sangrenta" em Lisboa. Pensei que Relvas tinha sido metido numa camioneta, tal como António Granjo, Machado Santos e outros infelizes, assassinados na noite de 19 de outubro de 1921 por marinheiros revoltados.
À atenção dos portugueses, para memória futura: Campos Ferreira, Santos Silva e Assis são farinha do mesmo saco que, no essencial, pouco diferem, por muito que queiram fazer-se distinguir.
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