O
advogado Domingos Lopes cuja opinião se pode ler periodicamente no Público
assina hoje neste jornal um artigo demolidor em relação à suposta reforma da
justiça que está a ter lugar em Portugal pela mão da ministra Paula Teixeira da
Cruz. No dizer deste causídico é tudo fogo de vista e propaganda, como de
resto, se verifica noutros sectores da governação. O cidadão comum, está, muito
provavelmente, desconfiado com o alarido que se está a fazer à volta das penas
aplicadas no processo “Face Oculta” e, após a leitura do texto de Domingos Lopes,
ainda vai ficar mais desconfiado e à espera de alguma nova desilusão relativamente
à celeridade e resultado desta acção judicial.
Em
todo o texto encontramos expressões muito fortes de quem está dentro da
problemática que aborda e que não nos deixam nada descansados. É bem
significativa a afirmação de que o exercício do mandato da ministra Paula Teixeira
da Cruz “não tem passado de um mero exercício de propaganda sem que até hoje
tenha resolvido qualquer problema da pendência nos tribunais”, como se pode ler
a seguir.
Há
anos que os mais diversos governantes declaram ir resolver o problema do atraso
na realização da Justiça e, no entanto, tudo se tem agravado. A Justiça piorou
a ponto dos cidadãos deixarem de crer que ela se possa realizar. Há cerca de
vinte e tal anos, nos inquéritos de opinião, os cidadãos acreditavam nos juízes
e na Justiça. Hoje não creem.
Paula
Teixeira da Cruz passou de advogada no efetivo a ministra da Justiça. Era
suposto ter outra sensibilidade. O exercício do seu mandato não tem
passado de um mero exercício de propaganda sem que até hoje tenha resolvido
qualquer problema da pendência nos tribunais.
Com
grande estardalhaço e ribombante propaganda levou a cabo mais uma revisão do
Código de Processo Civil. Foi anunciado, então, que os processos iam
correr mais céleres e os cidadãos finalmente iriam poder ter justiça.
Anunciou
novos prazos, encurtando-os. A verdade deve ser dita; até hoje tudo como
dantes. Os únicos que têm de respeitar prazos são os advogados. Os processos em
primeira instância continuam parados, ou a andar muito devagarinho, não vá a
justiça acordar e fazer-se.
Sob
o manto das poupanças, mas também para enfraquecer o Estado de direito, a toque
da troika veio a Reforma do Mapa
Judiciário, que consistiu, no essencial, em transformar os distritos em
comarcas e criar nessa nova instância central secções de competência
especializada: secção cível, criminal, de instrução criminal, de família e
menores, do trabalho, do comércio e de execução, enterrando o princípio que os
tribunais de comarca são de competência genérica, com consequências terríveis
para as populações no que toca ao acesso à Justiça.
A
reforma não passa do modo que a troika e os "troikanos"
encontraram de concentrar meios em certos centros e deixar ao abandono uma
grande parte do país, fechando tribunais ou obrigando a deslocações enormes
para fora da comarca dos aí residentes. Este é o ADN da reforma. É a antecâmara
para encerrar novos tribunais com o famigerado argumento do número de
processos.
A
ideia destes governantes e da sr.ª ministra é a de que Portugal vai até cerca
de algumas dezenas de quilómetros das praias para o interior e o resto é
deserto, selva, ou sabe-se lá, rien… Virando costas às populações
envelhecidas (a tal peste grisalha que não morre e fica cara) desamparadas de
meios, sem escolas, sem emergência médica e hospitais, o Governo retira-lhes a
Justiça.
Um
Estado de direito democrático que não é capaz de assegurar a realização da
justiça a uma parte considerável da população e a outra oferece uma má justiça,
não tem futuro. Não é só porque passou a dívida pública de cerca de 98% do
PIB para 134% apesar de tanto sacrifício, é também porque as sociedades não
podem viver sem justiça, caso contrário é a lei da selva pura e dura que
passará a dominar.
A
sr.ª ministra, na segunda-feira, dia 1 de Setembro, assegurou, por volta das
9h, que a partir das 10h a plataforma Citius estaria a funcionar e os processos
que duram quatro ou cinco anos a serem resolvidos passariam a estar resolvidos
ao cabo de quatro ou cinco meses. Estavam tão enredados na sua própria
propaganda que nem se lembraram de fazer testes ao sistema… umas reuniões,
ajustes diretos de milhões et voilá – a reforma.
A
verdade é que o Citius continua sem funcionar na sua plenitude e ninguém
acredita, nem a sr.ª ministra, que os processos passarão a estar findos, na
primeira instância, ao cabo de quatro a seis meses.
A
justiça em Portugal é fraca, atrasada, caríssima e esta reforma dificulta ainda
mais a sua efetivação.
Um
Estado que confisca reformas, que corta em tudo, e também na realização da
justiça é um Estado falhado, um pré-Estado, uma excrescência no mundo
moderno. Na verdade, um Estado que não assegura à população do interior o
acesso a uma justiça, mesmo má, como a que temos, é um perigo para a própria
independência nacional.
Esta
reforma, aliada ao encarecimento brutal das custas processuais, à privatização
da ação executiva que paralisou as execuções, à extrema dificuldade do Estado
conceder aos pobres deste país apoio judiciário para litigar sem pagar custas,
ao atraso do pagamento aos advogados que prestam serviços no apoio judiciário,
é mais uma vergonha.
É a confissão de que este
Estado com este Governo à sua frente não é capaz de assegurar que a máquina da
justiça funcione. É, por isso, uma entidade desestabilizadora da comunidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário