Qualquer
cidadão português tem vindo a constatar que o Estado precisa ter sempre um
mealheiro bem recheado para acudir e tapar os desmandos do capital financeiro, não
vá suceder que a banca e seus accionistas se vejam privados de lucros, de um
momento para o outro. Vai daí, como o dinheiro dos contribuintes não dá para
tudo, há que cortar nas despesas sociais, na saúde, na educação e na cultura,
para falarmos apenas nos casos que envolvem montantes mais volumosos e que
chegam mais depressa à opinião pública.
O
texto que apresentamos a seguir é um artigo de opinião, que transcrevemos do
Diário de Coimbra de ontem, onde o seu autor, João Marques, Diplomado em
Ciências da Comunicação, coloca o dedo em todas estas feridas.
De
facto, a situação demográfica em que nos encontramos tem de merecer um amplo
consenso das forças políticas e dos meios empresariais e financeiros, com um
estado que indique trajetórias, dando condições reais aos casais que pretendam
ter filhos, garantindo o emprego, melhorando-o anualmente e satisfazendo todas
as regalias sociais para um dos cônjuges, num período entre três e cinco anos,
aproximando-nos da solução dinamarquesa.
Com três milhões de pensionistas, dos
quais 2,5 milhões por velhice, 842 mil recebem uma reforma entre €250/300,
sendo o valor médio de €1275. Com 133,5 idosos por cada 100 jovens até aos 14
anos, um estudo recente (Inovar a Reforma) estima que, em 2050, os primeiros
subam para duzentos.
Passemos, agora, a não menos
importante situação das finanças públicas. O FMI (World Economic Outlook, 2017)
estima que Portugal, com a quinta dívida mais alta, equivalente a quase 127,5%
do Produto Interno Bruto (PIB), tem de pagar, em média por ano, €7,2 mil
milhões, apenas em juros da dívida.
Acontece que, em 1991, a dívida
pública representava pouco mais do que metade do PIB (54,9%). Apesar das
subidas anuais, a situação manteve-se e mesmo quando da demissão de António
Guterres (IV Governo Constitucional, Abril 2002) com a frase que ficou célebre
“isto é um pântano”, a dívida pública estava nos 56,2% do PIB (Pordata, FFMS).
As alterações brutais no endividamento público acontecem nos governos Sócrates
(2005/11, mais €89 mil milhões de dívida) pois quando se demite, em Junho, a
dívida já estava nos 111,4%, se bem que durante o governo de Durão Barroso/
Santana Lopes é notório o aumento significativo da dívida.
Onde reside esta acumulação
desenfreada de dívida pública? Pergunta obrigatória e de resposta simples: o
sistema financeiro e a “grande clientela dos negócios”, onde o compadrio e a
corrupção generalizada atingiram patamares incontroláveis, mais invisíveis para
o Banco de Portugal ou para a Autoridade Reguladora. BPN/Sociedade Lusa de
Negócios/Parvaloren/ Banif/BES e o próprio banco público CGD receberam e
continuarão a encher-se de dezenas de milhares de milhões para cobrir as
“imparidades”, palavra erudita para significar que a hipoteca a que está ligado
o empréstimo bancário, nem dá para comprar um rolo de papel higiénico.
Depois do investimento colossal na
rutura do BES (Mau/Novo), em 2017, o Estado mete mais 1,2 mil milhões,
prevendo-se para este ano, mais um “contributo” ainda superior. Quanto ao
BPN/Parvaloren, só em 2017, limparam do Estado mais de €768,2 milhões, pelo que
fiquei estupefacto e revoltado quando leio nos jornais económicos que a sua
administração decidiu atribuir um bónus de €500 milhões aos trabalhadores com
mais de quinze anos de serviço, cabendo a cada um dos colaboradores mais
próximos do ex-presidente Oliveira e Costa, €50 mil, personagem condenada por
falsificação de documentos, fraude fiscal, burla qualificada e branqueamento de
capitais mas, como tantos outros, continuam a ir jantar ao “Gambrinus” ou ao
“Grémio Literário” e gozando de todas as comodidades. Daqui se conclui, entre
outras deduções, que o Estado tem um certo reconhecimento e respeito pelo
grande banditismo de colarinho branco, já que tem sido ele a pagar a(s)
conta(s).
Neste contexto
compreende-se que o Estado não tenha verbas para sustentar o Serviço Nacional
de Saúde, a educação – as tipologias de contratações/salários verificadas no
ensino superior – a justificação de não satisfazer as pretensões dos
professores, pois teve de se investir
€13 milhões num segmento do IP3, o desinvestimento inqualificável na
ferrovia, a privatização de sectores estratégicos, a precariedade laboral, a
rarefação de serviços públicos no interior e o compadrio, não só político, nas
nomeações diretas para milhares de cargos, além do abandono do património
construído. Mas, atenção. Do habitual conformismo lusitano, começam a surgir
sinais de desilusão e até de repúdio.
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