Numa passagem do livro de Almeida Garrett
“Viagens na minha terra”, o escritor deixou uma pergunta que se tornou famosa: “Quantos pobres são necessários para fazer
um rico?”.
Mais de um século e meio depois da sua
morte, Garrett esclareceria esta dúvida, com toda a facilidade, lendo jornais,
vendo noticiários televisivos ou, simplesmente, observando a realidade à sua
volta.
Veria que, numa altura em que os cortes
salariais, as reduções das pensões dos reformados, o crescimento do desemprego
real, o aumento exponencial das falências de pequenas e médias empresas (milhares
de casos), dos impostos para os mais fracos e da precariedade no trabalho, para
além da venda ao desbarato de empresas públicas rentáveis e da destruição do
Estado social, veria também notícias de que as 25 maiores fortunas de Portugal foram
valorizadas em 16% durante o último ano – actualmente estas fortunas valem 10%
do produto nacional, ou seja, mais 1,6% do que um ano atrás.
Esta é a nossa realidade actual em que se
assiste a uma cada vez mais clara vulgarização da pobreza a par de uma
galopante concentração da riqueza confirmada pelos números que esta semana
chegaram ao conhecimento público.
“Quem
está a ganhar”
(obviamente sem interrogação) é o título de um excelente artigo de opinião que José
Manuel Pureza assina esta sexta-feira no DN, onde a problemática atrás referida
é abordada com muita clareza.
Os ricos vivem da
existência de pobres. Os poucos muito ricos vivem da existência de muitos muito
pobres. Em 1654, o Padre António Vieira disse-o de forma frontal e imorredoura:
"Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos.
Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os grandes,
bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos,
não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande."
Esta semana, 360 anos depois
do sermão de António Vieira aos peixes, o mesmo país que o expulsou por ser uma
voz incómoda para os poderes instalados tomou conhecimento de que, em pleno
coração da crise que está a condenar vidas em série ao desespero, as 25 maiores
fortunas portuguesas foram valorizadas em 16% ao longo do último ano. Elas
somam atualmente 16,7 mil milhões de euros, 3,3 mil milhões mais que o ano
passado. 25 fortunas valem hoje 10% do produto nacional, 1,6% mais que há um
ano. Estes números ensinam-nos três coisas sobre este momento da vida do país.
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