Desde há muito que se constata que em Bruxelas
existe “um simples comissariado” do governo alemão, cuja principal função é
defender, acima de tudo, os interesses do país da chanceler Merkel e do capital
financeiro, com inevitáveis prejuízos para países como Portugal.
Numa altura em que estamos a pouco mais
de três meses das eleições para o Parlamento Europeu, é muito importante que se
coloque, de forma muito forte, a problemática da democratização das instituições
de Bruxelas dando a palavra às populações que constituem a UE. Não é possível
continuar a permitir que as principais decisões tenham por base os interesses
do capital financeiro que bem se está borrifando para a miséria que está a causar
a milhões de pessoas.
O texto a seguir, que transcrevemos do
Diário de Coimbra de ontem, é parte de um artigo de opinião em que o autor (*)
se debruça sobre a actual problemática europeia.
À partida, é sempre aleatório
considerar que um problema é facilmente ou não resolúvel ou se uma solução
política, num determinado momento histórico, pode ter algumas características
de perenidade. Tal é percetível quando se estudam especialidades como “metodologias
na resolução de problemas” – tema que continua banalizado nas universidades
portuguesas – mas é mais fraturante quando passamos para o quotidiano, para a
simplicidade aparente da realidade com que nos confrontamos e que tem, pelo
menos, uma virtude, a transmissão de experiências.
Estas observações surgiram-me
na sequência de uma busca que, no passado fim de semana, fiz a alguns dos meus
arquivos sobre a posição de alguns filósofos contemporâneos sobre a Europa,
antes e depois da queda do muro de Berlim. Encontro, assim, uma longa entrevista
com Jürgen Habermas (Le Monde, 14/10/93), em que propõe avançar para uma união
política, evitando fazê-lo “por meios administrativos, sem sustentação das populações
e pela não democratização das instituições de Bruxelas”.
Por simples casualidade,
eis-me confrontado com as declarações do antigo chanceler Helmut Schmit
(1974/82), ao Die Zeit, no cinquentenário da conferência sobre segurança de
Munique, que também decorreu no passado fim de semana, e no qual sublinhou que
a Europa continua a sobrestimar a sua importância, pelo peso do seu passado
histórico. Sobre os novos poderes e para espanto de tão seleta audiência, o
antigo chanceler foi à raiz dos problemas, evocando não os terroristas, mas “os
financeiros que originaram a miséria de milhares de pessoas, sem nada se poder
fazer”, pelo que a Europa, em vez de andar a intervir na Líbia, Mali ou no sul
do Sudão, faria melhor “em se concentrar sobre as suas próprias tarefas
internas”.
Ao que tudo indica, foi nessa
problemática interna que incidiu a deliberação tomada, na sexta-feira, pelo
Tribunal Constitucional Alemão, quanto ao programa de aquisição ilimitada de
dívida soberana dos estados membros pelo Banco Central Europeu (BCE), remetendo
tal decisão para o Tribunal de Justiça da União Europeia, em Estrasburgo. Qualquer
que seja a posição final deste último tribunal, quero deixar aqui claro que a
posição hegemónica alemã, impondo regras financeiras absurdas, de que tem sido,
aliás, quase a única beneficiária, diminuiu os encargos, relativamente à sua
dívida soberana, em oitenta mil milhões de euros. Acrescento que pela
existência atual em Bruxelas de um simples comissariado, tal posição imperial
atinge países como Portugal, apesar da sua proverbial subserviência
ultrapassar, de longe, a própria lógica implacável dos mercados.
(*) João Marques, Diplomado em Ciências da
Comunicação
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