Ainda
que com algum atraso, vamos deixar aqui a transcrição de um artigo de grande
qualidade assinado por Domingos Lopes na edição de domingo do Público online.
O
tema em apreço tem a ver com as políticas de empobrecimento dos portugueses levadas
obsessivamente a cabo pelo governo Passos/Portas, sob o pretexto de que não
havia alternativa às imposições da troika e como a actual maioria de esquerda
conseguiu provar que essa alternativa existia apesar das restrições a que ainda
estamos sujeitos pelas chamadas “regras europeias”.
É
natural que a direita ande neste momento desorientada e sem discurso que
explique o actual sucesso, depois de terem vaticinado as maiores desgraças que cairiam
sobre os portugueses, resultante das políticas de um governo ancorado à
esquerda.
Não
podendo a direita negar o sucesso da actual maioria, agarrou-se á única bóia de
salvação que lhe resta – os actuais bons resultados devem-se às politicas
levadas a cabo pelo governo Passos/Portas. Presunção e água benta, cada um toma
a que quer…
Houve um tempo (aliás recente) em que
uns tantos cavalheiros e umas tantas damas do alto do poder diabolizaram a vida
dos portugueses semeando pobreza e tornando os ricos mais ricos. Prometeram que
a vida nunca mais seria como dantes e que as populações tinham vivido acima das
possibilidades e deveriam pagar no purgatório terrestre a desgraça de não se
saberem governar.
Antes da chegada destas damas e destes
cavalheiros ao poder, as cidades, as vilas e até aldeias estavam cheias de
televisões, painéis a convidar os portugueses a gastarem o mês que ainda não
tinham recebido e a pagarem em “éne” prestações o último eletrodoméstico, o
telemóvel e as férias nas Caraíbas. Foram muitos os que confiaram nos paraísos
anunciados.
Nesse tempo “rigoroso” para os
portugueses, todos os dias Passos, Portas, Maria Luís, Cristas e seus camaradas
magicavam no que tinham de fazer para castigar os estouvados que, com menos de
500 euros mensais, rebentaram com a economia portuguesa... quiçá em gajas e
copos.
Eram feitos cortes brutais na saúde, na
educação, na justiça e inventaram-se impostos que incidiam sobre os rendimentos
dos “pecadores” que se atreveram a ir no canto das sereias do sistema
financeiro indígena e mundial. O que fazia falta era desanimar a malta e
empobrecer e de certo modo conseguiram fazer esmorecer o ânimo dos portugueses.
Que o digam as depressões que se instalaram.
Vieram eleições (sim, eleições) e quem
se esquece de Passos, Portas e Cavaco a maldizerem o Parlamento por escolher a
solução do acordo à esquerda? Foram tempos de despautério, pois Cavaco sabia
que Passos não formaria Governo, mas indigitou-o.
Ao lado destes músicos da desgraça
alinharam comentadores e mais comentadores e um conjunto de tocadores de
marchas funerárias a dizer que vinha aí o diabo e nunca por nunca a “gerigonça”
seria solução. O último argumento — Bruxelas não deixaria.
Meu deus! O que foram fazer os
portugueses. Todos os dias eram dias de desgraça. Abençoados pelo Sr. Schäuble
e por um tal Sr. holandês (copiador de teses alheias), aqui na terra lusitana
cada dia era um dia de ofensa aos donos disto tudo e contra os quais nada se
poderia fazer porque estava escrito “amarás o teu Deus (o mercado) e só a ele
obedecerás”…
Ai jesus! Passos continuava de pin
ao peito a visitar unidades económicas como se estivéssemos num intervalo de
uma sessão de cinema e viesse a segunda parte do empobrecimento e ele
continuasse a ser primeiro-ministro.
Ralhava — sim, ralhava — todos os dias
por se desmantelar as reformas que tanto custaram a fazer. Todos os dias
ralhava, ele e a própria Cristas, contra o que se passava na TAP, nos
transportes, na educação, na justiça (contra o mapa judiciário), na economia e
por aí diante. E anunciava tristeza pela CGTP não fazer manifestações, ficando
por explicar por que razão as não fazia o PSD.
Sempre com ar de zangado pelos
disparates do “despesista Costa”, “refém das esquerdas radicais”, Passos
anunciava tremendas tempestades e chegou a vaticinar a vinda do Além do
chavelhudo por ocasião do inverno. Que medo. O capitão Passos não desarmou e
até hoje continua a cantar a canção “ó tempo volta para trás” de Tony de Matos.
Não tendo o chavelhudo obtido licença para sair do inferno, veio de Bruxelas o
levantamento das sanções por défice excessivo (também há regedores na UE) e de
repente parece que tudo mudou.
Num país fofinho, cheio de afetos,
começou a procissão de saber quem fez mais pela saída do défice excessivo a que
os regedores tinham condenado Portugal. E no país onde é tudo boa gente, o
senhor Presidente felicitou este Governo e o outro, sendo que este Governo foi
empossado pelas esquerdas para fazer o oposto do outro que, entretanto, passou
todo este tempo a apontar o caminho da desgraça pelo Governo de Costa estar a
desmantelar o que Passos tinha feito.
Passos, com aquela cara de cinco tostões
mal ganhos (não lhe sai da cabeça o empobrecimento competitivo), face ao fim do
défice excessivo veio declarar que sim senhor, mas vendo bem as coisas não
senhor, porque este desfez o que o outro fez e isso vai pagar-se. Faz lembrar a
estória do lobo que comeu a ovelha.
O CDS congratulou-se, mas, há sempre um
mas, é preciso continuar as reformas… ok. Quais? Aquelas contra os quais foi
empossado este Governo. Mas nem Álvaro Santos nem Maria Luís se importam com a
vontade popular. O que conta são os mercados. Porém, nunca foram, nem vão a
votos! Olha a lata, pedir aos mercados que respeitem a vontade dos humanos.
Isso é o mesmo que pedir aos jihadistas que abdiquem da sharia. Só a
vontade dos deuses conta. Só os grandes sacerdotes sabem o que os novos deuses
querem e exigem aos pobres mortais.
Algo se passa no país lusitano: excesso
de défice por falta de vergonha estrutural.
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