Está
a tornar-se demasiado evidente que está em curso uma tentativa de aniquilação de um
governo democraticamente eleito num dos países da zona euro. A vontade de se resolver
a crise da moeda única (impropriamente chamada crise grega) é pouca, a menos
que isso signifique a expulsão da Grécia da zona euro. De qualquer maneira, é
notório que as posições de grande dureza reveladas pela “sede do império”
(leia-se Alemanha) começam a sofrer contestação de dentro do campo conservador,
tal é o seu radicalismo! Mesmo em Portugal essas críticas estão a aparecer da
parte de personalidades de quem seria impensável ainda há pouco tempo atrás.
Deixamos
aqui dois excertos de textos assinados respectivamente por João Miguel Tavares e
pelo General Loureiro dos Santos como prova da nossa afirmação.
Já
são demasiados artigos revanchistas, demasiadas declarações emproadas do
Governo, demasiadas bocas do Presidente da República, demasiados se-não-formos
-19-ficamos-18 para o meu gosto.
A
maior parte da direita está com sérias dificuldades em esconder o seu desejo de
chutar a Grécia para fora do euro, e esse é um sentimento que compreendo mal.
(…)
Sobretudo,
esta mania de apontar a porta da saída à Grécia é triplamente chocante.
Chocante,
porque ninguém pode avaliar a dimensão do abalo do Grexit numa união monetária
que era suposto ser indissolúvel. Chocante, porque a direita não pode
transmitir às pessoas uma ideia de Europa resumida à eficácia da moeda única ou
de um conjunto de opções de natureza estritamente económica; a União Europeia é
muito mais do que isso – é um projecto político, um sonho de progresso, um
ideal de livre circulação e de aproximação entre povos. Chocante, porque virar
as costas à Grécia é uma demonstração de insensibilidade por parte da direita,
que deve meter isto na cabeça: pode-se amar a liberdade individual e
reconhecer, em simultâneo, que o aumento das desigualdades é um gigantesco
problema contemporâneo. A Grécia não tem toda a razão – mas alguma razão, ela
tem.
João
Miguel Tavares, Portugal Glorioso (blog)
O que pretendo é chamar a atenção
para o clamor da população grega contra Berlim, que é acusada de prosperar à
custa da crescente miséria dos países do Sul, evidenciando um antigermanismo
acentuado.
(…)
Só a existência de um mecanismo
de transferências compensatórias dos países mais ricos, beneficiados com o
euro, para os mais pobres, por ele prejudicados, poderia atenuar aquilo que
estes sentem como injustiças, gerando um mal-estar difícil de atenuar.
Esta “malaise”
leva os povos a considerar como culpados aqueles que mais vantagens retiram dos
dispositivos existentes, ou seja, os alemães. Como resultado do poder que lhe
atribuem.
(…)
É como se estivéssemos perante um
descontentamento que, de facto, significa uma revolta latente que não se
consegue pôr em acção.
(…)
Mas basta observar Schäuble,
ministro das finanças alemão, cuja insuportável arrogância se manifesta quando,
aparentemente em tom de brincadeira, vai revelando o que pensa realmente sobre
o poder imperial de Berlim sobre os restantes países europeus particularmente
os periféricos. Ao afirmar que talvez valesse a pena falar com o secretário de
tesouro norte-americano, a fim de apresentar a proposta de trocar a Grécia por
Porto Rico.
É contra manifestações de
imperialismo deste tipo que se insurgem os cidadãos de uma Europa que,
infelizmente, se deixou capturar pelas malhas do euro, ficando sem opções
próprias. Parecendo, agora, restar-lhe apenas um único caminho - a obediência
cega aos ditames alemães como “bons alunos”. Em vez de vários países em
idênticas circunstâncias e com os semelhantes problemas conjugarem as suas
posições e procurarem caminhos comuns para conseguirem massa crítica suficiente
e assim poderem influenciar quem tem a última palavra em termos de decisão – a
chanceler alemã.
(…)
Talvez seja a altura de tanto
Berlim como as restantes capitais europeias reflectirem sobre a origem desta
tensão entre os povos do Sul e do Norte, e de tentar pôr-lhe termo, para bem de
todos nós – europeus do Norte e do Sul, de Leste de Oeste.
General
Loureiro dos Santos, Público
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