sexta-feira, 29 de novembro de 2013

POUCOS MUITO RICOS vs MUITOS MUITO POBRES



Numa passagem do livro de Almeida Garrett “Viagens na minha terra”, o escritor deixou uma pergunta que se tornou famosa: “Quantos pobres são necessários para fazer um rico?”.
Mais de um século e meio depois da sua morte, Garrett esclareceria esta dúvida, com toda a facilidade, lendo jornais, vendo noticiários televisivos ou, simplesmente, observando a realidade à sua volta.
Veria que, numa altura em que os cortes salariais, as reduções das pensões dos reformados, o crescimento do desemprego real, o aumento exponencial das falências de pequenas e médias empresas (milhares de casos), dos impostos para os mais fracos e da precariedade no trabalho, para além da venda ao desbarato de empresas públicas rentáveis e da destruição do Estado social, veria também notícias de que as 25 maiores fortunas de Portugal foram valorizadas em 16% durante o último ano – actualmente estas fortunas valem 10% do produto nacional, ou seja, mais 1,6% do que um ano atrás.
Esta é a nossa realidade actual em que se assiste a uma cada vez mais clara vulgarização da pobreza a par de uma galopante concentração da riqueza confirmada pelos números que esta semana chegaram ao conhecimento público.
“Quem está a ganhar” (obviamente sem interrogação) é o título de um excelente artigo de opinião que José Manuel Pureza assina esta sexta-feira no DN, onde a problemática atrás referida é abordada com muita clareza.
Os ricos vivem da existência de pobres. Os poucos muito ricos vivem da existência de muitos muito pobres. Em 1654, o Padre António Vieira disse-o de forma frontal e imorredoura: "Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande."
Esta semana, 360 anos depois do sermão de António Vieira aos peixes, o mesmo país que o expulsou por ser uma voz incómoda para os poderes instalados tomou conhecimento de que, em pleno coração da crise que está a condenar vidas em série ao desespero, as 25 maiores fortunas portuguesas foram valorizadas em 16% ao longo do último ano. Elas somam atualmente 16,7 mil milhões de euros, 3,3 mil milhões mais que o ano passado. 25 fortunas valem hoje 10% do produto nacional, 1,6% mais que há um ano. Estes números ensinam-nos três coisas sobre este momento da vida do país.
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