segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O EXEMPLO DA ADSE


A linguagem da direita em relação aos serviços públicos é sempre a mesma. Há que os denegrir o mais possível para que tudo o que seja susceptível de dar lucro passe para a esfera privada. Acontece assim com a educação, com a segurança social e com a saúde, para mencionarmos os grupos mais importantes e mais sensíveis para o comum dos cidadãos. Curiosamente é, em muitos casos, o Estado que mantém a sustentabilidade de imensas instituições privadas, à custa de muitos serviços que essas instituições prestam ao sector público. É o que acontece, por exemplo, com a ADSE que aguenta os hospitais privados como afirma a Isabel do Carmo, conhecida médica endocrinologista, no seguinte artigo que transcrevemos do Expresso do último sábado.



Quem sustenta os hospitais privados? A ADSE

Quem suporta economicamente a prestação de serviços privados na Saúde é o “monstro”, designação por que é conhecido o Estado (supostamente social) pela direita política, que coincide com aqueles que defendem os serviços privados de Saúde. É um curioso espetáculo de hipocrisia quando os vemos atacar o Estado, os seus “maus” serviços, o seu “desperdício”, sabendo que sem os pagamentos feitos pelo Estado as grandes instituições privadas seriam insustentáveis.

Os hospitais privados só o são nos proventos. De facto uma parte substancial do seu orçamento (trinta por cento?) está dependente dos pagamentos dos serviços prestados a beneficiários da ADSE. O Estado paga e paga sem atraso. No dia em que essa fatia de venda de serviços ao Estado deixasse de funcionar, faliam.

Além da ADSE os hospitais privados são pagos por companhias de seguros, as quais em Portugal têm uma cobertura pequena da população. A restante fatia é paga por particulares, sendo que em Portugal a fração da população com capacidade económica para pagar custos elevados é pequena; é também uma questão de escala. Não estamos a falar dos serviços de consulta privada em consultórios, mas sim de internamentos, exames auxiliares de diagnóstico, tratamentos caros. Portanto, os hospitais privados dependem da ADSE, isto é, do Estado. que só é “monstro” quando se trata de educação pública e Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Ao contrário da prontidão de pagamento aos privados, a ADSE deve milhões aos hospitais públicos (no caso do hospital de Santa Maria 31.416 milhões), que não tem qualquer esperança de recuperar a dívida. Isto é, n Saúde, o Estado é bom pagador aos privados e é mau pagador ao SNS. Aquilo que o Estado (Ministério das Finanças) coloca para pagamentos da ADSE aos privados, além dos proventos desta (descontos dos beneficiários) bem podia ser injetado no SNS que muito precisa.

Todavia a discussão sobre a ADSE e seus benefícios é complexa. E já começamos a ouvir os espontâneos que sabem discutir aeroportos, pontes, TGV, a rotunda do Marquês, agora a darem opiniões abalizadas sobre a ADSE, antes de as pessoas com conhecimento se confrontarem e afrontarem as soluções.

De facto as pessoas que são beneficiárias da ADSE descontaram durante toda a vida para este subsistema, ao que são mais velhos enquanto eram jovens e saudáveis e de pouco precisavam. Esse desconto fazia parte de um contrato social. Esse contrato social tem de ser respeitado, mantendo alguns benefícios. E considerando que todo o beneficiário da ADSE tem direito ao SNS como qualquer cidadão. Outra questão é este mecanismo estar a servir para a promiscuidade público-privada.

Mas a questão talvez mais sensível seja a eleitoralista. Todos os partidos sabem quanto pesam s votos dos funcionários públicos. E os discursos têm de ser descriptados.

Todavia, todos sabem também o que está escrito no acordo do memorando com a troika, logo na primeira versão. Aí constava que era necessário cortar trinta por cento nas despesas do Estado com a ADSE. Resta pois discutir se o corte é nos óculos, nos aparelhos auditivos, nas cadeiras de rodas ou se nos pagamentos ao Grupo Mello ou ao Grupo BES.

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