Em qualquer país onde haja eleições democráticas, a grande massa dos votantes é por pessoas consideradas genericamente pobres ou, classe média. Os ricos são sempre poucos e, cada vez parece serem menos dada a brutal concentração da riqueza a que assistimos a nível mundial.
Assim, em todo o lado, os candidatos da direita, cujas políticas são essencialmente favoráveis aos ricos fazem truques de imaginação para conseguirem captar os votos dos pobres, sem os quais não conseguiriam alcandorar-se ao poder. E vão para lá defender interesses, contrários à maioria daqueles que lhes deram o voto. E é tanto assim que as desigualdades sociais são cada vez maiores. À escala de cada país isto é tão válido nos Estados Unidos como em Portugal.
No texto que apresentamos a seguir, transcrito do Público de hoje pode ler-se a certa altura que, os seis herdeiros de Sam Walton, fundador da Wallmart, possuem tanta riqueza como 100 milhões de americanos. Em 2010, 93% do rendimento nacional dos EUA ia para 1% da população e o clássico Coeficiente de Gini (que mede a desigualdade) atingiu recordes no mês de Setembro. É o maior desde a grande depressão de 1930. Num curto parêntesis acrescente-se que a Walmart é a maior multinacional americana de comércio a retalho.
A crítica contida nesta crónica é uma chamada de atenção para uma situação comparável que se passa em Portugal – as políticas de direita são altamente prejudiciais para a maioria da população. Vale a pena a sua leitura atenta tendo sempre em conta que Obama, à escala europeia, não é de esquerda.
No mundo de fantasia de Mitt Romney (*)
Imaginem 20 crianças a brincar numa sala com imensos brinquedos. Uma das crianças, mais possessiva, apodera-se, de forma egoísta, de todos os brinquedos. Algumas crianças ficam, ainda, com um brinquedo cada. Porém, as restantes 90% ficam de mãos vazias e observam-se, atónitas, chorando por não possuírem qualquer brinquedo. Naturalmente, a reacção dos educadores será perguntar: "Então tu não sabes partilhar? Não podes ter tudo para ti!" Então, a criança invejosa replica: "Eu não tenho que partilhar, pois fui mais capaz e inteligente, por isso, os brinquedos são todos para mim!" Isto faz lembrar não só a América, mas também Portugal. De acordo com Nicholas D. Kristof, colaborador do New York Times, os seis herdeiros de Sam Walton, fundador da Wallmart, possuem tanta riqueza como 100 milhões de americanos. Em 2010, 93% do rendimento nacional dos EUA ia para 1% da população e o clássico Coeficiente de Gini (que mede a desigualdade) atingiu recordes no mês de Setembro. É o maior desde a grande depressão de 1930.
Joseph Stiglitz, laureado prémio Nobel da Economia, e ex-conselheiro do Presidente Bill Clinton, no seu último livro, The Price of Ineguality, avisa: "Esta desigualdade resultará num sistema ainda mais injusto, mais instável, menos eficiente, com menos emprego e seguramente com mais desigualdade." Não existe nada de mal em ser rico. O problema coloca-se não só quando a riqueza fica apenas concentrada na mão de alguns, condenando a maioria à indigência e ao ciclo da pobreza, mas também quando, na maior parte dos casos, essa riqueza é proveniente de sistemas políticos plutocráticos. Neste sentido, o Estado deverá ter um papel determinante, quer na equalização e redistribuição dessa riqueza, de modo a proporcionar igualdade de oportunidades para todos, não asfixiando os mais talentosos e as verdadeiras elites, quer proporcionando um sistema judicial justo que sancione aqueles que não respeitem o contrato social.
Porém, lamentavelmente os candidatos à Presidência dos EUA nem sequer afloraram este dramático flagelo social, nomeadamente, Romney, cuja riqueza é proveniente fundamentalmente da especulação financeira e das isenções fiscais, proporcionada aos multibilionários por George W. Bush em conúbio com os lobbyists de Wall Street. Vale a pena lembrar que existem seis lobbyists de Wall Street por cada congressista. Esta isenção resultou no aumento do défice americano em cerca de 8 biliões de dólares. Apesar de o debate entre os dois candidatos presidenciais, realizado na Universidade de Denver, ter sido pouco esclarecedor, ele foi, no entanto, muito revelador sobre as diferenças ideológicas que separam estes dois homens. Sobretudo, por parte de Romney, na restauração das políticas falhadas de Bush: continuidade na escandalosa isenção de impostos para os bilionários (que expirará no fim do ano, caso este não ganhe as eleições) e na preservação das generosas taxas sobre as mais-valias sobre o capital, que não só o beneficiou, como também beneficiou todos os especuladores de Wall Street.
Demagogicamente, Romney afirma que nenhuma destas medidas custará um cêntimo ao Tesouro, dado que simultaneamente reduzirá as deduções e as falhas do sistema fiscal. Porém, de acordo com vários prestigiados economistas, estas medidas resultarão no aumento do défice em cerca de 5 biliões de dólares. Por outro lado, revela que acabará com o programa Obamacare, o que deixará milhões de pessoas sem qualquer assistência na saúde, alegando, falsamente, que tem em alternativa outro plano. O governador afirmou também que irá reinstaurar a liderança militar americana, tendo já advertido o Irão. Esquece-se, porventura, que foram acções desta natureza que resultaram na descredibilização internacional americana. No que se refere à reforma Dodd-Frank, que visa regulamentar o mercado financeiro, lamentavelmente, o governador do Massachusetts afirma que erradicará esta reforma, permitindo, assim, que os desvarios que estiveram na origem da crise financeira de 2008 venham mais uma vez provocar nova crise.
Embora Obama tivesse argumentos e factos para refutar o universo ficcional alternativo de Romney, inexplicavelmente, este falhou, gaguejou e titubeou em todas as dimensões. Deste modo, permitiu que o governador apareça agora bem posicionado para ganhar as presidenciais. Existem, contudo, ainda mais dois debates. Obama tem os factos do seu lado, por conseguinte deverá ser mais assertivo e agressivo e desmontar o mundo de fantasia de Romney. De outro modo, Romney será o próximo Presidente.
(*) Domingos Ferreira
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