A promiscuidade de interesses entre sector público e
privado é um dado adquirido entre nós. Muita dessa promiscuidade tem a ver com
a rotação que se verifica de membros de grupos económicos que vão ocupar
lugares governativos ou de ex-ministros que transitam para conselhos
administrativos de grupos económicos que foram favorecidos aquando da sua
passagem pelo Governo. Não podemos ser ingénuos ao ponto de imaginarmos que
tudo isto acontece por acaso. É que, além do mais, os exemplos são muitos…
Um texto do economista Eugénio Rosa, que encontrámos
hoje no Diário As Beiras, aborda com muito a propósito uma das faces desta
importante problemática.
Joseph Stiglitz,
prémio Nobel
da economia, no seu livro “O preço da desigualdade”, escreveu o seguinte sobre
as entidades reguladoras: “Hoje em dia, em muitas áreas, as agências reguladoras
são responsáveis pela fiscalização
de um setor.
O problema é que os
líderes (dos grupos económicos) nestes setores usam a sua influência política
para nomear para as agências reguladoras personalidades complacentes com os
seus objetivos. Os economistas referem-se a isto como captura do regulador. Por
vezes a captura é associada a incentivos monetários: os que se encontram na
comissão reguladora são provenientes do setor que é suposto regularem e aí
regressam mais tarde. Os seus incentivos e os da indústria estão bem alinhados,
ainda que estejam desalinhados com o resto da sociedade.
Se os da comissão
reguladora servem bem o setor, são bem recompensados na sua carreira
pós-governamental. Contudo, por vezes a captura não é motivada pelo dinheiro.
Em vez disso, a mentalidade dos reguladores é capturado pelos regulados.
Trata-se da captura cognitiva que é mais um fenómeno sociológico”. E refere
mesmo como exemplo o ex-presidente da Reserva Federal americana Alan Greenspan.
Embora a citação
seja longa ela tem a virtude de chamar a atenção de todos os portugueses para
um fenómeno preocupante que se verifica também no nosso país, pois ele reforça
o poder dos grupos económicos e, consequentemente, o seu domínio sobre a
sociedade e a economia portuguesa e sobre o poder político em Portugal. No
nosso livro “Grupos económicos e desenvolvimento em Portugal no contexto da
globalização” mostramos, com base numa longa lista de mais de 100 nomes, de que
forma o fenómeno conhecido por “porta giratória” se manifesta em Portugal
(membros de grupos económicos que vão para o governo, e ex-membros do governo e
de entidades reguladoras que depois vão para conselhos de administração de
grupos económicos), o que contribui para a captura do próprio governo
No inicio de
Novembro de 2013, face à captura da Autoridade da Concorrência (AdC) pelas
petrolíferas, pois os preços dos combustíveis no nosso país sem incluir
impostos continuam a ser superiores aos preços médios da U.E. sem impostos, o
governo anunciou a criação de mais uma entidade de supervisão para o mercado de
combustíveis: a EGREP, a empresa pública responsável pela gestão das reservas
estratégicas petrolíferas, com funções alargadas. Mas os casos de captura das
entidades reguladoras pelos grupos económicos que deviam supostamente controlar
não se resumem a este.
A prová-lo está a
proposta recente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) de
aumentar o preço da eletricidade em 2014, depois aprovada pelo governo PSD/CDS.
Segundo o comunicado da ERSE de 15-10-2013, o preço da eletricidade a clientes
finais (famílias) aumentará, entre 2013 e 2014, em 2,8%. Interessa chamar a
atenção que, entre 2007-2012, segundo a Direção Geral de Energia, o preço da
eletricidade para as famílias aumentou 19,7% enquanto os preços no consumidor
subiram 9,9%, e que a subida do preço de eletricidade aprovada pela ERSE para
2014 é 2,8 vezes superior à subida de preços prevista pelo governo no OE2014
para o próximo ano – apenas 1% – e certamente muito superior à subida dos
rendimentos da esmagadora maioria dos portugueses no próximo ano.
E
isto apesar dos lucros líquidos da EDP, o grupo económico dominante no setor,
terem sido de 1.124,7 milhões de euros em 2011, de 1.012,5 milhões de euros em
2012, e, só nos primeiros 9 meses de 2013, atingiram 792,3 milhões de euros,
segundo dados no “site” da EDP. Pode-se dizer com propriedade que a crise não
atingiu a EDP nem os seus acionistas que são na sua maioria grupos económicos
estrangeiros.
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