domingo, 16 de dezembro de 2012

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E IDEOLOGIA




Já aqui referimos que, defender a compatibilidade de medidas de austeridade com desenvolvimento económico e criação de emprego não faz qualquer sentido porque a primeira exclui as outras duas. Podemos ouvir frequentemente os porta-vozes da ideologia neoliberal referir a tomada de decisões no actual quadro de austeridade recessiva que levem à criação de postos de trabalho mas a realidade é bem outra e está muito longe da mera propaganda.

A mesma incompatibilidade se verifica quando se defendem situações de produção competitiva ao nível terceiro-mundista por um lado, e preocupações ecológicas do mundo desenvolvido por outro. É sabido que a ideologia dominante foge das medidas de desenvolvimento sustentável, como o diabo da cruz e só as adopta mediante grandes pressões, em especial, da opinião pública. A sustentabilidade ambiental e social estão interligadas e contêm uma forte componente ideológica, sendo um grave erro pensar que formam sectores distintos a ter em conta. “Está tudo ligado” como afirma Daniel Oliveira no seguinte texto que transcrevemos do Expresso de ontem (15/12/2012).


ESTÁ TUDO LIGADO

O ministro Santos Pereira defendeu que a legislação ambiental “fundamentalista” da Europa é um dos maiores entraves à sua industrialização. Para evitar as deslocalizações, “a Europa tem de deixar de ser naïve e mais papista do que o Papa”. Poderia dizer-se que a posição de Santos Pereira é coerente com a matriz ideológica deste Governo. Defender a sustentabilidade ambiental é acreditar que os recursos são finitos e que o mercado à solta não chega para regular a sua exploração. Mas não acho que, neste caso, haja tanta elaboração na cabeça de Álvaro.
A austeridade aposta num crescimento económico baseado num processo de subdesenvolvimento: salários baixos, desqualificação, desregulação laboral, Estado mínimo. Se olharmos para as economias mais sustentáveis da Europa percebemos que são as que mais respeitam o ambiente. Não apenas porque cuidam dos seus recursos, mas porque esse cuidado é coerente com tudo o resto: são, em simultâneo, as socialmente mais sustentáveis. O que a Europa pede a Portugal, para ser competitivo, é uma quadratura do círculo: que tenha os salários chineses e a qualidade alemã, a segurança social mexicana e a flexibilidade laboral holandesa, o Estado social marroquino e a qualificação finlandesa, a competitividade asiática e as leis ambientais europeias. Não é possível. Se a competitividade portuguesa, integrada num mercado europeu completamente aberto, se basear na redução drástica de custos, isso terá um preço. Não se pode pedir as condições de produção competitivas do terceiro mundo e, em simultâneo, preocupações ecológicas do primeiro mundo. Ao querer desistir da proteção do ambiente, Santos Pereira está a ser coerente com tudo o que o Governo anda a fazer.
 
Uma Europa a duas velocidades, que desistiu da coesão social, política e fiscal, não pode defender que todos cumpram as mesmas regras. E como a natureza não conhece fronteiras, pagará cara a sua cegueira. Bem vistas as coisas, não é apenas o centro do poder europeu que ignora que a sustentabilidade ambiental depende da sustentabilidade social das nações. Está bem acompanhada por muitos movimentos ambientalistas que continuam a pensar que a sua luta é sectorial e não ideológica. Como se isso não estivesse tudo ligado.

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