O
anterior Governo de maioria PSD/CDS, ideologicamente conotado com o que de mais
radical existe no neoliberalismo dominante mostrou pela sua prática uma defesa
acérrima do “funcionamento selvagem dos mercados”. Privatizar tudo o que mexe
foi o lema de Passos Coelho e Portas, inimigos figadais do 25 de Abril. Levariam
esta tendência ao extremo não se desse o entendimento à esquerda que conseguiu colocar
um travão na fúria privatizadora e recuperar alguns rendimentos para os
cidadãos mais desfavorecidos.
Exemplos
recentes de tragédias como a dos incêndios que ceifaram dezenas de vidas, ou o
ciberataque à escala mundial a que podemos juntar a completa desregulação da
actuação dos drones vêm provar que sem uma forte intervenção do Estado, o
funcionamento do sistema capitalista torna-se uma selva onde os mais fracos são
dizimados pelos mais poderosos.
O
texto seguinte é a transcrição de um artigo se opinião de Nicolau Santos do
Expresso Economia do passado sábado, onde aquele jornalista chama a atenção para
a necessidade de “limitar
os resultados perversos do funcionamento selvagem dos mercados”.
Hayek e os seus filhotes sempre viram o Estado como um
empecilho à iniciativa privada e a sua agenda tem sido o desmantelamento de
todos os instrumentos que os governos possam utilizar para limitar os
resultados perversos do funcionamento selvagem dos mercados. A globalização e a
financeirização da economia mundial são a pedra de toque dessa estratégia,
diminuindo em inúmeros domínios as soberanias nacionais e a capacidade de os
Estados defenderem os seus interesses. Em Portugal, os organismos públicos de pensamento
estratégico foram, pouco a pouco, fragilizados ou extintos ao longo dos anos.
Durante o período de ajustamento e o consulado do Governo PSD/CDS esta
tendência foi acelerada e agravada drasticamente.
Vem isto a propósito de tragédias. Em Pedrógão Grande,
todos os dedos acusadores apontam para o Estado e para o Governo, que terão
seguramente muitas responsabilidades. Mas é conveniente lembrar que só 2% da
floresta são públicos e que o sistema de comunicações de emergência que
colapsou nasce de um banco privado que é um caso de polícia, o BPN, e que 40%
do capital privado desse sistema de comunicações são de duas entidades, uma
falida e outra à beira disso, do universo SLN, dona do tal BPN.
O mercado livre é o melhor que há. Deixado à solta é
completamente irresponsável. É por isso que os Estados não podem nunca abdicar
de intervir nos mercados
A próxima grande tragédia está à vista (e longe vá o
agouro): a queda de um avião comercial devido a um drone. Desde o início do ano
vamos em onze (!) incidentes reportados com drones, obrigando os aviões a
desviar-se para não colidir com eles. Ora os drones são comercializados por
privados e usados por privados. Mas se o Estado não entra a matar e pune
duramente quem os usa de forma irresponsável, não será o mercado que vai
regular estes comportamentos imbecis e perigosos. E se houver a tal tragédia
(longe vá o agouro) vamos lembrar-nos muito de quem se bateu ferozmente para
não se construir um novo aeroporto internacional longe de Lisboa.
Outra tragédia: o segundo grande ciberataque mundial.
Ele ocorre essencialmente num sistema operativo, o Windows, que é utilizado a
nível mundial. É um sistema privado, que também é utilizado por muitas
entidades públicas. E por isso as suas vulnerabilidades colocam em causa os dados
confidenciais de milhões de cidadãos. Ora, mais uma vez, se não são os Estados
a intervir nesta matéria, obrigando ao reforço drástico da segurança dos
sistemas operativos, os ciberataques vão tornar-se cada vez mais frequentes e
qualquer cidadão pode ser alvo de processos kafkianos que poderão destruí-lo
pessoal e profissionalmente.
Conclusão: o mercado livre é o melhor que há. Deixado
à solta é completamente irresponsável. É por isso que os Estados não podem
nunca abdicar do seu papel de intervir nos mercados. E é por isso que as ideias
dos filhotes de Hayek têm de ser combatidas a cada novo dia.
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