O
envelhecimento e a diminuição da população portuguesa processam-se a um ritmo
nunca visto apesar de estarmos perante um fenómeno sociológico com várias décadas.
A austeridade que este Governo impôs ao país tem aqui uma das consequências mais
nefastas para o futuro de Portugal. Como se pode verificar no gráfico, a diminuição
do número de filhos por mulher acentuou-se nos anos mais recentes.
Antes
de mais, o projecto de ter um filho é uma questão de contas. Essas contas têm
muito a ver a insegurança nos empregos, a precariedade dos mesmos e a falta de
outras condições para os casais poderem criar um filho.
O
texto seguinte foi transcrito de uma edição recente do Diário de Coimbra e é da
autoria de Carlos Cortes, Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos
Médicos. Nele é abordada a problemática da natalidade na perspectiva daquela
organização. Um ou outro ponto em que concordamos menos não invalidam o
interesse da sua leitura.
Veio
recentemente a público um estudo sobre natalidade que caiu como uma onda
gigante de água glacial sobre uma praia estreita no pico do calor. A surpresa
deu lugar á preocupação e esta desencadeou, momentaneamente, uma chuva de
propostas baseadas em medidas pontuais e instantâneas.
Portugal
é um dos países do mundo com pior taxa de natalidade e obtém a derradeira
posição no conjunto de 28 estados membros da União Europeia, muito atrás de
países como a França, o Reino Unido ou a Lituânia.
O
Índice Sintético de Fecundidade, que representa o número de filhos nados-vivos
por mulher é de 1,28, bem abaixo dos indispensáveis 2,1 que permitiriam a
renovação normal das gerações. As estatísticas, em si, não são inesperadas, já
que desde os anos 70 (cada mulher tinha, em média, 3 filhos), a natalidade tem
baixado gradualmente até aos dias de hoje. O que surpreende é o posicionamento
de Portugal na liderança dos países com menor natalidade e com maior
dificuldade em resolver o problema.
A
recente crise económica não veio alterar a curva descendente o que leva a crer
que os motivos são mais sociológicos do que propriamente financeiros.
A
fraca natalidade somada ao envelhecimento da população e ao efluxo migratório
dos jovens qualificados compõem um quadro negro que irá inviabilizar, a médio
prazo, a sustentabilidade social do país. Portugal perdeu, só no ano passado,
60000 habitantes e prevê-se que a relação de portugueses em idade ativa e
idosos passe de 3/1 para perto de 1/1 em poucas décadas.
Outro
dado interessante é perceber hoje, e ao contrário do que tem acontecido em
décadas anteriores, a maior taxa de natalidade é registada em casais com
formação académica superior.
A
fraca natalidade e as questões demográficas sempre foram assumidas, pelos
decisores políticos, como questões sérias e merecedoras de todas as atenções e
iniciativas. A verdade é que nada foi feito para travar a diminuição da
natalidade apesar da sua agudização constante e conhecida de todos.
Mais
do que medidas avulsas de aliciamento através de incentivos financeiros e
frequentemente inadaptados à realidade do mundo laboral, a solução passaria por
alterar preconceitos culturais e fenómenos de moda social que têm impedido o
desenvolvimento de famílias mais numerosas.
Uma
dessas acções passaria por derrubar o preconceito laboral da gravidez. Quantas
vezes não assistimos, nos serviços dos hospitais e centros de saúde, a pressões
reprováveis de dirigentes dessas instituições, mais ou menos ostensíveis, sobre
médicas que colocam a possibilidade da gravidez ou da licença parental de
acompanhamento do seu filho? Essas atitudes intoleráveis, provavelmente
transversais a outras classes profissionais, associadas à necessidade de manter
a estabilidade no seu local de trabalho e à justa garantia de evolução na sua
carreira podem constituir um entrave intransponível ao crescimento das famílias
e ao aumento da natalidade.
Talvez esta mudança de mentalidade
fosse um ponto importante de preocupação para quem deseja verdadeiramente
resolver a diminuição da natalidade em Portugal.
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