No
artigo de opinião que assina quinzenalmente no Público, o Prof. Santana Castilho
aborda hoje um tema particularmente pertinente para a profissão docente, que
tem a ver com a situação dos professores contratados. É de todo inaceitável que
desde “há décadas” o Ministério da Educação (ME) venha a fazer orelhas mocas à
justa reivindicação dos professores contratados no sentido de, uma vez por
todas, levar a cabo a sua vinculação aos quadros. A situação é tanto mais
escandalosa quando o ME não aplica aos docentes da escola pública aquilo que
obriga “terceiros” a cumprir. Santana Castilho fala mesmo num ziguezaguear das
entidades oficiais “nas negociações sobre o processo de
vinculação dos professores aos quadros”. Fica a suspeita – dizemos nós – de que
o ME está a protelar uma inevitabilidade pelo máximo tempo possível porque isso
significará mais uns milhões de euros que não chegam aos bolsos dos
professores.
“Sim, estamos a falar de gente que vive
bem explorando os novos escravos.” Esta frase é do director do PÚBLICO.
Escreveu-a no dia 20, elogiando uma denúncia de Manuel Narra, autarca da
Vidigueira, a quem pertence a expressão “novos escravos”. Substituamos “gente”
por Ministério da Educação e trabalhadores agrícolas por professores e a
afirmação redobra exponencialmente de legitimidade — porque o Ministério da
Educação (ME) tem vivido bem, sem escrúpulos, há décadas, escravizando os
professores contratados. Ou terá escrúpulos quem obriga terceiros a contratar
ao fim de três anos de trabalho instável, mas mantém, por décadas, a
precariedade dos seus?
Um observador atento e informado só pode
considerar vergonhosos os ziguezagues do ME nas negociações sobre o processo de
vinculação dos professores aos quadros. A 20 de Dezembro, na Assembleia da
República, a secretária de Estado Alexandra Leitão foi assertiva e clara quando
afirmou que os professores da rede privada não podiam concorrer em paridade com
os da rede pública. Há dias fez uma pirueta inteira e proclamou o contrário.
Num dia os contratos exigidos têm de ser no mesmo grupo de recrutamento. Noutro
dia já podem ser em grupos diferentes. Num dia só conta o tempo de serviço após
a profissionalização. Noutro dia já vale o tempo antes e depois da dita. Num
dia só ascenderão ao céu os que estiverem colocados em horários completos e
anuais neste ano lectivo. Noutro dia a aberração cai e a dança macabra
continua, iludindo uns e desiludindo outros, todos escravos de uma vida, que o
ME trata como lixo descartável.
Uma negociação séria e responsável só
podia partir das limitações que o Orçamento do Estado dita para este ano e
assumir, por imperativo do Código do Trabalho e da Directiva 1999/70/CE, o
compromisso de acolher nos quadros, até ao fim da legislatura, todos os que
cumprem os requisitos legais. Governantes adultos e com ética mínima limitar-se-iam
a estabelecer o faseamento dessa entrada, usando a lista nacional de graduação
dos professores. No contexto presente é o instrumento, o único, que garante
equidade e que acolhe as obrigações constitucionais. Suscita consenso. Porque
teimam em desrespeitá-la? Porque insistem em critérios opacos, que beneficiam
uns em detrimento de outros e somam injustiças gritantes a deploráveis decisões
anteriores?
Governantes que não façam da política
uma palhaçada não podem esquecer, no Governo, aquilo que defenderam na
oposição, a saber: a Resolução 35/2010, tomada nos termos do n.º 5 do art.º 166
da Constituição, após proposta do CDS-PP, recomendou a integração nos quadros
de todos os que tivessem dez anos de serviço. E, note-se bem, bastavam seis
meses em cada ano. Foi aprovada com os votos a favor do PS, PSD, CDS-PP, PCP e
PEV e a abstenção do BE; a Resolução 37/2010, tomada nos mesmos termos, após
proposta do PS, recomendou que fosse feito um levantamento exaustivo e rigoroso
das necessidades docentes permanentes das escolas e fosse aberto concurso
extraordinário que lhes desse resposta e garantisse a estabilidade do sistema.
Foi aprovada com os votos a favor do PS, PSD e CDS-PP e a abstenção do PCP, BE
e PEV.
A proliferação de regras e critérios
sociopáticos gerou uma confusão brutal e tornou cada vez mais difíceis novas
intervenções. Seja o que for que se proponha agora, sem fazer o que deve ser
feito, só legitima novas insatisfações. Um maldito estatuto de carreira
docente, com o qual Maria de Lurdes Rodrigues instituiu professores de primeira
(os titulares) e professores de segunda (todos os outros), foi o instrumento
perverso que iniciou uma divisão e uma disputa malquista, da qual a classe não
mais se libertou: contratados contra os do quadro; os da rede pública contra os
da rede privada; os dos quadros de agrupamento e de escola contra os dos
quadros de zona pedagógica e estes contra aqueles.
Quando o Estado fomenta isto, é de
direito ou é pérfido?
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