Todos
os esforços que os mais avisados em questões de energia nuclear possam fazer
para alertar as populações não são demais já que uma parte muito significativa
dos portugueses não está suficientemente informada para os perigos inerentes às
centrais nucleares de produção de electricidade.
Se
é certo que muito a tempo nos livrámos de ser instalada em Portugal uma central
nuclear, isso não nos pode deixar descansados já que temos, bem perto da nossa
fronteira e junto ao rio Tejo, uma que nos poderá trazer problemas gravíssimos
caso ocorra algum acidente de grandes proporções. É óbvio que estamos a falar
de Almaraz, uma situação que não podemos deixar no esquecimento pelos perigos
que comporta, não só para o presente mas, muito em especial, para o futuro das
vidas dos nossos filhos e netos.
É
bom não pormos de lado os monstruosos desastres ocorridos nas centrais
nucleares de Chernobyl (1986) e Fukushima (2011) que vão afectar milhares de
vidas por muitas gerações já que, como é do conhecimento geral, o nuclear leva
milhares de anos para se extinguir.
Muito
a propósito, deixamos aqui o seguinte texto assinado por António Eloy,
coordenador para Portugal do Movimento Ibérico Antinuclear, extraído do
Expresso de ontem, onde são enumerados os perigos de Almaraz.
Julgo
que foi há 40 anos, ainda com grãos de areia de Ferrel nos pés, que fiz o meu
primeiro comunicado sobre Almaraz. Na altura ainda o plano nuclear espanhol
previa centrais por todo o lado, algumas bem perto de nós (Sayago e Valdecabaleros),
mas Almaraz, com um reator que sabíamos não ter estabilidade no sistema de
arrefecimento (trepidações que em Ringhls, Suécia, já o tinham dado por
condenado), começaria no início dos anos 80 a produzir para a rede.
Já
foi necessária essa electricidade para o sistema espanhol e ibérico. Hoje, Espanha
exporta mais electricidade que a produzida em Almaraz. E até Portugal exporta
mais para Espanha do que os 36% que da Endesa se produzem nessa central. Ou seja,
salvo para os dividendos (há muito que está amortizado o investimento) e salvo
para o setor financeiro das empresas titulares, Almaraz é dispensável. Mesmo com
as restrições e constrangimentos que o Governo espanhol tem vindo a colocar às
[energias] renováveis e a políticas de eficiência energética.
Recordo
como se fosse hoje. Começara há poucos dias a produção e teve de parar. Os problemas,
incidentes, acidentes (quase meia dúzia com classificação no registo
internacional) já ultrapassaram os 80 e têm aumentado muito nos últimos anos. O
envelhecimento, corrosão, gasto de materiais articulado com a total falta de
cultura de segurança são elementos adicionais de risco. Em Almaraz houve fogos não
registados como acidentes, que na central de Vandellos, na Catalunha, foram
classificados de grau 3, levando ao seu encapsulamento.
Qualquer
central nuclear a funcionar perfeitamente não é um problema ambiental! Infelizmente
tal nunca aconteceu em nenhuma central. Todas têm problemas, todas são
emissoras de radiopartículas, todas podem ter acidentes.
As
estatísticas não nos auxiliam neste estertor dos parques nucleares. Grande parte
das centrais no mundo está a chegar ao fim da sua vida (in)útil. E só com
enorme protecionismo (como na hipotética de Hinckley) ou falta de democracia
(como na China, Irão, Coreia co Norte, ou até na Rússia) é que ainda continuam
a imaginá-las.
A
de Almaraz tem vários problemas substanciais. Desde logo a democracia que é uma
chatice, e depois a questão (obsoleta por demais e inexistente na ara da
energia e sobretudo da electricidade) da soberania.
De
que soberania estamos a falar? Qual é a nossa soberania e futuro se houver um
incidente grave ou um acidente em Almaraz? Soberania eletrica? Soberania das
águas? Soberania do risco? Soberania dos afetados?
A
nuvem de Chernobyl chegou aos Açores, motivou restrições agrícolas na Suécia e
no Sul de França, e na Alemanha foram dadas instruções para grávidas e crianças
se esporem o mínimo ao ar. Tudo a muito mais que os 30 Km que as nossas
autoridade dão como sendo de risco. O perigo é também um grave constrangimento
pessoal e coletivo, e já está a ter um custo.
Por
muito que seja faturado pelas empresas que detêm Almaraz, esses dividendos não
pagam a ansiedade e a incerteza que a central gera e apenas para produzir uma
quantidade de electricidade desnecessária. E continuaremos com um problema, que
é também um dos motivos pelo qual as companhias elétricas querem continuar a
correr o risco: o desmantelamento, o custo desconhecido do mesmo, e o que fazer
com os resíduos e onde os guardar.
O nuclear é uma tecnologia
que começou sem cabeça e que agora, na hora da morte, mostra que tem pés de
barro.
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