Muitos
dos governantes que (supostamente) se manifestaram em Paris apenas o fizeram
para ficar na fotografia dos defensores da liberdade embora, na prática, sejam
grandes adversários, senão mesmo inimigos da democracia. No mundo actual há
muito mais governantes do que se pode imaginar que têm um medo atroz do voto
popular. O sistema dominante tem um cariz totalitário e, por isso, não tolera
opiniões nem acções contrárias à doutrina neoliberal. Enquanto os eleitores vão
fazendo vista grossa às malfeitorias que continuam a sofrer, e mantêm no poder
os partidos do arco do sistema, tudo bem. O pior é quando surge no horizonte a
possibilidade de ser dada uma oportunidade a uma alternativa com ideias novas
que colocam em causa muitos interesses instalados. Aqui, surgem as brutais
pressões para que a democracia não se cumpra e tudo permaneça inalterado. É exactamente
o que está agora a acontecer relativamente à Grécia e à possibilidade de uma
vitória do Syriza nas eleições do próximo dia 25 de Janeiro.
É
a hora de todos aqueles que não têm medo da democracia afirmarem a sua
solidariedade e respeito pelo povo grego num momento que pode ser de viragem
democrática para toda a Europa. O texto seguinte (*) que transcrevemos do
Público de ontem dá uma ajuda ao desenvolvimento deste nosso raciocínio.
A Europa volta a ser assolada
pela crise grega. Schäuble reafirma a necessidade de disciplina para continuar
o rigor. Tsipras pode ganhar as eleições. De imediato, as Cassandras, Berlim
prepara uma eventual saída da Grécia do euro. O perigo não vem de Atenas. A
propagação vem dos bancos. Há seis anos, Conselho e Comissão Europeia trataram
a dívida soberana como temporária falta de liquidez, negando a insolvência do
estado e dos bancos. No verão de 2010 foram injectados 109 mil milhões de
euros, passado um ano mais 110 mil milhões, dos quais 37 mil milhões de
credores privados com a contrapartida da redução em 50% dos títulos detidos. A
dívida foi convertida em obrigações de longo prazo, os juros baixaram, os
governos da zona euro garantiram e as perdas nos créditos concedidos em excesso
(default) reconhecidas. Reestruturada a dívida, a
economia não arrancou. O PIB reduziu-se em 30%, desde 2009; o desemprego atinge
26% (50% entre os jovens); fecharam mais de 200 mil PME; a dívida pública
representa 177% do PIB (320 mil milhões de euros) era de 125% no início da
crise. A estratégia oficial recapitalizou os bancos e transferiu a sua
exposição ao risco para as finanças públicas e para os contribuintes. As
convulsões sucedem-se e a miséria alastra. Hoje, a Grécia vive a revolta dos
devedores, como lhe chamou De Grauwe. Uma revolta contra o diktat
do lobby bancário que tolhe a iniciativa das autoridades
europeias e nacionais para negociar com os credores privados do Norte. Tsipras
quer acabar com a austeridade e negociar com Bruxelas uma solução equilibrada
para resgatar a Grécia. E a Europa tem que decidir entre o make-or-break,
o êxito ou fracasso do Projecto Europeu. Os gregos merecem respeito e
solidariedade.
(*) João
Ferreira da Cruz, economista
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