quinta-feira, 27 de outubro de 2011

LUTA SEM TRÉGUAS

A luta sem tréguas contra o Orçamento do Estado (OE) para 2012 é uma inevitabilidade. Todos aqueles que possuam informação e tempo para a divulgarem, não podem perder qualquer hipótese de o fazer. O texto seguinte foi publicado na “Visão” da semana passada. Nele se denuncia a forma como vão ser tratados os factores trabalho e capital, com benefício claro para este, as consequências da quebra brutal do rendimento das famílias nas receitas fiscais e, por conseguinte, na redução do défice e propostas de medidas alternativas às que vêm enunciadas no OE.

Brutalidade, irresponsabilidade e falácias
Nunca será excessivo repeti-lo: as linhas de orientação política contidas no Orçamento do Estado são uma brutalidade sem precedentes, demonstram uma total irresponsabilidade e sustentam-se em argumentos falaciosos.

BRUTALIDADE
Com as medidas divulgadas, o Governo evidencia uma indisfarçável aversão aos trabalhadores. Aos que se encontram no activo e aos que já se reformaram. A todos, e em especial aos das administrações e empresas públicas. Se a aversão aos trabalhadores em geral se explica por razões de natureza ideológica, a acrescida aversão aos de funções públicas só poderá ser explicada pela demagogia fácil e desavergonhada (são uns “privilegiados”).
Para a maioria dos trabalhadores de entidade públicas uma redução salarial nominal de 14%, para os restantes de 7%. Que acresce à redução salarial do ano corrente, ao aumento dos descontos para a ADSE, à redução do pagamento por horas extraordinárias, ao acréscimo da inflação, ao aumento dos impostos… Isto significa o prazo de um ano, uma redução do rendimento disponível real que variará seguramente entre os 15% e os 30%!
Os trabalhadores do sector privado estão “cheios de sorte”. Os seus rendimentos reais são reduzidos pela inflação, redução do pagamento das horas extraordinárias, aumento dos impostos e um esbulho salarial (efectivo mas escondido) da ordem dos 6,5%, que é quanto vale o aumento do horário de trabalho em 2,5 horas por semana.
Como contraponto assente na ideologia, por exemplo, as mais-valias das sociedades gestoras de participações sociais continuarão isentas do imposto e haverá um perdão aos capitais transferidos ilegalmente para o exterior, perdão que não exige, sequer, a reentrada no país desses capitais!

IRRESPONSABILIDADE
Tão forte redução dos rendimentos do trabalho irá repercutir-se, inevitavelmente, na diminuição da procura interna, da produção e do investimento. Ou seja, no agravamento prolongado da recessão. E no aumento do desemprego. A própria Comissão Europeia (pasme-se) avisa o Governo de que a austeridade deve ser inteligente para não prejudicar o crescimento!
O aumento do horário de trabalho sem remuneração implicará o aumento do desemprego. Um dos maiores problemas actuais das empresas (o outro é o acesso ao crédito) é o da insuficiência da procura, não a escassez da oferta. Assim sendo, o logicamente previsível é que para manterem idêntico (ou menor) nível de produção, as empresas usem o acréscimo de trabalho gratuito e reduzam proporcionalmente o número de trabalhadores, despedindo-os.
A diminuição dos rendimentos e do consumo terá como efeito, tal como já se verifica no ano corrente, uma redução das receitas fiscais, ou melhor, um aumento menos que proporcional ao agravamento das taxas. Um obstáculo acrescido à redução do défice orçamental.

FALÁCIAS
O Governo justifica estas medidas com um desvio previsto na execução orçamental de 3400 milhões. Segundo o INE, no primeiro semestre foi de 1600 milhões. Ou seja, no segundo semestre o desvio será de 1800 milhões. Mas não certamente por desleixo do Governo, que até aumentou o IVA sobre a energia. O que isto demonstra é a impossibilidade objectiva de reduzir objectivamente o défice em tão curto prazo, apesar da austeridade. Alarguem-se os prazos.
O primeiro-ministro afirma que com estas medidas “2013 será já um ano de recuperação robusta”. Mas simultaneamente (fugindo-lhe a boca para a verdade), diz que “não pode criar a expectativa” de que haja uma luz ao fundo do túnel. A verdade é que estamos a caminho de passar da recessão à depressão e de multiplicar o desemprego e a pobreza. Porque assim não será possível a recuperação económica. Ainda por cima, se necessário fosse, num contexto em que as perspectivas económicas na União Europeia, os nossos principais parceiros comerciais, são de acentuada desaceleração. Proceda-se à renegociação da dívida e aplique-se um programa substancialmente diferente do da troika. E encare-se de frente a questão do euro
Este caminho apenas tem como efeito esmagar os trabalhadores e condenar o país à pobreza. Já não nos diferenciamos da Grécia, em nada. Indignemo-nos e lutemos pelo presente e pelo futuro.
(Octávio Teixeira, economista)

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