Mais uma vez aqui deixamos uma opinião de
quem nada tem de radical, como todos sabemos – Nicolau Santos – para provar que
não é necessário ser-se de esquerda para se criticar o autêntico fanatismo
ideológico, e não só, que patrocina a onda de privatizações que o Governo
Passos/Portas está a levar a cabo. Não há qualquer lógica ou justificação
possíveis e vale tudo, nomeadamente as mais torpes mentiras. Os exemplos
apontados são por demais conhecidos para se perceber que constituem a mais pura
realidade. Ao lermos esta “reflexão” do jornalista do Expresso Economia, ficamos
com a noção clara do que verdadeiramente se está a passar – uma catástrofe para
o país e para os seus cidadãos em particular.
Uma das imposições do
processo de ajustamento é a alienação por parte do Estado, da venda de empresas
públicas ou das participações que detém. É curioso que no turbilhão da
austeridade que nos caiu em cima, o processo de privatizações em curso praticamente
não seja discutido e seja mesmo aceite, se não com naturalidade, pelo menos com
algum fatalismo.
Ora, talvez seja altura de
abrir também essa discussão e tentar contrariar algumas inverdades que o
discurso oficial propaga. E a primeira dessas inverdades é que tudo o que é
público é mau e será sempre muito melhor gerido pelos privados. A prova está em
que o que o governo tem feito até agora é vender sobretudo empresas públicas
que dão lucro. O caso mais recente é o dos Correios, que deverá registar um
lucro de €60 milhões este ano e presentear os accionistas com uma rentabilidade
superior à dos correios britânicos e próxima da dos correios belgas. Mas a ANA,
a EDP ou a REN não eram propriamente negócios deficitários…
A segunda inverdade é que a gestão
privada é sempre melhor que a pública, a não ser que essa gestão pública seja
exercida por outro Estado que não o português. É o caso da EDP e da REN, cujos
accionistas maioritários (China Three Gorges e State Grid) são empresas
chinesas totalmente públicas, em cujos conselhos administrativos têm lugar os
representantes do Partido Comunista Chinês. Logo, não se trata de
privatizações, mas de nacionalizações por parte de outro país.
A terceira inverdade é que as
privatizações introduzem mais concorrência e, por consequência, levam à descida
dos preços para os clientes. Pois bem, a mudança de dono na REN e na EDP não levou
à descida de preços da electricidade para os consumidores, mas sim – segundo agora
nos é dito – a um crescimento menor do que se não tivesse havido privatização. É
interessante como o discurso político usa uma justificação para uma decisão e
outra depois da decisão estar concretizada e os resultados não serem os que tinham
sido usados como argumento para proceder à privatização. No caso da ANA,
comprada pelos franceses da Vinci, o que se esperava era uma descida das taxas
aeroportuárias. O que aconteceu? A subida dessas taxas com o argumento de que
tal estava previsto no acordo de venda da empresa.
A quarta inverdade tem a ver
com o argumento de que não é importante quem detém o capital da empresa. É a
maior de todas as falácias. Como é evidente, importa e muito. A compra da participação
da CGD na Cimpor pela Camargo Corrêa levou, para já, a que o centro de decisão da
empresa de cimentos passasse de imediato para o exterior. E veremos o impacto
que esta mudança de accionista terá no futuro relativamente à contratação de
engenheiros técnicos portugueses. No caso da PT, por exemplo, o facto do Estado
ter sido obrigado a vender a golden share que detinha na operadora telefónica
levou a que esta, para se colocar ao abrigo de uma OPA hostil, avançasse com
uma fusão com a brasileira Oi. Consequência: a sede da nova empresa será no
Brasil e já é completamente claro que será o mercado brasileiro a concentrar
todas as atenções do seu conselho de administração nps próximos anos, porque é
aí que estará o grande potencial de crescimento. Para já, e durante vários
anos, o mercado português deixou de ser uma prioridade para a PT em termos de
investimento, em termos de inovação e em termos de emprego.
Falta agora
que nos digam que não faz sentido que o Estado detenha um banco público porque
esse é um negócio que os privados fazem muito melhor. Como se tem visto aliás.
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