Por que será que por estas bandas se fala tão pouco da experiência islandesa?
Este país do tamanho de Portugal mas com 320 mil habitantes não se rege pela austeridade. Depois do colapso de 2008 voltou-se para o sector das indústrias criativas (com predominância da cultura) que se tornou o segundo maior, logo a seguir ao das pescas.
A Islândia apresenta actualmente uma taxa de desemprego de 5,7% e um crescimento de 3%...
A propósito, achámos interessante compartilhar com os frequentadores deste blog um interessante texto publicado na última edição da Revista2 (Público) que poderá servir, pelo menos em parte, para resposta à questão que formulámos acima.
Loucos islandeses (*)
Depois do colapso financeiro de 2008, não pagaram as dívidas dos bancos e criaram uma nova Constituição, redigida por 25 cidadãos, criando as bases de uma democracia directa. Ao contrário de Portugal, Grécia, Espanha e Itália, confiaram na soberania popular. Mas o pior estava para vir: apostaram nas indústrias criativas e culturais como principal força de crescimento, enquanto os países do Sul da Europa fizeram o que costumam fazer em situações de crise, com o sector cultural sacrificado com cortes profundos, sendo visto como problema e não como integrando a solução.
Resultado: os países do Sul esperneiam com a corda da austeridade na garganta, enquanto os loucos islandeses recuperam. Segundo o El País (3 de Março), o impacto económico das actividades culturais (mil milhões de euros) é apenas superado pelo sector das pescas, depois de uma mudança de política: em vez de estar refém de algumas indústrias, a Islândia apostou na diversificação.
O resto foi com a jovem ministra da Cultura, Katrín Jakobsdóttir, que desde que está no Governo conseguiu converter os artistas em protagonistas da retoma, cortando nas despesas fixas, aumentando nas contribuições a projectos culturais independentes, numa mescla ágil de tecido público e privado, sem que o Estado renuncie à gestão da cultura e educação. A sociedade civil também contribuiu, num exemplo de democracia participativa, e as iniciativas aconteceram. Algumas loucas: a Academia das Artes juntou engenheiros, cientistas alimentares, designers e agricultores para criarem novos produtos para circularem no mercado global e foi um sucesso. Por sua vez, o organismo de exportação da música mostrou que existe mais para lá de Björk ou Sigur Rós e no ano passado 43 bandas tocaram no exterior.
Ao mesmo tempo, a indústria do cinema está em ebulição, em parte graças à política governamental de reembolsar 20% dos custos de produção de filmes ou série de TV filmadas no país (Ridley Scott ou Darren Aronofsky filmaram ali há pouco), enquanto a indústria dos jogos de vídeo cresceu exponencialmente, o número de teatros aumentou e o mercado literário cresce. Tudo isto teve repercussões noutros sectores, com destaque para o turismo. E tudo indica que o crescimento destas indústrias não vai abrandar, porque o investimento é cada vez maior. De onde vem o dinheiro? Das pescas. É verdade que são apenas 320 mil habitantes, é um país pequeno, existem outros elementos para compreender a recuperação, como o aumento selectivo dos impostos, e o país continua a enfrentar desafios (a moeda desvalorizou e a dívida externa "oficial" continua por pagar). Mas será que não há nada, mesmo nada, a retirar desta experiência de um país que aposta em sectores negligenciados e recupera dos problemas económicos, optando pela criatividade em vez da especulação? E os loucos são eles?
(*) Vitor Belanciano
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