No
dia da apresentação do Orçamento de Estado de 2017 os comentadores de direita
da área de economia e não só enxamearam de tal modo todos os canais televisivos
que se tornou quase impossível ouvirmos uma opinião que justificasse a existência
de pluralismo no audiovisual. Foi preciso esperarmos pelo “Tabu” de Francisco
Louçã na SIC para os nossos ouvidos escutarem algo de novo e diferente em
relação ao que vinha a ser dito até então.
O
mesmo sucede relativamente a este artigo de opinião assinado por José Manuel Pureza,
que transcrevemos do Público de hoje.
A
direita agrediu o país durante quatro anos com um mantra sobre a suposta
inevitabilidade de empobrecermos para ficarmos ricos e de cortarmos direitos sociais
para termos uma sociedade mais justa. O caminho que a atual solução governativa
contrapôs a essa estratégia de injustiça tem dois pilares: recuperar
rendimentos para a população mais frágil e defender o Estado Social. Isso
ficara claro no orçamento para 2016. O orçamento para 2017, apesar de todas as
suas limitações, prossegue essa aposta.
Nenhum
reformado que, ao fim de uma vida inteira de trabalho e de descontos, tenha uma
pensão até 838 euros perderá poder de compra em 2017; e aqueles cuja pensão não
ultrapassa hoje os 628 euros vê-la-ão aumentada em 10 euros a partir de agosto.
A solidez das pensões futuras ficará reforçada com a afetação ao Fundo de
Estabilização da Segurança Social dos resultados da tributação de fortunas
imobiliárias acima dos 600 mil euros, mostrando assim que o suporte a políticas
sociais de justiça mínima não tem que assentar na penalização fiscal do
trabalho (e, já agora, é uma resposta à altura à histeria ideológica pelo
alegado ‘brutal ataque à classe média’). Os consumos de água e de eletricidade
pelas famílias mais pobres vão gozar de uma tarifa social. Os cidadãos com
deficiência veem orçamentado o apoio para assistência pessoal que lhes faculte
um projeto de vida independente fora de contextos de institucionalização ou de
assistência familiar. O subsídio de refeição, congelado desde 2009, terá um
aumento seis vezes superior à taxa de inflação. O salário mínimo nacional
subirá para 557 euros.
Chega?
Não, não chega de todo. Mas, para quem se empenha em mais justiça na economia,
valeu a pena o empenhamento nesta primeira fase da negociação do orçamento.
Digo-o com a consciência de que os impasses económicos e os problemas sociais
do país se mantêm, a exigir uma resposta à altura da sua complexidade. Se o
êxito da consolidação orçamental imposta pelos guardiões do euro continuar a
significar uma justiça, uma saúde, uma cultura ou um ensino condenados à
míngua, então é a própria democracia que exige que questionemos as
consequências de um aperto que se perpetua. Se o saldo primário das nossas
contas para 2017 é de 5 mil milhões de euros mas continuarmos a ter de afetar 8
mil milhões ao pagamento de juros da dívida, então é o bom senso e a
sobrevivência mesma da nossa economia que exigem que a renegociação da dívida
seja, enfim, assumida como uma prioridade nacional.
A
recuperação de rendimentos é uma condição de dignidade, mas essa recuperação
será sempre tímida se o país se mantiver refém de imposições europeias que
mutilam o investimento e paralisam os serviços públicos. As forças da maioria
política que viabiliza o Governo não podem eximir-se à responsabilidade de
transformar a esperança em futuro.
Neste orçamento, a aposta
foi, e bem, mantida. A crítica tem que o ser também.
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