domingo, 6 de setembro de 2015

E A CRIAÇÃO DE EMPREGOS?


Aqui fica mais um texto de uma personalidade (*) a desempenar um cargo fora do âmbito partidário, onde se desmascara, com argumentos oficiais, a propaganda da maioria de direita, no sentido de que nos encontramos a viver no melhor dos mundos, mesmo muito próximos dos amanhãs que cantam. A táctica da coligação PSD/CDS é, como frisa muito bem Pacheco Pereira no seu artigo de opinião que aqui deixámos ontem, a de recorrer às estatísticas que jogam a seu favor, mesmo que escassamente, desprezando, de todo, a estatísticas sociais que são uma calamidade em especial no que diz respeito ao emprego com direitos.  
É bom que não nos iludamos, e este texto constitui mais um alerta para a necessidade de implementação de políticas diferentes das actuais, qualquer que seja a cor partidária do próximo governo. As pessoas não são números nem estatísticas e não vivem do ar…
Nos últimos 15 dias várias interpelações me foram dirigidas sobre a justeza de afirmações que fiz no último artigo aqui publicado, o de 21 de Agosto, especialmente as referentes ao emprego cada vez mais precário e pior remunerado e ao campeão da contratação, o contrato a termo. E de como afinal, pela recuperação do emprego em curso, deveríamos estar reconhecidos aos timoneiros sagazes que nos conduziram por rota adequada, repleta de escolhos, sim, mas corajosamente enfrentados e ultrapassados.
Os mais extremistas, de diálogo quase impossível, chegam a invocar a calamidade dos desembarques na costa europeia de centenas de milhar de fugitivos da fome, da guerra, da sem esperança, quando não da morte certa, como uma realidade a não perder de vista quando se invoca a insatisfação.
Os mais moderados, mais inteligentes também, são mais subtis. Preferem apontar o “caso grego” e o que nos teria acontecido, não fora…
Ora a verdade é que quis e continuo a querer confinar-me às análises sociais no que escrevo aqui, em detrimento, no possível, de incursões ou excursões políticas e sempre absolutamente fora das políticas partidárias.
Lamento a calamidade migratória em curso a que a Europa tem de responder com mais empenho e soluções comuns, repudiando muros e construindo pontes de diálogo, com resolução dos problemas na origem, de cuja deflagração não tem por onde lavar as mãos, afirmando os seus seculares princípios humanitários, sem poder, no entanto, desproteger os seus próprios cidadãos.
É tarefa difícil, bem sabemos, numa Europa que ainda pouco deixou de ser o que começou por ser, uma mera Comunidade Económica, mas é tarefa inadiável, de atenção prioritária.
Receio que a Europa, tão boa, empenhada e firme a resolver questões de dinheiro a favor do dinheiro, não o seja tanto a resolver questões de pessoas a favor de pessoas. Daí que lamente, também, o “Caso Grego”, que somado ao Português e visto o percurso desta crise humanitária até ao momento, reforçam o receio atrás exposto.
Para que não fiquem dúvidas sobre a justeza do que se escreveu há quinze dias e na certeza de que a abordagem e solução de uns problemas não é, nem pode ser, impeditivo da abordagem e resolução doutros problemas, deixo mais algumas notas sobre o emprego hoje em Portugal, inequivocamente mais precário e em degradação remuneratória bruta assinalável, exceptuando, em alguma medida, governante, deputados ou magistrados e algumas polícias.
Há hoje, segundo dados do INE, mais de um milhão de trabalhadores em Portugal a ganhar menos de 600,00€ por mês, dos quais 2/3 são mulheres. Há mesmo 500.000 a ganhar menos de 419,22€ (valor indexante dos apoios sociais). Dos desempregados, cerca de 40% já nada recebe, nem subsídio de desemprego, nem subsídio social. Dos empregos criados neste ano de 2015, cerca de 65% foram por contrato a prazo.
E é bom não esquecer que hoje se trabalha mais tempo do que o máximo semanal legal, sem registo e sem pagamento, em muito significativo número de situações, mas, por deficiente controle da ACT – Inspecção do Trabalho, sem meios humanos e materiais suficientes, são impossíveis de contabilizar em estatísticas adequadas. E o trágico é que assim os manteremos por muitos e longos anos, ora melhorando um pouco, ora piorando mais, enquanto não houver concertação política planetária que acabe com a inaceitável desregulação dos Mercados Financeiros, com a ausência de limites às possibilidades de escandalosos ganhos por especulação, ou que elimine os Infernais Paraísos Fiscais.
(*) Amaro Jorge, Presidente do Conselho Distrital de Coimbra da AO, Diário de Coimbra

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