“A
Altice não é flor que se cheire”, título do artigo de opinião que Nicolau Santos
assina no Expresso Economia deste sábado condiz exactamente com aquilo que muitos
portugueses começam a percepcionar sobre aquela empresa de telecomunicações,
fundada e liderada pelo bilionário francês Patrick Drahi, com sede na Holanda e
presente em vários países, entre os quais Portugal.
Quando
se instala num país, a Altice mune-se das melhores equipas de advogados que
procuram todos os buracos existentes na lei para levarem por diante os seus
execráveis intentos. Portugal não é excepção, como se tem vindo a constatar, o
que já levou a uma grande manifestação de trabalhadores da PT, fortemente
ameaçados de despedimento caso não seja colocado um travão nos malévolos desígnios
da Altice, dona da PT. Estamos perante mais um caso em que a opinião pública
pode ter um papel determinante caso a imagem daquela empresa seja fortemente
colocada em causa.
A preocupação do primeiro-ministro e dos partidos de
esquerda com o destino da PT vem tarde. Com efeito, a Altice comprou a PT
Portugal por €5,7 mil milhões aos brasileiros da Oi em 2015. Foi um negócio
entre empresas estrangeiras. Sim, a operação teve a bênção do Governo de então,
mas o Estado português não pode vir agora colocá-la em causa. E quando a Altice
avança para a compra da TVI, detida pela Prisa, é de um negócio entre duas
empresas europeias que se trata.
A preocupação com a PT vem tarde. A compra foi em
2015. E o nome vai mudar para Altice. A PT, como a conhecemos, já não existe
Dito isto, há ou não razões de preocupação? Há e são
muitas. Desde logo pelo perfil do fundador e presidente da Altice, Patrick
Drahi, que tem nacionalidade israelita, francesa e portuguesa. Quando comprou a
Cabovisão em 2015, a sua primeira aquisição em Portugal, disse: “Não gosto de
pagar salários. Pago o menos possível.” E um excelente trabalho publicado esta
semana na revista “Visão” diz que ele “trata as pessoas com desprezo desde o
primeiro dia”. Poderiam ser só palavras do próprio ou de quem não gosta dele.
Mas não são. Na Cabovisão, na ONI e depois na PT, as empresas que já comprou em
Portugal, a Altice tem-se comportado como um típico raider financeiro: lança de
imediato um ultimato aos fornecedores, impondo-lhes uma descida drástica no
preço dos serviços que fornecem (no caso da PT, o corte foi de 30%); e faz
despedimentos coletivos ou cria situações de enorme desconforto aos
trabalhadores (retirada de benefícios sociais e de fringe benefits, cortes de
parte dos salários, eliminação de postos de chefia, colocação noutras empresas
do grupo ou associadas) que levam muitos deles a demitir-se. A estratégia tem
um único objetivo: obter rapidamente cash pelo corte dos custos para fazer face
à montanha de endividamento do grupo, que ascende a €82,1 mil milhões (!). É
que Drahi faz aquisições atrás de aquisições, mas com base no dinheiro dos
bancos (a quem deve perto de €50 mil milhões), uma corrida que tem tanto de
embriagadora como de perigosa. Drahi discorda, claro: “Se parar com o meu
desenvolvimento ‘bulímico’, por assim dizer, dentro de cinco anos não terei
dívidas. E depois? Isso seria idiota porque durante cinco anos não teria
registado crescimento”, disse na Assembleia Nacional francesa.
O que Drahi pretende é desenvolver um grupo
multinacional de telecomunicações e media, para combater gigantes como a
Google, Facebook, Amazon, WhatsApp e Yahoo, que utilizam sem pagar os suportes
digitais construídos e pagos pelas telecoms e os conteúdos produzidos pelos
media. Só que esta estratégia de integração já foi tentada e correu mal em todo
o mundo. Com Drahi vai correr bem? Logo veremos. Mas quando se começa a pagar
mais pelo que se compra do que aquilo que vale (caso da TVI), isso é sinal
senão de desespero, pelo menos de fuga para a frente, que costuma acabar sempre
mal.
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