domingo, 27 de outubro de 2013

PERDEDORES E GANHADORES



Recordando o início da chamada “crise da dívida soberana”, começou-se a falar da possibilidade de Portugal abandonar o euro e, nessa altura, um dos óbices que se apontavam teria a ver com uma brutal perda de salários e pensões caso regressássemos ao escudo. Não deixa de ser irónico que, cerca de quatro anos depois destas ideias serem expostas, se assista a uma violentíssima quebra de rendimentos, tanto dos trabalhadores do sector público como dos do privado. O mesmo se passa relativamente aos pensionistas do regime geral e da CGA. Mas a cruel austeridade, posta em prática pelo Governo Passos/Portas, que atingiu a esmagadora maioria dos portugueses também gerou alguns ganhadores como refere Pedro Adão e Silva no excelente texto que assina no Expresso de ontem (26/10).
Não é preciso procurar muito para encontrarmos descrições feitas há uns quatro anos sobre as implicações de Portugal abandonar o euro. No início da crise das dívidas soberanas, era-nos dito que um regresso ao escudo teria custos brutais e corresponderia a perdas nos salários e nas pensões na ordem dos 30%. Lidos retrospectivamente, estes cenários chegam a ser comoventes.
Não me parece política, social e economicamente viável uma saída do euro. Alias, o drama que enfrentamos é precisamente esse: o euro é uma armadilha da qual não há libertação possível. Uma vez entrado, não mais se sai. Convenhamos que estamos perante um dilema insuperável: Portugal não pode ficar no euro, mas também não pode sair do euro. Se a permanência na união monetária, com as actuais regras, torna a nossa dívida, de facto, insustentável, uma saída será tudo menos ordenada e trará consigo um cenário de caos, que ninguém é capaz de antecipar.
Não deixa, no entanto, de ser sintomático que, no já distante ano de 2009, quando os contornos do que estaria para vir eram ainda indefinidos, nos fosse dito que não podíamos abandonar a moeda única porque tal implicaria perdas salariais politicamente inviáveis. Estávamos na altura em que, como disse Cavaco Silva, havia “limites para os sacrifícios que se podem pedir ao comum dos cidadãos”. O que se passou entretanto?
Portugal empobreceu muito mas nem todos empobreceram. Desde 2010, altura em que a Europa de facto mudou, até 2014, a redução do rendimento médio real na função pública será de 25%; no sector privado cerca de 20% e para os pensionistas entre 25 e 35%, consoante falemos do regime geral ou da CGA. Já agora, convém recordar, os salários foram cortados, entre outros motivos, para garantir que o emprego fosse sustentável. Ora, de uma taxa de desemprego de 10,8% em 2010 passámos para uma que se estima seja, em 2013, de 17,4%. Ao que acresce que não só o número de desempregados aumentou brutalmente, como a percentagem de desempregados protegidos tem diminuído muito e continuará a diminuir. Em Agosto, de um total de 877 mil desempregados, só 380 mil recebiam subsídio.
A conclusão é clara. Há ganhadores e perdedores neste “ajustamento” e a “equidade na austeridade”, tantas vezes invocada, não passa de um álibi demasiadamente tosco. A crise do euro tem sido de facto instrumental para redistribuir poder em Portugal, favorecendo uns e enfraquecendo a posição relativa de outros.
Da “reforma do Estado” feita com notável incompetência às reforma estruturais salvíficas, a consequência tem sido uma: os trabalhadores assalariados da classe média, os funcionários públicos e os pensionistas já regressaram, silenciosamente, ao escudo, enquanto o sector financeiro, os sectores rentistas e as empresas exportadoras mantêm-se no euro, beneficiando dele, ainda que, em certos casos, com dificuldades de acesso ao financiamento. Naturalmente que, para muitos, a crise só pode ser mesmo encarada como uma oportunidade. Aliás, uma oportunidade aguardada há muito tempo. 

1 comentário:

  1. I saida negociada,
    II saida unilateral programada,
    III saída forçada e trapalhona,
    IV implusão do Euro
    V desmembramento programado do euro
    VI Manutenção do euro com ditaduras policiais

    Quem prefere o que e que implica cada uma das possibilidades? Pois são situações muito diferentes...
    A mais conhecida em Portugal tem sido a oferecida por João Ferreira do Amaral, muito lúcida e optimista de que o europeísmo não é dado a vinganças (quase todos os europeístas portugueses contrapõem como impossível por causa das vinganças).
    Manutenção das dívidas externas e internas em euro, financiadas pelo BdP, agregação da taxa de converção do velho escudo ao mecanismo de taxas flutuantes do BCE e garantida por este com uma margem de 25%, maior do que a para os países de leste. Eu creio que a manutenção das dívidas privadas em euros é um erro.

    Surge depois o Desmantelamento natural do Euro.
    O grupo de economistas franceses encabeçados por Jacques Sapir sugere um desmantelamento da zona euro com todas as moedas a sere reintroduzidas 1 de nova moeda igual a valor desvalorizado calculável baseado na diferença das balanças cambiais face ao valor do euro. Nomeação de toda a dívia soberana em nova moeda, mas manutenção da dívida privada em euros. (não percebe a porquê)

    Marine Le Pen sugere que Franca, Espanha, Itália, Irlanda, Grécia, Bélgica e Portugal saiam do euro no mesmo dia, concertadamente com 1€=1 de moeda nacional (novos franco, peseta, escudo, lira, etc)

    Menos discutidos e menos estruturados em teoria ficam a implosão do Euro, uma saída sobreana do euro (com ou sem reestruturação da dívida) e saída forçada com bancarrota (MAS e BE).

    http://economico.sapo.pt/noticias/saida-do-euro-deve-ser-feita-com-apoio-das-autoridades-comunitarias_134589.html

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