quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

CHOCANTE MAS REAL


A opinião pública portuguesa é muitas vezes confrontada com a promiscuidade existente entre política e o mundo dos negócios. São por demais conhecidos os casos de personalidades que exercem cargos políticos e, ao mesmo tempo, desempenham funções de relevo em empresas privadas dos mais diversos ramos ou no mundo financeiro. Na recente campanha eleitoral houve mesmo um candidato que tomou esta situação como tema de fundo da sua propaganda. Só que, dentro da nossa pequenez, o conluio tem as dimensões correspondentes. Agora imagine-se uma situação equivalente em que os actores desempenham funções à escala da Comissão Europeia, por um lado, e por outro encontramos grandes empresas à escala mundial…
Leia-se, então, o seguinte texto (*) que transcrevemos do Diário de Coimbra do passado dia 28/1 para ficarmos com uma pequena ideia da sujeira que por aí vai.
A globalização, tal como a temos suportado nas últimas três décadas, sob a égide da Organização Mundial do Comércio (OMC) e das transnacionais fiscalmente paradisíacas, atingiu e enfraqueceu a soberania dos Estados, deixando-os na incapacidade de assumir as suas funções políticas determinantes, que conduziram a uma conceção moderna da soberania.
Tenho ainda gravadas as palavras do presidente da comissão Jean-Claude Juncker, há um ano, quando o partido Syriza surgiu como vencedor das legislativas gregas: “não pode haver uma escolha eleitoral democrática contra os tratados europeus”. Depois, como todos sabemos e sentimos na pele, tudo foi dito e melhor executado por personalidades identificadas com a demagogia económica (PIDE) – permitam-me o acrónimo – aglutinando o FMI, o BCE e a comissão europeia.
Nesta perspetiva, há quem já veja na Europa um preâmbulo de um sistema mundial, dominado por uma “metrópole” que se exibe em Davos, Bilderberg ou em outros locais menos mediáticos, onde se concentram os atores, um por cento, cujo poder financeiro e patrimonial equivale aos restantes 99% (OXFAM), numa simbiose do que se passa no resto do globo.
Uma outra associação não-governamental, o Corporate Europe Observatory (CEO) – se dúvida, o melhor analista sobre o poder dos lóbis neste continente, apresenta-nos, num documento agora indicado, o que estão a fazer os comissários europeus, integrantes do segundo mandato de Durão Barroso.
Chega a ser chocante. A investigação está disponível no CEO, sob a designação de “Revolving Doors” (Portas Giratórias) e nela verificamos a permissividade, o conluio e o entrosamento sistémico entre cargos políticos (comissários/assessores) e o mundo dos negócios.
Entre os 26 comissários europeus, dois simples exemplos. Vivian Reding, logo após concluir o seu mandato (Barroso II) e sem quaisquer objeções da comissão de ética, assume os cargos no conselho de administração da sociedade mineira NYRSTAR, da AGFA-GEVAERT e da Fundação Bertelsmann (gigante mundial dos media), acumulando tudo isto – certamente de escassa responsabilidade e, ainda, com um desperdício mínimo de tempo – com o cargo de deputada do Parlamento Europeu.
Já Charlie McCrevy, depois de ter exercido as funções de comissário europeu do mercado interior e dos serviços, ingressa nuna das mais importantes sociedades mundiais de investimentos BNY MELLON, inacreditavelmente no departamento dos produtos derivados, na administração da conhecida RYANAIRE  e na SENTENIAL, nada mais do que uma fornecedora de soluções de pagamentos aos bancos.
Quanto ao “nosso” Durão Barroso, o CEO garante-nos que “é o mais ocupado de todos”, já que tem 22 novas funções, voluntariamente assumidas, diga-se em abono da verdade, mas teria de utilizar este espaço disponível para as descrever.
O sociólogo e presidente da Fundação das Ciências do Homem Michel Woiworka, num recente debate no canal France 24, sobre a situação caótica em que vivemos e sem quaisquer dúvidas, deixou uma frase subliminar: um tempo sujo.  
(*) João Marques, Diplomado em Ciências da Comunicação

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