segunda-feira, 30 de abril de 2018

É FALSO QUE O PETRÓLEO NOS PROPORCIONE RIQUEZA



O texto seguinte é justamente a transcrição de um artigo de opinião que a socióloga Luísa Schmidt (LS) assina no “Expresso” deste sábado, com o muito apropriado título A quimera do óleo. De facto constitui uma ilusão do tamanho do mundo a ideia largamente propagandeada de que a extracção de petróleo em Portugal nos irá proporcionar combustíveis mais baratos e encher o país de riqueza. Num texto tão curto quanto tem de ser um artigo de opinião para introduzir num jornal, LS diz tudo quanto é necessário para desmistificar qualquer fantasia que tenha a ver com um imaginário benefício que os portugueses venham a ter pela extracção de petróleo no nosso país.
Mesmo importante é retermos que “a ideia desviada de que Portugal fica rico porque afinal tem petróleo, se tiver algum, é uma quimera”.
A questão da extração do petróleo em Portugal — particularmente a do furo ao largo de Aljezur — alastra. A conversa tornou-se, aliás, oleosa. Olhemos, pois, para ela a alguma distância, para não fazer nódoas.
A utilização do petróleo e dos seus inúmeros derivados é coisa que não vai acabar amanhã, mas é mais do que certo que, cedo ou tarde, e quanto mais cedo melhor, o petróleo deixará de ser desperdiçado a fazer andar transportes. As energias renováveis e, por isso, sustentáveis, cobrirão uma percentagem crescente das exigências energéticas de uma sociedade de alta tecnologia e de sistemas de informação.
A este processo de mudança chama-se transição energética e dele depende uma coisa bem simples e essencial: o futuro da espécie humana e de muitas outras que nos acompanham num planeta cujos ciclos estão assustadoramente perturbados pela queima de combustíveis fósseis, entre eles o petróleo. Já não é controverso.
Portugal é um país que se colocou depressa e bem na linha da frente da investigação científica, da aplicação tecnológica e do desenvolvimento industrial dessas energias renováveis que substituirão cada vez mais a queima do petróleo. É uma vantagem que temos e que está virada para o futuro. Falta-lhe agora é um estímulo vigoroso à mobilidade elétrica e à eficiência energética.
Ora bem, perante isto, o Governo, apesar de ter assinado os Acordos de Paris, prepara-se para autorizar a prospeção do petróleo. Em traços gerais, é como se puséssemos a Autoeuropa a montar carros de bois... Um verdadeiro anacronismo.
Esta situação aparece hoje envolta num novelo de obscuridades que se tenta passar para a opinião pública num festival de milhões, tanto de barris como de euros. Ora, o petróleo eventualmente a extrair em Portugal não é português — é dos consórcios internacionais que o vão transformar e comercializar segundo os sistemas e aos preços internacionalmente consagrados. A haver petróleo em Portugal ele nem vai ser ‘nosso’, nem a gasolina para os carros vai ficar mais barata.
Dir-se-ia que o que importa são as rendas, os impostos, as royalties... Mas, justamente, o Estado português fez contratos de tal modo ruinosos na atribuição destas concessões, que a percentagem que lhe vai caber é ridícula e quase insignificante quando distribuída ao longo dos muitos anos de concessão. Contudo, se os benefícios a auferir são poucos, distribuídos por muito tempo e muito provavelmente ínfimos dado os mais do que duvidosos valores a realizar, já os riscos ambientais são reais e na prática correm totalmente por nossa conta. Não há indemnização que efetivamente compense os estragos produzidos por um derrame, mesmo pressupondo, por fantasia, a celeridade das seguradoras e dos tribunais.
E tudo isto se prepara no momento em que ganha ascensão no nosso país a economia do mar em larga medida muito dependente dos equilíbrios ecológicos: das pescas à indústria farmacêutica, do turismo às novas descobertas de outros valiosos recursos, tanto na chamada coluna como no fundo do mar.
A ideia desviada de que Portugal fica rico porque afinal tem petróleo, se tiver algum, é uma quimera. É hoje a nossa quimera do óleo e, tal como a quimera do ouro foi sobretudo uma história de pobrezas, também esta é para isso que nos pode empurrar.
Entretanto, esperemos que o ministério do Ambiente exista e decida a imperativa necessidade de uma avaliação de impacte ambiental sobre o furo de prospeção em Aljezur, feita, claro, por uma entidade independente e não pelos interessados. A decisão tem que estar tomada até 13 de maio. Valha-nos Nossa Senhora!

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