O
texto seguinte é a transcrição de um artigo de opinião assinado por João Camargo,
engenheiro do ambiente e investigador em alterações climáticas, no Expresso de
ontem (18/6/2016), sobre a “fraude” relacionada com a prospecção de petróleo em
Portugal. Como ele afirma no final, “é preciso desmascará-la e acabar com ela”.
Torna-se, por isso, importantíssimo esclarecer atempadamente uma opinião
pública muito mal informada sobre os graves perigos que nos esperam, a todos os
níveis, caso seja permitido que grandes multinacionais da indústria petrolífera
coloquem as suas garras no território nacional, tanto em terra como no mar.
Daqui não virá qualquer benefício para os portugueses, a qualquer nível, e,
ainda por cima, veremos contaminadas grandes extensões dos nossos solos e reservas
de água assim como a “biodiversidade marinha”, com grande impacto na pesca e
noutras actividades que criam emprego para muita gente.
Frase
por frase, é extremamente importante uma leitura e reflexão atenta do texto
seguinte.
A
audição parlamentar desta semana do presidente da Entidade Nacional para o
Mercado dos Combustíveis (ENMC) Paulo Carmona trouxe um esclarecimento que há
muito era exigido, destruindo um dos argumentos centrais utilizados pelos
apologistas do petróleo em Portugal: o de que os contratos seriam de sondagem e
prospeção e não de exploração e produção de petróleo. Carmona declarou na
Comissão de Economia que nenhuma empresa a quem tenham sido atribuídos direitos
de exploração petrolífera pode ser proibida de efetivamente explorar petróleo,
confirmando aquilo que está claramente descrito nos 15 contratos de concessão por
todo o país (quatro em terra e 11 no mar).
O
presidente da ENMC esclareceu os deputados e o país ao declarar que “não há
opção política” entre as fases de prospecção e a fase de exploração, o que
significa que as decisões de Manuel Pinho, de Álvaro Santos Pereira e de Jorge Moreira
da Silva de entregarem 33 mil quilómetros quadrados no mar e 4826 quilómetros quadrados
em terra, À Repsol, à Galp, à Partex (Gulbenkian), à ENI, à Kosmos, à Australis
e à Portfuel de Sousa Cintra são autorização de exploração de petróleo no mar
da maior parte do litoral português e de uma área do tamanho de todo o Algarve
em terra. A própria Portfuel, que pagou um comunicado em vários jornais desta
semana, foi desmentida: não existe nenhum contrato de prospeção de oito anos,
mas apenas um contrato de 50 anos, de propspeção, pesquisa, desenvolvimento e produção
de petróleo.
Enterra-se
o mito de que as empresas estariam a fazer prospeção por caridade para dar a
conhecer ao país as características do seu subsolo, o que foi repetidamente
invocado, quer na imprensa quer em sessões por todo o país das petrolíferas e
da ENMC, que é simultaneamente promotora e reguladora da exploração de petróleo
e gás em Portugal.
Restam
alguns mitos por desmontar, para colapsar totalmente a fraude do petróleo em Portugal:
o de que serão criados muitos postos de trabalho, o de que haverá um
enriquecimento do país, o de que os combustíveis ficarão mais baratos e o de
que não haverá impacto ambiental.
A
criação de postos de trabalho numa potencial indústria petrolífera seria
irrisória: alguns técnicos estrangeiros para trabalho especializado, poucos
operários não especializados para gestão de alguns trabalhadores de obras para
montar infraestruturas básicas. A destruição de milhares de postos de trabalho
em turismo e conservação seria uma garantia – apenas o rumor da exploração de petróleo
tem já impacto na redução de turismo e emprego no Algarve.
O
enriquecimento do país só pode ser invocado por quem não leu os contratos de
concessão. As rendas são cómicas: 600 mil euros mensais, menos do que o salário
de António Mexia, por uma área equivalente a mais de um terço do país durante
mais de 50 anos. Os royalties
dependentes da produção alinham-se pelos padrões mais baixos do mundo: entre os
0,2% e os 9% no mar, entre os 3% e os 8% em terra. A desvalorização de terrenos
e propriedades nas zonas concessionadas será vertiginosa e o prejuízo económico
para as regiões avassalador.
Sobre
uma baixa do valor dos combustíveis, os contratos são perentórios: o petróleo produzido
pertence 100% às concessionárias, não existe nenhuma obrigatoriedade de ficar
no mercado nacional e o Estado não fica com nada. É como achar que por a Galp
descobrir petróleo em outros países baixaria o preço da gasolina em Portugal. Não
acontece e não acontecerá.
Finalmente,
e mais importante, a ideia de que há exploração “segura” de combustíveis
fósseis é irracional. Os combustíveis fósseis são responsáveis pelas alterações
climáticas e pelo aquecimento do planeta que está a degradá-lo a uma escala sem
paralelo desde que há Humanidade, ameaçando a civilização humana. A nível
local, a exploração em terra por fraking
destrói solos e água com químicos agressivos, legando uma degradação irreversível
que mata regiões inteiras. No mar, a opção do offshore não tem como única
ameaça as grandes marés negras: as perdas de petróleo são diárias e produzem um
impacto permanente sobre a biodiversidade marinha e todas as actividades
marinhas, desde a pesca às recreativas.
A fraude do petróleo em Portugal
engana um país inteiro. Contribuiria apenas para empobrecer as populações e
degradar o território em nome de uma mudança mirífica, impossível de acontecer,
cujos efeitos destrutivos se materializariam sempre. É preciso desmascará-la e
acabar com ela.
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