Quem
segue com alguma atenção a realidade do ensino em Portugal está farto de saber
que os rankings das escolas não têm qualquer efeito nos resultados escolares nomeadamente
em relação aos alunos das classes mais desfavorecidas. Aliás, o efeito que se pretende
é exactamente o contrário na medida em que a finalidade é beneficiar a classe
dominante, impedindo a ascensão social dos mais pobres. A expansão do ensino privado
faz parte desta estratégia na medida em que só os mais abastados lhe têm
acesso. Aqui, a selecção é muito rigorosa para sejam sempre os mesmos estratos
sociais a dominar a sociedade.
Desta
selecção fazem parte os exames nacionais, tema em análise no texto seguinte
assinado por Joana Mortágua na edição do “Expresso” deste sábado.
Estudo conclui que exames nacionais acentuam as
desigualdades sociais. São os estudantes das escolas mais bem posicionadas nos
rankings que mais procuram centros de explicações.” A notícia é desta semana,
mas a conclusão não é nova. Tem sido reiterada por várias investigações e até
pelo relatório anual do Conselho Nacional de Educação (CNE).
O CNE alerta que seis em cada dez alunos de secundário
procuram explicações privadas para sobreviverem ao exame de Matemática. Com um
reparo final: “É curioso verificar que o país mais rico, a Noruega, tem a menor
percentagem de alunos a recorrer a este tipo de aulas.”
Como todos os parâmetros que habitualmente se
comprimem na expressão “sucesso escolar”, os exames têm uma evidente ligação ao
contexto socioeconómico dos alunos. O seu primeiro problema é a cegueira. Não
querem saber se os alunos são filhos de imigrantes do Vale da Amoreira, se
vivem em barracas sem luz na Trafaria ou se estudam num colégio fino.
Classificam todos por igual.
Os conservadores acham que isto é uma vantagem.
Chamam-lhe “comparabilidade” para disfarçar a seleção social. Como se o sucesso
escolar fosse uma espécie de performance desportiva. Por isso afirmei que, em
vez de um ministro, a direita gostaria de ter uma selecionador nacional de educação.
No fundo é esse o papel dos exames, ignorar o contexto para seriar alunos como
numa competição.
“É preciso olhar para o fundo da tabela”, dirão, sem
questionar para que serve, afinal, a dita cuja. Se o objetivo fosse melhorar as
práticas pedagógicas dos “piores”, Nuno Crato, ex-ministro e fã de rankings,
não teria atribuído professores extra como prémio às escolas que tivessem
melhores resultados nos exames.
Outro problema dos exames é a ignorância. São
incapazes de avaliar quase tudo o que importa na educação. Competências
sociais, raciocínio, criatividade, progresso. Oferecem uma fotografia a preto e
branco tirada a posteriori, quando é preciso um filme de cores vivas e a 3D, em
permanente interação com o presente.
O terceiro problema é o afunilamento. Como num túnel,
a luz do sistema de ensino parece ser a média de acesso à universidade, terra
de cegos onde os exames são rei. As disciplinas que não são submetidas a exame
são desvalorizadas. A evidência de que os trajetos educativos são tão diversos
quanto a imprevisibilidade do futuro leva-nos, e bem, a apostar em
flexibilizações curriculares e perfis empíricos de ensino e aprendizagem. Vale
de pouco quando tudo esbarra no muro dos exames.
Os rankings são o subproduto deste sistema
anacrónico de avaliação que serve mais para classificar do que melhorar as
aprendizagens. Ao não mudar as políticas educativas o Ministério contribui
desgraçadamente para a sua existência, mas é a imprensa quem os constrói e
publica. A sua inutilidade pedagógica é proporcional à propaganda gratuita que
dão aos colégios privados. Porque esses são sempre os primeiros. Os rankings
mostram isso, mas não explicam porquê. Para que servem, então? Há quem se
divirta com corridas de cavalos, mas isso não é educação.
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