quarta-feira, 25 de julho de 2018

DISCUTIR O EUCALIPTO


Depois da tragédia provocada na Grécia pelos megaincêndos que estão a fazer chegar perto da centena o número de vítimas, sem se saber ainda o valor a que ascendem os colossais prejuízos materiais, dizem especialistas que estas situações vão passar a ter lugar com mais frequência se não se colocar um travão às alterações climáticas.
Para o cidadão comum que se sente desprotegido perante a proliferação destes catastróficos incêndios, importante mesmo é que se tomem medidas imediatas que, no mínimo, diminuam os seus efeitos. Em Portugal, parece ponto assente que, entre outras causas, a proliferação de incêndios florestais tem a ver com a forma como diversas espécies de árvores estão disseminadas pelo território nacional. Aquela que mais vezes é apontada como potenciadora de incêndios é o eucalipto mas, interesses bem localizados vão impedindo que a sua disseminação seja controlada.
Tem especificamente a ver com o eucalipto, como espécie invasora, o artigo de opinião que o Eng, Silvicultor Paulo Pimenta de Castro assina no “Público” de hoje e cujo essencial aqui reproduzimos.  
Em 2009, o Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB) elaborou uma proposta para classificar o eucalipto como espécie invasora. Todavia, sem que fosse revelado o motivo, a proposta desapareceu. Em Portugal, uma decisão sobre o carácter invasor do eucalipto terá suporte científico ou os interesses financeiros sobrepor-se-ão?
De acordo com a lei, espécie invasora é aquela que é suscetível de, por si própria, ocupar o território de uma forma excessiva, em área ou em número de indivíduos, provocando uma modificação significativa nos ecossistemas. Os eucaliptos, a par das acácias e das háqueas, são espécies não indígenas (exóticas). Importa ter em atenção que as espécies não indígenas, com carácter invasor e já introduzidas na Natureza, terão de ser objeto de um plano nacional com vista ao seu controlo ou mesmo à sua erradicação.
O eucalipto ocupa cerca de 10% da superfície de Portugal, a maior área relativa de plantações de eucalipto a nível mundial.
No final de 2017, em Espanha, o Comité Científico do Ministério da Agricultura, Pesca, Alimentação e Meio Ambiente, por unanimidade, emitiu um parecer para a inclusão do eucalipto no Catálogo Espanhol de Espécies Exóticas Invasoras. Por cá, o mesmo foi defendido no Guia Prático para a Identificação de Plantas Invasoras em Portugal Continental, publicado pela Universidade de Coimbra.
Já em 2018, o Governo espanhol decidiu ignorar o parecer do seu Comité Científico. As plantações de eucalipto representam 3% da superfície florestal espanhola e 32% da madeira consumida pela indústria papeleira naquele país. Em Portugal estão razoavelmente bem identificadas as portas giratórias entre o exercício de cargos públicos, incluindo funções governamentais, e o exercício de cargos privados na indústria papeleira. Não será, pois, de estranhar que o desfecho registado em Espanha tenha semelhante resultado em Portugal. A iniciativa tomada em 2009 pelo então ICNB, rapidamente "desaparecida", aponta nesse sentido. A “fundamentação” financeira sobrepôs-se à fundamentação científica.
Em todo o caso, para além de uma fundamentação científica ou financeira, existe também a possibilidade de uma decisão judicial poder considerar uma espécie como invasora. Em Espanha, o Supremo Tribunal, em 2016, determinou que o E. nitens é espécie invasora e de elevada perigosidade.
A par do perigo inerente ao carácter invasor, no caso específico nacional, importa ainda ter em conta o carácter epidémico de dispersão da espécie no território. Com efeito, os dados do Inventário Florestal Nacional de 2005 (à falta de dados mais recentes) indicam que cerca de 80% destas plantações são submetidas a uma gestão de abandono. O facto tem vindo a fazer aumentar a presença das plantações de eucalipto na área ardida total e na área ardida em espaço florestal. No pós-incêndio não há já dúvidas quanto ao carácter invasor do eucalipto.
O regresso à discussão pública da classificação do eucalipto como espécie invasora é central para o ordenamento do território, para o combate aos incêndios florestais e para o aumento de perspectivas para uma floresta diversificada e rentável para os proprietários florestais, e não apenas para as celuloses.

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