No
momento em que passa um ano sobre as eleições legislativas que, em boa hora,
levaram à actual solução governativa em Portugal, muita da opinião publicada
tem este tema como referência. É o caso do artigo de opinião de Carvalho da Silva
(CS) que transcrevemos do Público de hoje onde o investigador e Coordenador do
CES em Lisboa se congratula com a convergência das esquerdas que permitiu
afastar do poder o governo de direita, de tão má memória para os portugueses. Mas
CS aproveita a ocasião para deixar também alguns avisos à navegação em algumas
partes do texto como, por exemplo, quando se refere à necessidade de um “novo
fôlego” para esta “boa solução de governação”
em que “a valorização do
trabalho e uma distribuição justa do rendimento sejam vetores fundamentais”.
A
atual solução governativa – que implicou recentrar o papel do Parlamento,
valorizando-o – e o programa executado pelo Governo PS foram úteis para o país
e muito positivos para a esmagadora maioria dos portugueses. O PS libertou-se
do “centrão” e, com o BE, o PCP e os Verdes, corporizou um novo sentido de
responsabilidade da esquerda. Reconheceram, com oportunidade, a necessidade de
convergência e têm sabido, não só manter-se fiéis aos compromissos, como dar
contributos positivos, ainda que limitados, na busca de soluções para problemas
inadiáveis.
Foi
apropriada a opção pela “urgência de reparar heranças inadiáveis de reposição
de vencimentos (…) de repor a normalidade no sistema educativo e no sistema de
saúde”. Esses passos permitiram a recuperação de um pouco de fôlego à sociedade
portuguesa, respondendo às justas expectativas da maioria dos portugueses, que
continuaram conscientes da luta constante contra “o final do mês”. É
provocatória a afirmação da direita de que o povo anda num contentamento
pacóvio.
Entretanto,
tornou-se premente uma nova articulação entre respostas conjunturais e a
abordagem de grandes temas estratégicos. O diálogo político entre os partidos
que suportam o Governo e, sobretudo, a mobilização de sectores sociais que vão
muito para lá do espectro partidário é condição necessária e indispensável para
um combate com êxito.
Esta
experiência de governação veio revelar a extrema dificuldade de conciliar
recuperação económica e dos direitos sociais com constrangimentos europeus cada
vez mais apertados. Para quem acreditava na possibilidade de flexibilizar as
posições das instituições da UE através da diplomacia e argumentos razoáveis, a
experiência da governação tem equivalido a uma dura aprendizagem. Contudo, tornou-se
num aspecto positivo desta governação: o Governo cedeu em diversas ocasiões,
mas até agora não quebrou. Com isso, adquiriu capacidade para enfrentar embates
previsivelmente duros no futuro. A consolidação orçamental exigida por Bruxelas
(na ausência de renegociação da dívida) traduz-se na compressão insustentável
do investimento público e na contenção de despesa. Por outro lado, prosseguirá
a pressão para a desvalorização salarial e a privatização parcial da segurança
social, ou seja, a UE e o FMI toleram a reposição da “normalidade” em alguns
domínios, mas querem a “anormalidade” a perdurar noutros.
Três
domínios apresentam-se, pois, como decisivos para o sucesso desta solução
política, no futuro próximo: o fim dos cortes nos serviços públicos, o relançamento
do investimento público e a necessária regulação e proteção do trabalho.
Serviços públicos de qualidade são condição para uma sociedade sã, qualificada
e motivada. O seu reforço deve ser bem articulado com o relançamento do
investimento público, real alavanca do investimento privado. Finalmente, a
proteção do trabalho e a correção de algumas políticas sociais são essenciais
para resolver o atual desequilíbrio social.
Esta boa solução de
governação precisa de novo fôlego, voltada para a inclusão de todos num projeto
nacional de desenvolvimento, onde a valorização do trabalho e uma distribuição
justa do rendimento sejam vetores fundamentais.
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