É
já no próximo sábado (27/2/2016) assinalado o dia internacional de acção pelos
direitos dos refugiados e, por isso, tem todo o significado que aqui deixemos a
transcrição de um artigo de opinião (*) assinado pelo Irmão Alois, Prior da
Comunidade Ecuménica de Taizé sugestivamente intitulado “Perante as migrações
ultrapassemos o medo!”
Do
texto seguinte, queremos realçar duas expressões especialmente significativas
pela força que contêm e pelo impacto que devem ter em nós nos tempos que correm:
1) “Não permitamos que a rejeição do estrangeiro se introduza nas nossas
mentalidades, pois recusar o outro é o germe da barbárie” e 2) “A fraternidade
é o único caminho de futuro para preparar a paz”.
No
mundo inteiro, há homens, mulheres e crianças que são obrigados a deixar a sua
terra. A angústia que vivem cria neles a motivação de partir. E esta motivação
é mais forte que todas as barreiras erguidas para lhes impedir o caminho. Posso
dar testemunho disso por ter passado recentemente alguns dias na Síria. Em
Homs, a extensão das destruições causadas pelos bombardeamentos é inimaginável.
Uma grande parte da cidade está em ruínas. Vi uma cidade fantasma e ressenti o
desespero dos habitantes do país.
Hoje
são os Sírios que afluem à Europa, amanhã serão outros povos. Os grandes fluxos
migratórios a que assistimos são invencíveis. Não nos apercebermos disso seria
uma demonstração de miopia. Procurar regular estes fluxos é legítimo e mesmo
necessário, mas querer impedi-los construindo muros de arame farpado é
absolutamente inútil.
Perante
esta situação, o medo é compreensível. Resistir ao medo não significa que este
deva desaparecer, mas sim que não devemos deixar que nos paralise. Não
permitamos que a rejeição do estrangeiro se introduza nas nossas mentalidades,
pois recusar o outro é o germe da barbárie.
Numa
primeira etapa, os países ricos deveriam tomar uma consciência mais clara de
que têm a sua parte de responsabilidade nas feridas da História que provocaram
e continuam a provocar imensas migrações, nomeadamente de África ou do Médio
Oriente. E, hoje, algumas escolhas políticas permanecem fonte de instabilidade
nestas regiões. Uma segunda etapa deveria levar estes países a ir além do medo
do estrangeiro e das diferenças de culturas, colocando-se corajosamente a
moldar o novo rosto que as migrações já dão às nossas sociedades ocidentais.
Em
vez de ver no estrangeiro uma ameaça para o nosso nível de vida ou a nossa
cultura, acolhamo-lo como membro da mesma família humana. E assim
compreenderemos que, apesar de criar certamente dificuldades, o afluxo de
refugiados e de migrantes também pode ser uma oportunidade. Estudos recentes
mostram o impacto positivo do fenómeno migratório, tanto para a demografia como
para a economia. Porque será que tantos discursos salientam as dificuldades sem
dar valor ao que há de positivo? Os que batem à porta dos países mais ricos que
o seu levam estes países a tornar-se solidários. Será que não os ajudam a tomar
um novo impulso?
Gostaria
de situar aqui a nossa experiência de Taizé. É humilde e limitada, mas muito
concreta. Desde Novembro do ano passado, em colaboração com as autoridades e
algumas associações locais, acolhemos em Taizé onze jovens migrantes do Sudão –
a maioria deles do Darfur – e do Afeganistão, vindos da "selva" de
Calais. A sua chegada despertou uma impressionante vaga de solidariedade na
nossa região: há voluntários que vêm ensinar-lhes francês, médicos que os
tratam gratuitamente, vizinhos que os levam a fazer passeios e a dar voltas de
bicicleta… Rodeados por tanta amizade, estes jovens, que atravessaram
acontecimentos trágicos nas suas vidas, estão aos poucos a reconstruir-se. E
este contacto simples com muçulmanos muda o olhar das pessoas que os encontram.
Na
nossa aldeia, os jovens também foram acolhidos por famílias de vários países –
Vietname, Laos, Bósnia, Ruanda, Egipto, Iraque – que chegaram a Taizé ao longo
de décadas e que fazem hoje parte integrante do nosso ambiente. Todos eles
conheceram grandes sofrimentos, mas trazem à nossa aldeia muita vitalidade
graças à riqueza e à diversidade das suas culturas.
Se
uma experiência destas é possível numa pequena região, porque não haveria de
ser numa escala muito mais ampla? É um erro pensar que a xenofobia é o sentimento
mais partilhado, muitas vezes o que há é muita ignorância. Assim que os
encontros pessoais se tornam possíveis, os medos dão lugar à fraternidade. Esta
fraternidade implica pormo-nos no lugar do outro. A fraternidade é o único
caminho de futuro para preparar a paz.
Assumindo
juntos as responsabilidades exigidas pela vaga de migrações, em vez de
brincarem com os medos, os responsáveis políticos poderiam ajudar a União
Europeia a reencontrar uma dinâmica entorpecida.
Há
toda uma jovem geração europeia que aspira a esta abertura. Nós, que acolhemos
há muitos anos, na nossa colina de Taizé, dezenas de milhares de jovens de todo
o continente para encontros internacionais de uma semana, podemos constatar
isso mesmo. Aos olhos destes jovens, a construção europeia apenas encontra o
seu verdadeiro sentido mostrando-se solidária com os outros continentes e com
os povos mais pobres.
Há
muitos jovens europeus que não conseguem compreender os seus Governos quando
estes manifestam vontade de fechar as fronteiras. Pelo contrário, estes jovens
pedem que a uma mundialização da economia seja associada uma mundialização da
solidariedade e que esta se expresse em particular através de um acolhimento
digno e responsável dos migrantes. Muitos destes jovens estão dispostos a
contribuir para esse acolhimento. Ousemos acreditar que a generosidade também
tem um papel importante a desempenhar na vida urbana.
(*) Público
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