Ao
longo dos anos tornou-se evidente que a avaliação dos professores não é uma tarefa
fácil de levar a cabo de forma justa, mas também se percebeu que a única
finalidade que se pretende tirar dessa prática é impedir/dificultar a
progressão na carreira dos docentes com as consequentes poupanças que isso
acarretaria para as contas do Estado.
O
autor do texto seguinte (*) que constitui um artigo de opinião que
transcrevemos do “Público” de hoje põe muito bem o dedo na ferida desta
situação que, desde há muitos anos vem afectando a vida profissional dos
docentes. Pensamos que muitos professores ao lê-lo, chegam à conclusão de que o
assinariam por baixo.
Depois do compromisso não cumprido por parte do
Ministério da Educação (ME), em que prometeu recuperar todo o tempo de serviço
congelado, podia o Governo ter aproveitado esse momento para propor alterações
à carreira e à avaliação docente. Do ponto de vista do Governo seria o momento
ideal, mas o crivo de Mário Centeno obrigou a uma inversão de discurso por
parte do ME, pois só isso justifica o negar de algo que ficou escrito.
Tenta-se agora colar o argumento da carreira/avaliação
para tentar desviar atenções da avalanche que caiu em cima do PS, fruto de uma
péssima política de comunicação do ME que, só por si, justifica os meses de
silêncio que impõe a si próprio.
Mas vamos falar sobre o assunto sem tabus e sem
rodeios.
A avaliação dos professores é justa? A avaliação dos
professores valoriza os melhores? A avaliação dos professores permite melhorar
o desempenho docente? A avaliação dos professores permite afastar os maus
professores? A carreira dos professores está bem estruturada? Não, não, não e
não.
Convém recordar que, os sindicatos e Nuno Crato
alteraram a avaliação dos professores, substituindo-a, na maioria dos casos,
por um documento de três páginas, ridículo, que não passa de um momento de auto
bajulação, muitas vezes em formato copy/paste, onde se muda a
distribuição de serviço e pouco mais. Muitos gritaram "vitória", era
o fim dos professores titulares que avaliavam professores, colegas, sem serem
reconhecidos como tal. Se a falta de preparação/isenção era um motivo
relevante, o principal motivo e que até hoje persiste é a utilização da
avaliação dos professores montada para ser um obstáculo à progressão na
carreira. A avaliação dos professores, aos olhos de quem nos governa, é isso
mesmo, um funil. E avaliar é muito mais do que isso… palavra de professor.
Além disso, tem sido utilizado o argumento que os
professores progridem de quatro em quatro anos, ao contrário dos restantes
funcionários públicos que progridem de dez em dez. Se querem equiparar e tendo
em conta que os professores têm na sua carreira dez escalões, estes demorariam
100 anos a atingir o topo da carreira, já não contando com o congelamento de
dez anos e as quotas do costume.
Querem mexer na carreira, força! Mas lembrem-se que estudos
internacionais indicam que os professores portugueses são dos mais mal pagos em
início de carreira e só no topo estão ao nível dos restantes países ou um pouco
acima. A ideia de reformular a carreira docente é para nivelar por baixo, por
cima, é para quê? Eu e o leitor sabemos naturalmente a resposta…
A recuperação de todo o tempo de serviço docente está
a criar um problema efetivo ao Governo mas, brevemente, podemos estar perante
um terramoto político. Porquê? Está a decorrer uma Iniciativa Legislativa de
Cidadãos (ILC) que vai obrigar os partidos a demonstrar a sua coerência já que,
há alguns meses apenas, recomendaram ao Governo, deputados do PS incluídos, a
recuperação de todo o tempo de serviço dos docentes portugueses. Ao mesmo
tempo, decorre uma greve rebelde, que fugiu ao controlo das principais
estruturas sindicais e que, com tudo somado, vai seguramente perturbar o
“aquecimento” para o próximo Orçamento do Estado, o último antes das eleições
legislativas…
É verdade que existem alguns professores que não o
deviam ser, mas também é verdade que existem muitos extremamente competentes e
dedicados. Não se motiva ninguém, dizendo a 20 que só um pode progredir, e
lembro, ao contrário das outras profissões, os professores desempenham as
mesmas funções, logo a lógica do funil, pirâmide, chamem-lhe o que quiserem,
não funciona com os professores.
Reconhecer a competência de quem avalia os professores
é também um problema. Não pode ser o colega da sala dos professores, não pode
ser o colega que vai lá a casa e que os filhos partilham brincadeiras. Uma
avaliação justa implica uma independência emocional. Por isso proponho que seja
criada uma carreira específica e que já devia estar a ser preparada. Caso não
seja essa a opção, o caminho só pode ser a utilização dos professores mais
experientes (a partir dos 60 anos), que até podem deixar de lecionar se assim
entenderem e dedicarem-se ao acompanhamento de professores mais novos,
utilizando a sua longa experiência como um farol para quem ainda tem muitos anos
pela frente.
Não existem decisões fáceis, mas a carreira e
avaliação dos professores deve ser encarada de frente, com honestidade e com o
objetivo de valorizar o profissional professor e melhorar o seu desempenho.
Claro que tudo isto é muito bonito, e também eu tenho momentos em que salto de
nuvem em nuvem tocando uma harpa celestial, levando depois uma chapada da
realidade, onde a dívida, e outros condicionalismos, empurram o que deve ser
para o que tem de ser. Só que no meu mundo ideal, todos os intervenientes deste
processo são verdadeiros, os professores assumem que a avaliação precisa de ser
melhorada e até trabalham com a tutela. O ME, por sua vez, assume que não pode
pagar a todos uma carreira até ao 10.º escalão, pois existem interesses
financeiros que precisam de ser protegidos – a banca, as PPP, as fundações, as
comissões, os juros da dívida, os amigos, os amigos dos amigos... –, mas, no
meu mundo perfeito, o nosso dinheiro é bem gerido e não chegámos ao ponto que
chegámos...
Agora,
é vê-los no “seu mundo perfeito”, esgrimindo argumentos da/na sua realidade
alternativa, onde os reais propósitos ficam por dizer e a realidade que todos
conhecemos fica longe das negociações, esquecida e sem ser assumida...
A
perfeita imperfeição dos seus mundos (im)perfeitos.
(*) Alexandre Henriques,
professor
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