Depois
da tragédia provocada na Grécia pelos megaincêndos que estão a fazer chegar
perto da centena o número de vítimas, sem se saber ainda o valor a que ascendem
os colossais prejuízos materiais, dizem especialistas que estas situações vão passar
a ter lugar com mais frequência se não se colocar um travão às alterações climáticas.
Para
o cidadão comum que se sente desprotegido perante a proliferação destes
catastróficos incêndios, importante mesmo é que se tomem medidas imediatas que,
no mínimo, diminuam os seus efeitos. Em Portugal, parece ponto assente que,
entre outras causas, a proliferação de incêndios florestais tem a ver com a
forma como diversas espécies de árvores estão disseminadas pelo território
nacional. Aquela que mais vezes é apontada como potenciadora de incêndios é o
eucalipto mas, interesses bem localizados vão impedindo que a sua disseminação seja
controlada.
Tem
especificamente a ver com o eucalipto, como espécie invasora, o artigo de opinião
que o Eng, Silvicultor Paulo Pimenta de Castro assina no “Público” de hoje e
cujo essencial aqui reproduzimos.
Em 2009, o Instituto de Conservação da Natureza e da
Biodiversidade (ICNB) elaborou uma proposta para classificar o eucalipto como
espécie invasora. Todavia, sem que fosse revelado o motivo, a proposta
desapareceu. Em Portugal, uma decisão sobre o carácter invasor do
eucalipto terá suporte científico ou os interesses financeiros sobrepor-se-ão?
De acordo com a lei, espécie invasora é aquela que é
suscetível de, por si própria, ocupar o território de uma forma excessiva, em
área ou em número de indivíduos, provocando uma modificação significativa nos
ecossistemas. Os eucaliptos, a par das acácias e das háqueas, são espécies não
indígenas (exóticas). Importa ter em atenção que as espécies não indígenas, com
carácter invasor e já introduzidas na Natureza, terão de ser objeto de um plano
nacional com vista ao seu controlo ou mesmo à sua erradicação.
O eucalipto ocupa cerca de 10% da superfície de
Portugal, a maior área relativa de plantações de eucalipto a nível mundial.
No final de 2017, em Espanha, o Comité Científico do
Ministério da Agricultura, Pesca, Alimentação e Meio Ambiente, por unanimidade,
emitiu um parecer para a inclusão do eucalipto no Catálogo Espanhol de
Espécies Exóticas Invasoras. Por cá, o mesmo foi defendido no Guia
Prático para a Identificação de Plantas Invasoras em Portugal Continental,
publicado pela Universidade de Coimbra.
Já em 2018, o Governo espanhol decidiu ignorar o
parecer do seu Comité Científico. As plantações de eucalipto representam 3% da
superfície florestal espanhola e 32% da madeira consumida pela indústria
papeleira naquele país. Em Portugal estão razoavelmente bem identificadas as
portas giratórias entre o exercício de cargos públicos, incluindo funções
governamentais, e o exercício de cargos privados na indústria papeleira. Não
será, pois, de estranhar que o desfecho registado em Espanha tenha semelhante
resultado em Portugal. A iniciativa tomada em 2009 pelo então ICNB, rapidamente
"desaparecida", aponta nesse sentido. A “fundamentação” financeira
sobrepôs-se à fundamentação científica.
Em todo o caso, para além de uma fundamentação
científica ou financeira, existe também a possibilidade de uma decisão judicial
poder considerar uma espécie como invasora. Em Espanha, o Supremo Tribunal, em
2016, determinou que o E. nitens é espécie invasora e de
elevada perigosidade.
A par do perigo inerente ao carácter invasor, no caso
específico nacional, importa ainda ter em conta o carácter epidémico de
dispersão da espécie no território. Com efeito, os dados do Inventário
Florestal Nacional de 2005 (à falta de dados mais recentes) indicam
que cerca de 80% destas plantações são submetidas a uma gestão de abandono. O
facto tem vindo a fazer aumentar a presença das plantações de eucalipto na área
ardida total e na área ardida em espaço florestal. No pós-incêndio não há já
dúvidas quanto ao carácter invasor do eucalipto.
O regresso à
discussão pública da classificação do eucalipto como espécie invasora é central
para o ordenamento do território, para o combate aos incêndios florestais e
para o aumento de perspectivas para uma floresta diversificada e rentável para
os proprietários florestais, e não apenas para as celuloses.
Sem comentários:
Enviar um comentário