Apesar
de todos os apelos que fez ao diabo para que lhe desse uma ajuda no sentido de
encher de pedras o percurso deste Governo, a direita não conseguiu qualquer
colaboração do mafarrico e, vai daí, lançou mão aos resultados de uma tragédia de
cuja origem tem fortes culpas, para não falarmos do desaparecimento das armas
de Tancos – “desaparecimento” talvez seja a palavra mais adequada para se
designar o que se passou naquela unidade militar – uma história não totalmente
esclarecida.
Como
já tem sido afirmado, Passos e Cristas, quando não têm factos para basearem as
suas críticas, inventam-nos. O que se passou em Tancos, veio mesmo a calhar
para se tentar alarmar a opinião pública… Só que, também aqui a direita se saiu
mal apesar da prestimosa colaboração de alguns escribas da sua área que pululam
na comunicação social.
A
verdade nua e crua é que, nesta altura, os portugueses sentem que as forças que
suportam este Governo têm empreendido políticas que, com as limitações impostas
pela UE, vão conseguindo pequenas melhorias na vida dos nossos cidadãos. É este
o tema de fundo do interessante artigo de opinião de Domingos Lopes que
transcrevemos do Público de hoje.
No debate sobre o Estado da Nação na
Assembleia da República, no preciso momento em que Coelho, Montenegro, Cristas
e Telmo anunciavam o colapso da Estado, tudo em Portugal funcionava
normalmente. Sem exagero, o debate enchia o país mediático e esvaziava-se nas
ruas.
Nesse dia, ao contrário do que sucedia
há três anos, os portugueses levantaram-se sem se interrogarem a si próprios e
aos concidadãos acerca dos cortes nos rendimentos que o governo iria fazer para
os empobrecer; qual seria o aumento das taxas moderadoras; quais seriam as
escolas que fechariam assim como os centros de saúde; quanto aumentaria o IMI;
quantos bens públicos passariam para os donos disto tudo; quanto aumentariam as
portagens e os transportes públicos; quanto seria o corte nas pensões e no Serviço
Nacional Saúde; quantos tribunais fechariam; e quanto aumentariam as custas
judiciais; quanto tempo teriam de esperar os advogados do Apoio Judiciário
pelos honorários; quantos enfermeiros emigrariam; quantos portugueses teriam de
se alimentar na sopa dos pobres; quantas crianças iriam para a escola sem comer
porque os pais estavam no desemprego.
O Estado tinha colapsado — em vez de
garantir a coesão social, favorecia o empobrecimento e o enriquecimento da meia
dúzia de tubarões. Em vez de proteger os mais vulneráveis, apadrinhava os
super-ricos para se tornarem mais ricos e os carentes mais carentes. Tirando a
quatro milhões de portugueses umas dezenas ou centenas de euros, entregando-os
aos que criaram e fomentaram a crise, empobreciam a maioria e enriqueceriam os
bilionários e assim, nesta ordem de ideias, se reestabelecia a normalidade e a
pobreza de Portugal torná-lo-ia um dos mais competitivos do mundo.
Este era o sonho cor-de-rosa de Coelho,
Portas, Montenegro, Maria Luís, Vitor Gaspar, Marco António e tutti quanti
se empenharam no empobrecimento do país. O que a coligação Portugal À Frente
levou a cabo foi um verdadeiro Portugal para trás, para níveis de vida de
décadas atrás, tudo com pompa e circunstância.
Havia no acordar dos portugueses uma
espécie de angústia porque de cima do altar do poder, o sumo pontífice
anunciava todas estas medidas como punição. Quando os banqueiros e os seus
políticos do arco do governo mandaram gastar, os portugueses, como é bom de
ver, nem sequer precisavam que lhes dissessem.
Porém, vinham agora os do poder brandir
a espada da punição por acreditarem no que lhes anunciaram e lhes ofereceram à
mão de semear: créditos à habitação, para compra de carro, pessoais, para
férias, para comprar tudo e um queijo da serra. Para além da vontade de cada
um, o sistema financeiro cativava os portugueses até ao dia em que Coelho,
Portas, Maria Luís os quiseram punir por terem acreditado no que lhes tinham
prometido. O que interessava era o sistema financeiro.
Quando acordavam há dois ou três anos
atrás tinham um sabor a fel na alma porque pertenciam a um país, a uma pátria,
cujos governantes, como o tal senhor ministro holandês, os tratavam mal e os
mandavam para longe.
Eram as depressões, a pobreza, o
desemprego a crescer, as desesperanças a grassar. E ao mandarem-nos para fora
bajulavam os ricos de fora para tomar conta disto, viessem de onde viessem; o
que contava é que tomassem conta de tudo o que dava lucro.
Havia como que uma cativação geral da
alma e da carteira do país. Todos estavam cativos dos governantes e dos
senhores que mandam na União Europeia. Portugal tinha cá um Estado-maior da
imperatriz Merkel.
Quem cá ficou, ficou mal. E os que
partiram, mal ficaram porque longe do país que deles precisava e onde gostavam
de ficar. Era este o país que colapsava. O país que Passos e Cristas queriam
que não saísse dessa estrada do empobrecimento.
Como já não têm nada para prometer vivem
como os cucos. Sem vergonha, prometem o que espezinharam. Basta-lhes uma
desgraça para ganharem fôlego. Basta-lhes umas dezenas de armas desaparecidas,
não se sabe em que circunstâncias, para se animarem.
Porém, ao levantarem-se, cada dia,
destes últimos dois anos, os portugueses pensam em viver melhor, em recuperar
rendimentos, em lutarem com esperança contra o que está mal. Sem aquela praga
da punição que lhes azedava a alma.
No dia do debate do Estado da Nação,
quem não ouvisse as notícias percorreria o seu quotidiano com a esperança que
perdura, ténue seguramente, mas esperança. Os cucos vieram depois da primavera
se ter ido e aguardam novas desgraças. Os portugueses agarram-se à esperança,
mesmo ténue. Entre a punição e a esperança preferem a última.
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