quinta-feira, 18 de setembro de 2014

NOVO E ROTUNDO FALHANÇO


Quando aqueles que mais ideologicamente próximos se encontram do Governo são os primeiros a afirmar que o rei vai nu, não tenhamos as mínimas dúvidas de que o rei vai mesmo nu.
O Governo queria ver-se afastado do caso BES como o diabo da cruz. Toda a propaganda mediática deu uma ajuda a Portas e Passos mas, a verdade é que este “tema maldito”, como muito bem lhe chama hoje Carlos Encarnação, antigo presidente da Câmara de Coimbra, no texto que transcrevemos do Diário de Coimbra, teima em ver-se agarrado à coligação de direita como lapa à rocha. Depois do caso BPN, não há desculpa para um novo e rotundo falhanço na supervisão. Com eleições à vista, não se podia imaginar tema mais incómodo para os responsáveis pelo poder e de mais fácil exploração pela oposição. No entanto, o PS resolveu dar uma ajudinha, com a invenção das directas e uma interminável “competição interna”, da qual o principal beneficiário é o Governo e, o maior perdedor, o país.
Leia-se, então, o texto de Carlos Encarnação.
Diz o Governo, pela boca dos seus dois mais importantes responsáveis, que este caso do BES não ajudou nada a economia portuguesa. La Palice não diria melhor.
Fosse ele caso virgem e admitir-se-ia que tinha sido um acontecimento fortuito, um azar. O problema é que já não é o primeiro do género e os portugueses o que lhes custou o BPN.
No primeiro caso, a supervisão falhou, no segundo também. No primeiro caso, o Governo de então envolveu o Estado directamente, arrastou o processo, adiou a venda. Correu tudo mal. O Banco acabou por ser vendido por um valor residual e já por este governo. A autoria da solução discutível pertenceu a uns, a parte mais controversa e difícil que se lhe seguiu coube a outros.
No caso BES, ninguém pretendia que o filme anterior se repetisse.
O governo entendeu que o Estado não devia envolver-se directamente, colocou a condução do processo nas mãos do Banco de Portugal, chamou outros Bancos a participar no Fundo.
Entretanto, o Governador do Banco de Portugal ficou sozinho em palco.
Nomeou uma nova administração, definiu o conteúdo da missão, concordou com a indicação de que o elemento confiança devia ser mais importante e permitiu o relançamento do Banco bom com novo nome e símbolo. O jornalismo económico, o mesmo que não conseguiu nas suas investigações aturadas que um Espírito Santo de orelha lhe tivesse transmitido o prenúncio da tragédia do GES, exultou.
A actuação havia sido pronta, a solução era boa, a equipa escolhida melhor. E era.
Só que alguma coisa induziu alguém em erro ou todos não foram capazes de antever as consequências óbvias.
O Banco bom paralisou, os Bancos envolvidos corriam o risco de aumentar a sua responsabilidade, o BES iniciou a trajectória da perda de valor.
A solução pensada, sem meios para ser levada a efeito, entrou em crise.
Com a manutenção da situação entretanto criada, o processo de alienação do BES, protelada esta no tempo, teria o mesmo destino do BPN. E, todavia, estavam em jogo 4900 milhões de euros.
Declarada a crise com a demissão da equipa de Vítor Bento, o Governador do Banco de Portugal entrou em perda e o governo, que tinha ensaiado a transferência da responsabilidade para as mãos daquele, realizou que não podia fugir a envolver-se.
Por esta incomodidade de ser esse mesmo governo obrigado a comentar publicamente o caso e a ser questionado pelas consequências políticas do acontecido.
Em termos pré-eleitorais este é um tema maldito. E, mais uma vez, a venda tem de ser rápida e gerar o valor suficiente para que os tais milhares de milhões não venham a ter de sair de outro sítio. O governo não pode permitir adiamentos.
Não podia, portanto, haver incómodo maior para o governo e, perante ele a crise do Citius da Justiça não passa de um episódio. Uma saída, já, ou o descrédito. Exige-se.
Útil, ao governo, é este extraordinário entusiasmo com as eleições directas do Partido Socialista.
Entretidos com a competição interna, os socialistas falam de tudo e de mais alguma coisa, desde as leis eleitorais às incompatibilidades, do salário mínimo ao Estado Social. Em cada dia há um tema novo que conclama as atenções distraindo do essencial.
 Não valerá a pena aos governantes esgotarem-se me intervenções públicas. Correm o risco de não ser ouvidos ou de poucos prestarem atenção ao que dizem.
É verdade que fazendo, eles também, apelo a uma girândola de questões não deixam muito tempo para reflexões demoradas. Os portugueses limitam-se a olhar para o ar receando que o próximo foguete lhes caia em cima. Uns e outros, poder e contrapoder, confrontados com as soluções para os males da Pátria, oferecem a imagem da curva vadia e delirante de Fradique Mendes. A imaginação ao poder, diziam os revolucionários de Maio 68.
A este slogan estamos chegados, de novo, cumprindo um percurso elíptico da História.

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