É
muito oportuna uma referência ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) no dia em que
se comemoram 37 anos da sua criação.
O
apoio generalizado que o SNS tem na sociedade portuguesa não tem impedido que a
direita, quando no poder, lhe tenha desferido vis ataques tendentes à sua
destruição, para transformar a saúde num suculento negócio para a iniciativa
privada. Se é verdade que alguns objectivos deste projecto já foram atingidos,
não é menos verdade que muitos outros foram derrotados pela resistência do povo
português através de muitas forças que o representam.
É,
pois, muito importante, que neste dia se reflicta sobre a importância de manter
vivo e actuante o SNS, sem esquecer que cada dia é dia de o preservar na sua essência.
O
artigo de opinião assinado por Miguel Guimarães, Presidente do Conselho Regional do Norte da
Ordem dos Médicos, transcrito do Público de hoje, é a forma que escolhemos de
assinalar o 37º aniversário do SNS.
Se
existe opinião consensual na sociedade portuguesa, a ideia que é na saúde que
existe o melhor serviço público do país será, seguramente, uma das mais
frequentes. Para muitos, pode não passar de um lugar-comum, debitado consoante
os ventos políticos que sopram no momento. Mas, para os profissionais que nele
trabalham, é, além de uma constatação justa, o reconhecimento mínimo perante a
complexidade do trabalho que desenvolvem.
Diga-se
o que se disser, são eles que constituem, de facto, o maior activo do Serviço
Nacional de Saúde (SNS). São protagonistas e embaixadores em simultâneo. Vestem
a camisola da causa pública. Compreendem a importância e dimensão do seu
trabalho, que garante um acesso justo e equitativo à Saúde. Que providencia
bem-estar e qualidade de vida a uma população que não tem oportunidade de
recorrer a outros cuidados. E que assegura a manutenção de um serviço público
que, pela sua natureza e definição, irá sempre garantir o que o sector privado
não terá interesse em oferecer.
Olhando
o exemplo dos médicos, vejo na esmagadora maioria dos 26 mil colegas que
trabalham no SNS extraordinários exemplos de competência, idoneidade e
dedicação. São públicos os nossos motivos de descontentamento: não existimos em
número suficiente para as necessidades hospitalares e nos cuidados de saúde
primários; trabalhamos com meios escassos e estruturas subfinanciadas; estamos
constrangidos no acesso a meios de diagnóstico e terapêutica; penamos numa
arquitectura informática pesada, burocrática e ineficiente; somos efectivamente
mal pagos para o nível de qualificação técnica e de responsabilidade que a
profissão exige.
É
indesmentível que as condições são precárias. Poderia citar inúmeros exemplos
concretos que tive oportunidade de constatar nos anos em que exerço funções
dirigentes na Ordem dos Médicos. Cito dois em particular e dos mais recentes, o
Hospital de Vila Real e o Centro de Saúde Fernão de Magalhães, em Coimbra. O
primeiro é um verdadeiro estudo de caso: uma unidade que é sede de um Centro
Hospitalar – Trás-os-Montes e Alto Douro – com mais de 450 mil utentes na sua
área de intervenção, que é classificada pelo Ministério da Saúde como um
hospital polivalente, mas cujos serviços estão de tal forma carenciados em
termos de médicos que, na realidade, a prestação de cuidados está mais próxima
de um hospital menos qualificado. O segundo exemplo, que pude testemunhar há
poucos meses atrás, é possivelmente das unidades de saúde com condições físicas
mais precárias e inseguras que já vi. Um espaço assustador, que desafia a
integridade física dos profissionais e utentes, e que envergonha um país do
mundo civilizado.
Os
dois casos que refiro têm um aspecto comum: o exemplar sentido de compromisso
dos seus médicos e restantes profissionais. O testemunho que recolhi em ambas
as instituições - replicável em muitas outras - é de resiliência face às
dificuldades e de uma grande dedicação aos respectivos serviços, que coloca os
doentes e a ética profissional acima dos interesses individuais.
Esta
é, felizmente, a regra e não a excepção. Os médicos não são privilegiados de
coisa nenhuma. São servidores públicos de excelência e representam o que de
melhor o país consegue produzir em termos académicos, técnicos e científicos.
De resto, se o SNS consegue comparar, muitas vezes favoravelmente, com sistemas
de saúde em países mais desenvolvidos, em muito se deve à competência e
qualidade dos seus quadros.
Haja também consenso político
nesta matéria. No dia em que se assinalam os 37 anos do Serviço Nacional de
Saúde, reconheça-se e valorize-se o trabalho daqueles que o constroem
diariamente.
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