O
PISA (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Alunos) é uma
rede mundial de avaliação de desempenho escolar, realizado pela primeira vez em
2000 e repetido de três em três anos. Este programa é coordenado pela
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e tem em vista
melhorar as políticas e os resultados educacionais.
Num
artigo de opinião que assina hoje no Público, a deputada bloquista Joana Mortágua
desmonta o alarido promovido pela direita no sentido de atribuir a Nuno Crato
todos os méritos pela melhoria das aprendizagens dos alunos portugueses
revelada pela publicação do último PISA. Se é verdade que existe uma “coincidência
temporal” dos resultados agora conhecidos com a passagem de Nuno Crato pelo
ministério da Educação, muito mais importante é, desde logo, ter-se em conta
que uma melhoria de resultados educativos só se faz sentir com políticas de
longo prazo.
A direita está sem discurso. Na educação, como no
resto, apostaram numa tese catastrofista confiando ao diabo também a tarefa de
dar cabo do início do ano letivo. Como a tese chocou com a realidade, o único
refúgio da direita tem sido uma penosa defesa dos méritos do cratismo,
geralmente entendido como expressão de luto.
É por isso que qualquer notícia que associe testes
feitos em 2015, quando Nuno Crato ainda era ministro da Educação, e
melhoria das aprendizagens é imediatamente aproveitada pela direita como água
no deserto. A coincidência temporal é inegável, mas quer isso dizer que as
políticas de Nuno Crato produziram positivos na Educação em Portugal?
Dificilmente.
A primeira coisa que tem de ficar clara é que PSD e
CDS não podem reivindicar a autoria destes resultados. Desde logo, porque os
alunos de 15 anos que agora foram avaliados tiveram a sorte de andar um passo à
frente das alterações do anterior Governo, não fizeram exames precoces nem
apanharam as mudanças de currículo e de programas que vinham a ser aplicados a
partir dos inícios de ciclo. Ou seja, o percurso destes alunos foi marcado
sobretudo pelos currículos e programas que Nuno Crato deitou para o lixo.
O PISA tem a vantagem de avaliar conteúdos mais
complexos do que os conhecimentos imediatos deste ou daquele programa. Se
sairmos da simplificação absurda da coincidência temporal, estes resultados não
são mérito de nenhuma medida em particular porque correspondem a uma evolução
de 15 anos em que tudo conta, desde a escolarização da família até ao estado de
degradação das escolas, desde as coisas positivas como a rede de bibliotecas
escolares e o Plano Nacional de Leitura, como as menos positivas como o
abandono da formação de professores.
Deixar que a direita reivindicasse os méritos destes
resultados seria, além de incorreto, uma irresponsabilidade. Estaríamos a
enganar-nos sobre as causas do progresso e a correr o risco de persistir no
erro em vez de reforçar o que está bem. Não é só porque o PISA recomenda um
conjunto de políticas que são maioritariamente contrárias à tradição de Nuno
Crato, é sobretudo porque o PISA nos mostra os erros que a direita não quer
ver.
O primeiro, mais persistente no tempo e por isso mais
nefasto, é a confusão entre chumbos e exigência. Atrás dessa falaciosa
confusão, que a direita adora, está uma cultura de retenção bacoca,
conservadora, que em vez de resolver os problemas de aprendizagem dos alunos se
limita a excluir quem os tem. Metade dos alunos com 15 anos que o PISA avaliou
não estava no ano de escolaridade a que pertence, ou seja, tinha chumbado pelo
menos uma vez ao longo do percurso escolar. Portugal é dos países da Europa que
mais associa a retenção escolar a um baixo estatuto socioeconómico e cultural
das famílias.
É verdade que Nuno Crato não inventou a cultura de
retenção, mas defendeu-a e promoveu-a. Aliás, Nuno Crato promoveu tudo o que
conduzisse a Escola a um lugar de seleção, de exclusão e de competição, como se
a educação não fosse um direito de todas as crianças, mas um processo de
triagem social. Sim, melhoramos no PISA, é verdade. Mas a que custo?
Numa das suas piores medidas de sempre, Crato deu
sequência a esta cultura de retenção. Parte dos alunos que chumbaram foram
encaminhados para o ensino básico vocacional, um caminho curricular sem saída
só para os alunos que aos 13 anos já tinham chumbado um par de vezes. Para
esconder o abandono e o insucesso escolar, Crato limitou-se a retirar os alunos
com maiores dificuldades do percurso escolar, escondendo do radar dos
rankings, dos estudos e dos Pisas dezenas de milhares de crianças a quem
aos 10 ou 11 anos disseram que a Escola não era para elas.
Os resultados do PISA devem deixar-nos satisfeitos,
mas nunca cegos. Tanto a elevada retenção, que o estudo mostra, como o ensino
vocacional, que o estudo esconde, fazem parte da mesma visão de seleção social
que a direita tentou imprimir na Escola Pública. Se quiserem reivindicar alguma
herança, só pode ser esta.
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