Em
Portugal a direita e muitos dos seus representantes na opinião publicada andam
desnorteados. De tal modo assim é que se vêem em palpos de aranha para encontrar
temas com conteúdo que possam apresentar perante os portugueses. Vai daí,
agarram-se ao primeiro osso que aparece, por mais rapado que esteja… Um deles é
o que se relaciona com a CGD e o outro, que vai esgotar-se mais depressa, tem a
ver com o falecimento de Fidel Castro. No entanto, muitos portugueses não têm a
memória curta e, com facilidade desmontam as actuais contradições da direita no
que diz respeito a um passado relativamente recente. É o caso de Francisco Louçã
no texto desmistificador que assina no Público de hoje. Como muito bem Louçã afirma
a certa altura, “o problema da direita com Fidel não é a democracia, é
flutuarem no tempo ao sabor dos ventos e da vontade de ajustes de contas
caseiros”.
Escreveu
altivamente um editorial: “um ditador é um ditador”. Já outros tinham
sentenciado, naquele estilo marrão que faz títulos sumarentos: “um ditador é um
ditador é um ditador”. Não discutam, a história não conta, caluda. Mas os
jornais mandaram correspondentes a Cuba para exuberantes reportagens acerca do
funeral de Fidel Castro, no meio de páginas de evocação heróica. Se tudo é
igualmente indiferente, tiveram também um correspondente no funeral de Pinochet
e enalteceram a sua história?
A
SIC, a TVI e a RTP passaram horas de directos com a caravana que levou a urna
pelas estradas de Cuba. Fizeram o mesmo quando morreu Pinochet e elogiaram os
seus feitos no Chile?
Marcelo
Rebelo de Sousa apresentou a Cuba as condolências de Portugal. O Presidente de então
fez o mesmo com Pinochet, também ele ex-presidente de um país com o qual
Portugal tem relações diplomáticas?
O
Presidente português visitou Cuba e insistiu em ter um encontro com Fidel,
apimentado com fotografia. Algum enviado português foi a casa de Pinochet, nem
que fosse um cônsul, para tirar uma selfie e publicar no Facebook uma foto sorridente dos
dois?
O
governo faz-se representar no funeral de Fidel por um ministro. O governo de
então enviou um ministro ou qualquer representante de Estado ao funeral de
Pinochet, ou sequer uma coroazinha de flores?
O
Papa enviou mensagem de pesar. Rajoy e Juncker, chefes da direita europeia,
elogiaram a “figura de importância histórica” e que foi “herói para muitos”.
Esqueceram-se de fazer o mesmo com Pinochet?
Os
partidos aprovaram no parlamento dois votos de pesar. Ocorreu-lhes votar tal
pesar quando Pinochet morreu?
Ninguém
se lembra mas, já ex-presidente, Pinochet visitou Portugal para intermediar um
assunto de compra e venda de armas, tendo sido alvo de manifestações populares,
não constando que os negociantes tivessem conseguido mexer um dedo para o
defender (foi no tempo de um governo PS). Em contrapartida, toda a gente se
lembra que quando Fidel veio a Portugal foi uma festa popular. Os dignitários
dos partidos de direita acotovelavam-se nas cerimónias para o cumprimentar.
Muitos dos que agora o insultam lá andaram ao beija mão.
A
comunicação social, o Presidente, o governo e os partidos, o Papa e as
autoridades europeias sabem que só um sonso compara Fidel a Pinochet e não
caíram nessa esparrela, que ficou reservada para os ideólogos.
Mas
os ideólogos rasgaram as vestes, indignados com tudo. Indignados com o PSD, que
se absteve. Indignados com o CDS, que fez de conta. Indignados com o
Presidente, mas disso não convém falar. Indignados com o governo, mas está em
alta. Indignados com a história, porque a derrota dos sul-africanos em Angola é
uma mágoa abissal. Indignados com a perda, que os casinos em Havana eram do
melhor. Tudo o resto é instrumental: Marques Mendes critica o seu partido tanto
por não ter candidatos autárquicos como por não recusar o voto de pesar, afinal
é Passos Coelho o seu alvo e vale tudo; o ex-director do Expresso critica quem não demonizou o
homem, não abra por favor o jornal que encontrará encómios abundantes sobre o
dito cujo. Nenhum deles está a analisar quem foi Fidel, nem muito menos a
discutir a história de Cuba, estão somente a escrever sobre as disputas mais
comezinhas que os ocupam. O problema da direita com Fidel não é a democracia, é
flutuarem no tempo ao sabor dos ventos e da vontade de ajustes de contas
caseiros.
No
mais, seguem Trump, a nova luz no firmamento da direita. Aprenderam com ele que
disparar mais depressa do que a própria sombra é a política desejável. Pensar,
nunca, e muito menos compreender (se quiser ler, em alternativa, um artigo
informado e inteligente de opositores de Fidel, abra aqui).
Se não quiser analisar os
factos, não há história, fica a ideologia, ou um molde universal que explica
tudo porque não sabe nada. O mais certo é que na direita se continue assim,
parece que ficam felizes com tão pouco.
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