Nunca é demais denunciar a mais pura
hipocrisia que os governos (quer da direita quer do PS) dão mostras quando
juram a pés juntos a sua paixão pela educação. Na realidade, devia ser assim,
para bem dos portugueses e do país, mas é uma conversa que, como a prática
demonstra, desde há muito tresanda a “verborreia e propaganda”. Aquilo que
todos percebemos é que, PS, PSD e CDS, quando se encontram no Governo, têm como
objectivo fundamental para a área da educação gastar o mínimo possível. A partir
daqui, todas as manipulações são admissíveis e os alvos mais fáceis são os
professores, depois de anos a fio de uma campanha bem dirigida contra os
docentes com o propósito de os difamar perante a opinião pública para que esta
aceite como natural situações como a que agora está em curso no que diz
respeito à contagem do tempo de serviço. É a dignidade profissional dos
professores que está em causa e, quando isto acontece, são os alunos os mais
prejudicados no imediato e o país, a longo prazo. É um erro colossal qualquer
Governo se apresentar “como defensor dos interesses dos alunos em detrimento
dos interesses dos professores. Como se fosse possível dissociar uma coisa da
outra” tal como afirma muito bem o prof. Santana Castilho no artigo de opinião
que assina no “Público” de hoje e que reproduzimos a seguir.
A irrelevância que António Costa conferiu à Educação
evidenciou-se desde cedo na pobreza dos seus documentos eleitorais e
confirmou-se com a escolha de um ministro incompetente e sem peso político. O
ano que agora começa fechará uma legislatura de vacuidades, em matéria de
Educação, alindadas pelo contributo de alguns notáveis para as características
que a marcarão: verborreia e propaganda.
Tivemos de tudo: provas nacionais para as crianças do 2.º ano (depois
de abolidas, por precoces, as provas nacionais para crianças... do 4.º ano),
usadas para justificar decisões anunciadas... antes de estarem apurados os
respectivos resultados; um Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar
que, na senda de anteriores do mesmo tipo, ignorou que o insucesso não se
resolve sem anularmos os indicadores de pobreza da sociedade (a Direcção-Geral
de Estatísticas da Educação e Ciência fez uma excelente análise sobre os
resultados dos alunos do 2.º ciclo do ensino básico das escolas públicas,
evidenciando uma correlação clara, regular e intensa, entre as reprovações e a
condição económica dos alunos); um referencial de competências que não foi além
da apropriação de máximas expressas em publicações não citadas e da reposição
de conceitos banais, há muito presentes na rotina dos professores; um
“currículo flexível”, retoma manhosa da “gestão flexível do currículo”, de há
18 anos, para que a rapaziada passe toda e acabem os chumbos; dez milhões de
euros gastos em licenças digitais de manuais, para alunos que não têm
instrumentos para as utilizar.
Enquanto isto, o perfil educativo da sociedade
portuguesa (“Retrato de Portugal”, Pordata) permanece estatisticamente na cauda
da Europa a 28. Com efeito, os 54,6% dos empregadores que não frequentaram o
ensino secundário ou superior, ou os 43,3% dos trabalhadores cuja escolaridade
não foi além do 9.º ano, comparam, respectivamente, com os 16,6% ou os 16,7% da
União Europeia. Mas, apesar disto, o Governo mantém, desde Maria de Lurdes Rodrigues,
um inaceitável conflito com os seus professores.
Enquanto isto, persistem os baixos
salários dos professores, técnicos e assistentes operacionais, incompatíveis
com os níveis de taxação fiscal. Com efeito, enquanto a receita do IRS e IVA
cresceu cerca de 45% desde 2010, o aumento dos rendimentos do trabalho não foi
além de uns parcos 2%.
Enquanto isto, o Governo continua a incensar o povo
com a criação de emprego. Mas não se refere à qualidade desse emprego, quando
de 2011 para cá cresceu o número de trabalhadores a prazo (mais 47 mil) e a
remuneração média registou no mesmo período um miserável aumento de... 20
euros.
Enquanto isto, o Governo fala muito das vantagens do
novo regime contributivo dos trabalhadores independentes. Mas omite que,
na maioria dos casos, os trabalhadores a recibo verde são falsos independentes,
que suportam os descontos para a Segurança Social que os patrões deveriam pagar
(23%) em função da sua verdadeira condição de trabalhadores por conta de
outrem. Como esconde da opinião pública que a dívida das empresas à Segurança
Social cresceu quase quatro mil milhões de euros entre 2011 e 2016.
O ministério centralista e burocrático que Lurdes
começou e Tiago continuou promoveu o enfraquecimento da capacidade interventiva
e autonómica dos professores e serviu para, de modo populista, apresentar o
Governo como defensor dos interesses dos alunos em detrimento dos interesses
dos professores. Como se fosse possível dissociar uma coisa da outra.
Brevemente,
Governo e sindicatos retomarão as negociações sobre a contagem do tempo de
serviço dos professores. É a derradeira oportunidade para o poder político
entender que não pode promover a qualidade do sistema combatendo a dignidade
profissional dos professores, como o PS fez com Sócrates e Maria de Lurdes
Rodrigues e continuou nesta legislatura a fazer com Costa e Tiago Brandão
Rodrigues. Esta é não só a pedra de toque do sistema de ensino, como a razão
última para que o Governo aceite, finalmente, que há coisas inegociáveis.
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