sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

DEMOCRATIZAR INSTITUIÇÕES DA UE


Desde há muito que se constata que em Bruxelas existe “um simples comissariado” do governo alemão, cuja principal função é defender, acima de tudo, os interesses do país da chanceler Merkel e do capital financeiro, com inevitáveis prejuízos para países como Portugal.
Numa altura em que estamos a pouco mais de três meses das eleições para o Parlamento Europeu, é muito importante que se coloque, de forma muito forte, a problemática da democratização das instituições de Bruxelas dando a palavra às populações que constituem a UE. Não é possível continuar a permitir que as principais decisões tenham por base os interesses do capital financeiro que bem se está borrifando para a miséria que está a causar a milhões de pessoas.
O texto a seguir, que transcrevemos do Diário de Coimbra de ontem, é parte de um artigo de opinião em que o autor (*) se debruça sobre a actual problemática europeia.
À partida, é sempre aleatório considerar que um problema é facilmente ou não resolúvel ou se uma solução política, num determinado momento histórico, pode ter algumas características de perenidade. Tal é percetível quando se estudam especialidades como “metodologias na resolução de problemas” – tema que continua banalizado nas universidades portuguesas – mas é mais fraturante quando passamos para o quotidiano, para a simplicidade aparente da realidade com que nos confrontamos e que tem, pelo menos, uma virtude, a transmissão de experiências.
Estas observações surgiram-me na sequência de uma busca que, no passado fim de semana, fiz a alguns dos meus arquivos sobre a posição de alguns filósofos contemporâneos sobre a Europa, antes e depois da queda do muro de Berlim. Encontro, assim, uma longa entrevista com Jürgen Habermas (Le Monde, 14/10/93), em que propõe avançar para uma união política, evitando fazê-lo “por meios administrativos, sem sustentação das populações e pela não democratização das instituições de Bruxelas”.
Por simples casualidade, eis-me confrontado com as declarações do antigo chanceler Helmut Schmit (1974/82), ao Die Zeit, no cinquentenário da conferência sobre segurança de Munique, que também decorreu no passado fim de semana, e no qual sublinhou que a Europa continua a sobrestimar a sua importância, pelo peso do seu passado histórico. Sobre os novos poderes e para espanto de tão seleta audiência, o antigo chanceler foi à raiz dos problemas, evocando não os terroristas, mas “os financeiros que originaram a miséria de milhares de pessoas, sem nada se poder fazer”, pelo que a Europa, em vez de andar a intervir na Líbia, Mali ou no sul do Sudão, faria melhor “em se concentrar sobre as suas próprias tarefas internas”.
Ao que tudo indica, foi nessa problemática interna que incidiu a deliberação tomada, na sexta-feira, pelo Tribunal Constitucional Alemão, quanto ao programa de aquisição ilimitada de dívida soberana dos estados membros pelo Banco Central Europeu (BCE), remetendo tal decisão para o Tribunal de Justiça da União Europeia, em Estrasburgo. Qualquer que seja a posição final deste último tribunal, quero deixar aqui claro que a posição hegemónica alemã, impondo regras financeiras absurdas, de que tem sido, aliás, quase a única beneficiária, diminuiu os encargos, relativamente à sua dívida soberana, em oitenta mil milhões de euros. Acrescento que pela existência atual em Bruxelas de um simples comissariado, tal posição imperial atinge países como Portugal, apesar da sua proverbial subserviência ultrapassar, de longe, a própria lógica implacável dos mercados.
(*) João Marques, Diplomado em Ciências da Comunicação

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