O triste episódio que rodeou a (não) venda da TAP veio demonstrar, mais uma vez, que o Governo PSD/CDS é profundamente ignorante e destituído de qualquer ideia de responsabilidade e de sentido de Estado.
Depois de Passos Coelho ter garantido, a pés juntos, que a venda da TAP seria decidida na reunião do Conselho de Ministros do dia 20 de Dezembro, afinal, veio a saber-se que o Governo ainda não estava na posse de todos os dados que permitissem tão perentória afirmação, nomeadamente, no que diz respeito à garantia bancária que o obscuro transnacional Afromovich – estranhamente único candidato à compra de transportadora nacional – deveria ter apresentado em tempo útil.
De qualquer maneira, convenhamos que a incompetência demonstrada pelo Governo, que levou à suspensão da venda da TAP, abre uma janela de esperança no sentido de chegar à conclusão que se trata de um colossal erro estratégico para o país.
O texto seguinte que transcrevemos do Diário de Coimbra do passado domingo, 23/12/2012, aborda a questão TAP de forma muito crítica e faz parte de um artigo de opinião.
TAP isso, que cheira mal (*)
O Governo de Passos Coelho – castigo desproporcionado com que a divina justiça decidiu sancionar os nossos pecados – não acerta uma. Falhou a venda da TAP, com a graça do Senhor, demonstrando à saciedade a sua profunda ignorância e incompetência. Mas nos bastidores deste assunto deve haver coisas muito piores qua ainda não conhecemos.
Na quarta-feira [19 Dez.] na Turquia, no meio de um show off para a imprensa internacional, o ingénuo e atrevido Primeiro-Ministro garantiu que a venda da TAP seria decidida no Conselho de Ministros do dia seguinte. Poderia ter sido mais prudente, dizendo que o assunto seria analisado, nesse plenário governamental. Mas não. Falo sem dúvidas. O país ficou convencido que nada mais havia a fazer e que a transportadora nacional iria parar a mãos sujas e estrangeiras, só para proporcionar alguma cosmética nas contas públicas.
No mesmo dia, Miguel Relvas interrompeu uma longa greve de silêncio provocada pela sua licenciatura-relâmpago e enfrentou os jornalistas. Dizia ele que o assunto estava fechado e verberava os críticos, gente que, na sua avalisada opinião, não tolera ver o Governo a resolver os grandes problemas nacionais.
No dia seguinte, o governo juntou-se em conciliábulo, para concluir que o transnacional Germán Afromovich não tinha banco que o atestasse. E sem aval financeiro, o negócio não se podia fazer.
Mas antes desta decisão, o hiperactivo Miguel Relvas ainda se desdobrou em múltiplos telefonemas, numa vã tentativa de obviar a questão. Falou até com o multi-pátrias, Afromovich. E como este Governo não é destituído de valores éticos, antes de informar os portugueses, teve o cuidado de comunicar ao mal-aventurado colombiano que, afinal, sem dinheiro, não podia haver circo. O macaco estava definitivamente constipado.
Algumas questões preocupantes. Passos Coelho tina dado o assunto por resolvido. Donde, é lícito perguntar, como pode este Governo considerar encerrado um negócio, sem se certificar de uma coisa tão elementar, como seja, a capacidade de o comprador pagar o bem que se propunha adquirir? Como pode um Primeiro-Ministro empenhar a sua palavra, num negócio destas proporções, sem garantias financeiras? Ou é irresponsável, ou foi engando. O que lhe resta, agora, é dizer quem o enganou e retirar daí todas as consequências, ou resolver a sua irresponsável afirmação, com a óbvia demissão.
Provavelmente, não o fará, porque a vergonha também não é muita, por aquelas paragens. Mas espera-se então que seja o Presidente da República, mesmo antes de trincar pantagruelicamente o seu bolo-rei, a chamar Passos Coelho para lhe pedir explicações. Presume-se que o executivo seja composto por homens e não por irresponsáveis garotos.
Como a desdita é tão grande, temos de admitir que nenhum deles tomará a decisão que a circunstância exige. E sendo assim, compete então aos partidos da oposição o esforço de esclarecerem a opinião pública. Primeiro, em comissão parlamentar, ouvindo os ministros envolvidos. Segundo, aproveitando o próximo debate quinzenal, para espremer o incauto Primeiro-Ministro.
Para justificar a venda da TAP ao preço da uva diurética, Miguel Relvas montou uma gigantesca campanha de propaganda negra. A empresa é deficitária, os seus trabalhadores gozam de privilégios sem precedentes entre os portugueses, a frota está a ficar obsoleta e tudo isto custa muito dinheiro, de que o único accionista não pode dispor. Tanto esforço, para nada.
Vão agora tentar arranjar novo comprador que, se aparecer, vai obviamente oferecer um preço muito menor.
Na privatização da RTP, tudo se passará de forma semelhante, tanto mais que os putativos compradores já falharam outros negócios, por falta de aval bancário.
E assim vamos definhando, às mãos de um Governo incompetente e de um Presidente que não tem a menor ideia do que deve fazer, perante tão grave crise. O défice derrapou, para além dos seis por cento, a dívida ultrapassou o valor histórico dos 120,5 por cento, apesar de os portugueses continuarem a ser esmifrados, até ao tutano.
(*) Sérgio Ferreira Borges
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