quinta-feira, 17 de outubro de 2013

AINDA O CASO MACHETE


Por muito interessante que um qualquer acontecimento político seja para a comunicação social, se surgir outro que traga mais audiência, este último é o que passa a dominar em termos de informação. O mais recente exemplo do que acabámos de afirmar passa-se com o Orçamento do Estado para 2014 relativamente ao caso Machete. Sem que nada de especial tenha acontecido que possa contribuir para o término deste caso, a verdade é que já parece esquecido. Mas não devia estar, face à gravidade da actuação do ministro dos Negócios Estrangeiros. Neste sentido aqui fica a nossa modesta contribuição ao deixarmos a transcrição de um artigo de opinião (“Rui Mau Chete” *) inserido no Diário de Coimbra do passado domingo (13/10/2013). 

Rui Machete entrou da pior forma no Governo e, por isso, só lhe resta encontrar uma boa saída. Primeiro, foi o seu envolvimento no caso BPN, depois uma imensa trapalhada com Angola, apesar de tudo, um caso sem a gravidade do anterior.
Percebo que ele tenha subestimado as consequências do caso BPN, quando decidiu entrar neste Governo. Não lhe consigo escrutinar os pensamentos, mas não me surpreende que a sua reflexão tenha passado por isto: o Presidente da República também se envolveu com o BPN e ninguém, até hoje, pediu a sua demissão. A partir desta dedução, considerou-se suficientemente descontaminado, para integrar o Governo.
Enganou-se. Cavaco Silva goza ainda de um estatuto especial e, exceptuando algumas picadas que vão surgindo espaçadamente na imprensa, ninguém o incomodou muito, com uma compra e revenda de acções, com mais-valias fabulosas. É o Presidente da República e ninguém quer decepar o regime. Com um ministro dos Negócios Estrangeiros tudo é diferente.
Se Rui Machete tivesse dito toda a verdade de uma única vez, o assunto provocaria alguma polémica, mas podia silenciar-se, num prazo relativamente razoável. Mas ele tem feito exactamente o contrário. Contou os factos por episódios, desmentindo-se a si próprio, com recurso a sofismas diversos, para tentar explicar que a diferença entre a mentira e a verdade é coisa escassa e pouco relevante. Por muito esforço que faça, Rui Machete não consegue convencer ninguém que a galinha é um mamífero, com o corpo coberto de penas e que respira por guelras. Com as inverdades e meias verdades, tem estado a despejar gasolina, em cima da fogueira.
Não devia sujeitar-se a isto. E só tem uma única forma de corrigir o erro de ter entrado para o Governo – é sair. Quanto mais prolongar a sua presença à frente do Ministério dos Negócios Estrangeiros, mais argumentos dará à oposição para o atacar, provocando com isso um desgaste ao executivo, semelhante ao que se passou com Miguel Relvas. Já devia ter pedido ao Primeiro-Ministro que lhe arranjasse um substituto. Se ainda não o fez, mostra com isso a sua incapacidade política para se manter à frente de uma das pastas mais importantes do executivo.
Podemos somar a tudo isto a inépcia revelada, à frente do Palácio das Necessidades. Até hoje, ninguém lhe ouviu uma declaração ou viu qualquer acção, facilmente relacionável com os grandes pilares da política externa portuguesa. Fala mais do BPN do que da sua vida de ministro. Europa, CPLP, Ibero-América, Atlantismo e Estados Unidos e Pacífico são extravagâncias que Rui Machete só conhece vagamente de ouvido.
Falou agora de Angola com os resultados que se viram. Em Portugal, afundou-se e, em Angola, perdeu credibilidade. No segundo governo de José Sócrates, na sequência de um incidente do género, Luanda chegou a queixar-se, dizendo que não tinha interlocutor em Lisboa, referindo-se à inabilidade do então secretário de Estado, José Gomes Cravinho. Depois do que se passou esta semana [passada], Luanda já percebeu que falar com Machete não produz qualquer efeito.
Quando Pedro Passos Coelho o convidou para o Governo apostou no seu antigo prestígio, na respeitabilidade que supostamente gozava, sobretudo, no interior do PSD. E com isso, podia baixar o tom, ou mesmo calar algumas críticas internas. Mas enganou-se e, agora, sente-se refém do seu erro e incapaz de o emendar. Mas quanto mais tempo demorar pior. Por isso, a bola está do lado de Machete e devia ser ele próprio a ajudar o Primeiro-Ministro, pedindo a sua substituição.
Com este caso, vai-se provando o fracasso da remodelação governamental. Poiares Maduro foi recrutado para assumir a difícil tarefa de comunicar e explicar aos portugueses as decisões governamentais. Cedo desistiu da tarefa e esforça-se agora para arranjar outro ofício que justifique a sua presença no Governo. Maria Luís Albuquerque ficou, desde cedo, amarrada aos escândalos dos swaps que ainda não terminou e Paulo Portas, mostrando a pouca confiança que tem nela, assumiu-se como seu babysitter, vigiando-lhe todos os passos e declarações. Rui Machete é o que se está a ver.
(*) Sérgio Ferreira Borges

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