terça-feira, 31 de dezembro de 2013

O QUE AÍ VEM…



Todos sabemos que o tempo não está para festas e, muito menos para comemorar a mudança de um dia no calendário. O tempo está para nos concentrarmos no que é essencial e esquecermos aquilo com que nos querem desviar as atenções. Não nos iludamos. Fazermos votos de “bom ano” tornou-se uma rotina mas todos sabemos que não passa disso mesmo porque todos temos consciência de que, nem um milagre conseguirá que 2014 nos traga a esperança perdida desde há vários anos. Devemos estar certos de que, para além da propaganda, nem os governantes e a sua clique acreditam que aí virá algo de bom.
O seguinte excerto de um artigo de opinião que José Vítor Malheiros assina hoje no Público exprime de forma clara aquilo que todos sentimos que aí vem mas que vamos tentando esconder de nós próprios.
Falar de mentiras e desilusões é falar das mensagens de Natal de Passos Coelho e de António José Seguro.
Não vale a pena sublinhar a mentira dos 120.000 postos de trabalho inventados por Passos Coelho, mas vale a pena retermo-nos na “recuperação” que se vai seguir à “austeridade”. É verdade que há indicadores económicos que melhoraram e que alguns deles (exportações) são de facto positivos. É verdade que a troika pode não voltar ao Terreiro do Paço a partir de meados de 2014 e que Portugal talvez se possa financiar “nos mercados”. Mas qual é a sociedade que vamos herdar da “austeridade” do governo Passos-Portas? A sociedade que herdaremos será uma sociedade muito mais pobre  do que antes do “resgate” financeiro (em 2013 teremos o mesmo PIB que tínhamos treze anos antes, em 2000) e muitíssimo mais desigual, pois esta brutal perda de riqueza do país em geral foi acompanhada pelo enriquecimento dos muitos ricos, o que significa que os pobres e a classe média sofreram um empobrecimento superior à da média do país. Esta pobreza vai marcar gerações, pois o peso da dívida (que é impagável e terá de ser reestruturada) agravou-se por causa da “austeridade”. A sociedade que herdaremos terá não só muitos mais pobres mas muitos mais pobres-trabalhadores, devido à “compressão” dos custos do trabalho e à degradação das condições laborais. Teremos trabalhadores mais mal pagos em nome da ”competitividade” internacional. Teremos mais trabalhadores obrigados à docilidade pelo medo do desemprego e da miséria. Teremos empresas menos inovadoras pois o medo não incentiva a imaginação, não motiva nem impele ao risco. Teremos talvez menos desempregados oficiais, porque os mais bem preparados emigrarão ainda mais e os menos preparados deixarão de procurar emprego e aceitarão a miséria como destino. Teremos menos e piores serviços públicos. Teremos funcionários públicos humilhados e desmotivados. Teremos um sistema de investigação e inovação descapitalizado e que terá perdido uma geração de altíssima qualificação. Teremos um Estado mais pobre, com menos património, que terá sido passado a bom preço para as mãos de empresas amigas. Teremos mais conflitos sociais e mais violência. Teremos uma maior desconfiança das instituições e dos políticos em geral. Teremos um estado social amputado e instituída a caridade dispensada aos indigentes como forma de “acção social”. Passos Coelho, Paulo Portas e Mota Soares continuarão a sorrir sem vergonha e será cada vez mais difícil garantir às crianças que a indecência não compensa.

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