O negócio que parece estar a preparar-se com a empresa pública Rádio e Televisão de Portugal (RTP), dentro daquilo que já se conhece, vai ser altamente ruinoso para o Estado, para os portugueses e para a democracia. Para o Estado porque vai arrecadar um montante irrisório de dinheiro, depois de todas as contas feitas; para os portugueses que irão continuar a pagar a taxa de audiovisual e a “custear a sustentabilidade de um grupo privado” através dos seus impostos; para a democracia se o poderoso meio de comunicação social que constitui a RTP for controlado por quem nutre pouco respeito pelos valores democráticos, de que a liberdade de informação, já tão mal tratada agora, é um dos pilares. Afinal, tudo isto, talvez tenha pouca importância para Miguel Relvas se o negócio for beneficiar amigos seus.
A preocupação com o futuro da RTP é um dos temas que Daniel Oliveira aborda este sábado na coluna que assina no Expresso.
CONCESSÃO BARATA
Ao que parece, há três possibilidades em cima da mesa para a RTP. A primeira é a concessão. Parece evidente que já caiu. A segunda é a privatização de 49% da empresa. E a terceira ainda não se conhece. Como a primeira já caiu, alguém se encarregou, ainda antes de haver uma decisão tomada, de passar para a comunicação o que mais lhe interessava. Quando li a notícia cheirou-me a esturro: para que raio alguém quer ficar com metade da RTP sem ficar com o seu controlo?
Interessa, antes de mais, fazer as contas. Sabendo-se que a concessão corresponde à entrada de €50 milhões nos cofres públicos, metade corresponderá a €25 milhões. Sabendo-se que uma restruturação da empresa custará €34 milhões, será €17 milhões cada um. Ou seja, para o Estado, com este negócio, sobram €8 milhões. Mas, ainda assim, o Estado fica com o controlo da RTP e com metade dos lucos que ela vier a gerar. Certo? Nem por isso. Ao que parece, o que está em cima da mesa é um acordo parassocial em que se delega nessa entidade privada a gestão total da empresa.
Vamos imaginar que, como diz a imprensa, o privado candidato a este negócio é a Cofina associada ao grupo angolano Newshold. O que faz um grupo de comunicação social quando tem a gestão de um meio da dimensão da RTP? Aproveita as “sinergias” para reduzir custos nas restantes empresas. Se pode tero jornalista desportivo da Antena I ou da RTP a fazer resumos dos jogos para o “Record”, se pode fazer parcerias entre o “Correio da Manhã” e o canal para diminuir as despesas do jornal, se pode aproveitar um jornalista da RTP como correspondente para os restantes meios, se pode promover os seus produtos de media, sem custos, num canal de sinal aberto, não hesitará em fazê-lo. É o que muitos grupos de comunicação social já fazem. A começar pela Cofina.
Na verdade, a enorme estrutura da RTP servirá para reduzir a despesa do grupo que ficar coma gestão da empresa. Se a Cofina ficar com a gestão e se puder, através da distribuição de meios, canalizar custos para a empresa que divide com o Estado, é improvável que a RTP alguma vez venha a ter lucro. Como nós continuaremos a pagar a taxa de audiovisual, serão os contribuintes a custear a sustentabilidade de um grupo privado. Na realidade, é o meso que a concessão. Mas a preço de saldo. O privado fica, com custos mínimos, com a direção editorial dos canais públicos (o que, com a empresa angolana candidata não nos pode deixar descansados) e ainda garante, à custa do Estado e dos contribuintes, a sustentabilidade do seu grupo empresarial. Mais um excelente negócio do empreendedor Miguel Relvas.
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