quinta-feira, 14 de março de 2013

DIREITOS DOS IDOSOS



Na actual conjuntura os reformados constituem o elo mais fraco e, por isso, são um alvo fácil para gente sem quaisquer princípios éticos ou morais. Alguns, bem alcandorados no poder, não se eximem de insultar aqueles que trabalharam toda a vida e, durante esse tempo, respeitando escrupulosamente um contrato, descontaram uma parte do seu salário para poderem usufruir durante os últimos anos da sua vida de algum conforto financeiro e de cobertura das despesas com os achaques trazidos pelo aumento da esperança de vida.

Se quisermos aprofundar as razões deste ataque aos direitos dos mais idosos, facilmente encontraremos as suas raízes na ideologia neoliberal dominante, para a qual quem deixou de produzir deve ser desprezado por passar a constituir um peso para a sociedade.

Apresentamos a seguir o essencial de um artigo de opinião em que um professor aposentado se insurgia hoje no Público contra mais um ataque (encapotado) por parte de um deputado da maioria de direita aos valores das reformas actuais e futuras.



Os filhos da “praga cinzenta” (*)

Sem generalizar a toda uma juventude (seria injustiça de bradar aos céus!), não posso deixar de me associar a um veemente protesto público que a minha condição de octogenário, reformado aos 70 anos de idade e 42 de serviço, consente, e justifica. Mais do que isso, impõe.

Refiro-me ao repúdio generalizado em diversos blogues da expressão utilizada recentemente por um deputado do PSD, Carlos Peixoto, em ardor de juventude (36 risonhas primaveras) e arroubo tribunício, para a carga pesada que diz representar para a geração de jovens de hoje as reformas e aposentadorias actuais e futuras, havida como "praga cinzenta".

Ou seja, em antítese com o conselheiro de Estado Bagão Félix quando escreve: "O Estado social discute-se porque é a parte do Estado que tem mais a ver com as pessoas velhas, reformadas, desempregadas, estão doentes, estão sós, têm incapacidades, pessoas que não têm voz, não têm lobbies, não abrem telejornais, não têm escritórios de advogados, não têm banqueiros"(Jornal de Negócios, 30/11/2012).

Acresce que as deduções para efeitos de IRS, plasmadas na Proposta de Orçamento de Estado/2013, expressam a situação de um país em evidente descalabro económico e social onde boa parte da factura está a recair sobre os reformados, achacados pela velhice e pela doença, a ela associada. Assumindo o ónus da prova, detenho-me nas deduções com despesas de saúde em vigor até 2011, último ano em que os portugueses podiam deduzir sem limite 30% das despesas com a saúde no respectivo IRS. Porém, com o actual Orçamento de Estado, os doentes, em alguns escalões de uma moribunda classe média, apenas poderão deduzir 10% destas despesas, até um valor de 838,44 euros. Ou seja, em Portugal, a condição de velho e doente crónico, com "pesares que os ralam na aridez e na secura da sua desconsolada velhice" (Almeida Garrett), em vez de ser havida como uma desgraça, passa a ser taxada como um luxo.

(…)

Em Portugal, os velhos reformados da chamada classe média viram as suas reformas serem substancialmente reduzidas este ano. A exemplo de uma personagem de Arnaldo Gama, é natural que se interroguem: "Para isto é que eu vivi!? Malditos anos! Maldita velhice!". Ou seja, idosos que sofrem de carências económicas e/ou de achaques próprios da sua idade, sendo, não poucas vezes, obrigados a desistir da compra de medicamentos com risco da própria sobrevivência.

Não se desse o caso de não ter tido conhecimento de qualquer contraditório por parte da bancada do partido político do deputado Carlos Peixoto, não mereceria esta sua boutade que com ela gastasse uma simples linha do latim por mim aprendido nos bancos do liceu. Mas trata-se de uma questão de concórdia social. Segundo o professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo, Renato Janine Ribeiro, "o interesse nacional não exige a mesma paz que o interesse individual". Portanto, em nome deste salutar princípio, não é de excluir a opinião sobre esta temática daqueles que, mandatados pelo povo que os elegeu, são responsáveis pelo destino de Portugal e da sua gente?

(*) Rui Batista

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