O artigo de opinião que Moisés Ferreira,
deputado do BE, assina no “Público” de hoje e que apresentamos a seguir é muito
esclarecedor sobre a actual situação que se vive no Serviço Nacional de Saúde
(SNS). Vale a pena lê-lo porque, com uma linguagem simples e em poucas palavras,
dá-nos a perceber o que é o actual SNS, fruto da Lei de Bases da Saúde aprovada
pelo Governo de direita em 1990. A intenção clara de PSD e CDS foi abrir as
portas ao chorudo negócio que constitui a saúde dos portugueses.
Os números não enganam ao revelarem, por
exemplo, que 40% do orçamento do SNS vai para os privados o que significa que
são milhões de euros que “não são investidos no reforço e na
ampliação da capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde”. A partir
daqui há uma série de dados que é preciso ter em conta para inverter a actual situação,
nada benéfica para a população portuguesa. A maioria de esquerda actualmente
existente na Assembleia da República garante que se volte à matriz inicial do SNS
aprovada em 1979 com os votos contra de PSD e CDS. É uma questão de vontade
política.
O Serviço Nacional de Saúde está a ser
sangrado pelos interesses privados. Hoje, quatro em cada dez euros do orçamento
do SNS vai para privados; ou seja, não são investidos no reforço e na ampliação
da capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde.
São quatro mil milhões de euros que todos os anos saem do SNS para
pagar ‘fornecimentos e serviços externos’, com destaque para os quase 1200
milhões de euros para meios complementares de diagnóstico e outros subcontratos
e para os quase 500 milhões de euros que nos custam as PPP da Saúde.
Este é um caminho insustentável. Se não
for invertido, é o próprio direito à saúde que está em causa.
Quando ouvir falar de
tempos de espera muito elevados para consultas, lembre-se que isso resulta da
falta de recursos no SNS. E que esses recursos não existem porque estão a ser
drenados para o privado.
Quando ouvir falar da falta de
profissionais no SNS, lembre-se que muitos mais profissionais poderiam ser
contratados se não se gastasse tanto dinheiro a financiar o setor privado da
saúde.
Mas qual é, afinal, a causa desta
sangria? É a Lei de Bases da Saúde de 1990, aprovada pelo PSD e pelo CDS, que
abriu a saúde ao negócio. Os partidos que em 1979 votaram contra o
SNS fizeram em 1990 uma lei para atacar o SNS.
A Lei de Bases de 1990 estabelece, na
sua Base XXXVI, que “pode ser autorizada a entrega, através de contratos de gestão,
de hospitais ou centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde a outras
entidades”; ou seja, abriu as portas às PPP, as tais que foram entregues ao
Grupo Mello, à Luz Saúde e à Lusíadas Saúde e que nos custam quase 500 milhões
de euros por ano.
A mesma Lei, na sua Base XXXVII,
estabelece que “o Estado apoia o desenvolvimento do setor privado de prestação
de cuidados de saúde” através “da facilitação da mobilidade do pessoal do
Serviço Nacional de Saúde”, de “incentivos à criação de unidades privadas” e
“na reserva de quotas de leitos de internamento”. É um bodo aos privados.
A Lei de Bases de 1990 foi feita para
que o SNS perdesse profissionais, financiamento, investimento e capacidade de
resposta. Foi feita para obrigar o SNS a contratualizar com privados e para
criar um mercado da saúde à custa do orçamento público. Foi esta lei que
permitiu que outros governos, como o de Durão Barroso, aprofundassem o ataque
aos serviços públicos de saúde e aos seus trabalhadores e utentes.
Com uma Lei assim só podíamos ter
chegado a uma situação de emergência. E é por isso que é preciso revogar a lei
do PSD e do CDS, substituindo-a por uma Lei, essa sim, que defenda e promova um
SNS público e de qualidade.
O Bloco de Esquerda
apresentou há muito a sua proposta. Ela partiu do contributo
inestimável de António Arnaut e de João Semedo e permitiu abrir um debate que é
central para o presente e futuro do SNS.
Entretanto, também o Governo, o PCP, o
PSD e o CDS apresentaram propostas. As da direita não trazem nada de novo. São,
literalmente, o business as usual. Reciclando a proposta de Maria de Belém Roseira,
apenas aprofundam os problemas que atualmente fazem definhar o SNS. Fica claro
que quando PSD e CDS falam de Saúde pensam mais em clientelas e acionistas e
menos em utentes e cidadãos.
A proposta do
Governo continua a ser ambígua sobre a relação público-privado e não
introduz nenhuma alteração nas taxas moderadoras. As palavras da ministra
tendem a ser mais claras do que a proposta do Governo, o que só reforça a
necessidade de clarificar as intenções do PS.
O futuro do SNS passa pela
separação clara entre público e privado, pondo fim à sangria de recursos. Isso
far-se-á com a gestão integralmente pública de todas as unidades do SNS;
far-se-á deixando claro que a relação do privado com o público é de
complementaridade e existirá apenas enquanto o SNS não adquirir a resposta em
falta.
O futuro do SNS passa pelo
restabelecimento de carreiras para fixar mais profissionais e pela promoção da
exclusividade. Passa por um sistema que não permita copagamentos mascarados de
‘taxas moderadoras’ que nada moderam, muito menos quando são aplicadas a exames
ou consultas prescritas.
O futuro do SNS far-se-á por aqui. No que depende do Bloco, não faltará
futuro ao SNS.
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