Quem leu com atenção a revista 2 do
Público de hoje, deve ter notado uma curiosa crónica de Nuno Pacheco onde se
faz referência a mais uma contradição de Paulo Portas, certamente muito mais
significativa do que a conhecida invalidação do “irrevogável”. É provável que
pouca gente ainda se recorde do acontecimento pelo que achámos muito
interessante mencioná-lo aqui.
A situação referida por
Nuno Pacheco ocorreu há mais de 20 anos durante um programa televisivo, Raios e
Coriscos, de Manuela Moura Guedes de
onde sobressai um jovem bem-falante, a gesticular de forma enérgica,
argumentando contra quem lhe garante que o poder é capaz de seduzir toda a
gente, incluindo ele. Mas o jovem riposta, peremptório (a citação que se segue
é literal): “Jamais. O poder é a pior coisa que há. Eu sou geneticamente contra
o poder, seja ele de quem for. Já houve n, já houve n, centristas, sociais-democratas,
populistas, não sei quê, não sei que mais. No dia em que algum amigo meu lá
chegar, eu passo-me para a oposição ou deixo de ser amigo dele.” Isto soava a
promessa solene. Pois não demorou muito a deixar de soar. O jovem tornou-se
deputado e chegou, calculem, a vice-primeiro-ministro. Chama-se Paulo Portas. O
programa em questão, Raios e Coriscos, de Manuela Moura Guedes (o elucidativo
excerto pode ser visto no Youtube), foi gravado em 1993, já lá vão duas
décadas. Portas era, então, jornalista e director d’O Independente. Dois anos
depois abraçou “a pior coisa que há”: foi deputado, aqui e na Europa, vereador,
líder partidário e, claro, ministro. Eh, amigos de Paulo Portas: seguiram o seu
conselho? Estão na oposição? Deixaram de ser amigos dele? Se não sabemos isto,
pelo menos ficámos a compreender melhor o “irrevogável” de 2013. Se Portas
contrariou até os próprios genes (“eu sou geneticamente contra o poder, seja
ele de quem for”) por que não havia de revogar uma simples palavra, descartando-lhe
o sentido?
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