domingo, 4 de fevereiro de 2018

RANKINGS, UMA FORMA DE ACENTUAÇÃO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS


Quem segue com alguma atenção a realidade do ensino em Portugal está farto de saber que os rankings das escolas não têm qualquer efeito nos resultados escolares nomeadamente em relação aos alunos das classes mais desfavorecidas. Aliás, o efeito que se pretende é exactamente o contrário na medida em que a finalidade é beneficiar a classe dominante, impedindo a ascensão social dos mais pobres. A expansão do ensino privado faz parte desta estratégia na medida em que só os mais abastados lhe têm acesso. Aqui, a selecção é muito rigorosa para sejam sempre os mesmos estratos sociais a dominar a sociedade.
Desta selecção fazem parte os exames nacionais, tema em análise no texto seguinte assinado por Joana Mortágua na edição do “Expresso” deste sábado.
Estudo conclui que exames nacionais acentuam as desigualdades sociais. São os estudantes das escolas mais bem posicionadas nos rankings que mais procuram centros de explicações.” A notícia é desta semana, mas a conclusão não é nova. Tem sido reiterada por várias investigações e até pelo relatório anual do Conselho Nacional de Educação (CNE).
O CNE alerta que seis em cada dez alunos de secundário procuram explicações privadas para sobreviverem ao exame de Matemática. Com um reparo final: “É curioso verificar que o país mais rico, a Noruega, tem a menor percentagem de alunos a recorrer a este tipo de aulas.”
Como todos os parâmetros que habitualmente se comprimem na expressão “sucesso escolar”, os exames têm uma evidente ligação ao contexto socioeconómico dos alunos. O seu primeiro problema é a cegueira. Não querem saber se os alunos são filhos de imigrantes do Vale da Amoreira, se vivem em barracas sem luz na Trafaria ou se estudam num colégio fino. Classificam todos por igual.
Os conservadores acham que isto é uma vantagem. Chamam-lhe “comparabilidade” para disfarçar a seleção social. Como se o sucesso escolar fosse uma espécie de performance desportiva. Por isso afirmei que, em vez de um ministro, a direita gostaria de ter uma selecionador nacional de educação. No fundo é esse o papel dos exames, ignorar o contexto para seriar alunos como numa competição.
“É preciso olhar para o fundo da tabela”, dirão, sem questionar para que serve, afinal, a dita cuja. Se o objetivo fosse melhorar as práticas pedagógicas dos “piores”, Nuno Crato, ex-ministro e fã de rankings, não teria atribuído professores extra como prémio às escolas que tivessem melhores resultados nos exames.
Outro problema dos exames é a ignorância. São incapazes de avaliar quase tudo o que importa na educação. Competências sociais, raciocínio, criatividade, progresso. Oferecem uma fotografia a preto e branco tirada a posteriori, quando é preciso um filme de cores vivas e a 3D, em permanente interação com o presente.
O terceiro problema é o afunilamento. Como num túnel, a luz do sistema de ensino parece ser a média de acesso à universidade, terra de cegos onde os exames são rei. As disciplinas que não são submetidas a exame são desvalorizadas. A evidência de que os trajetos educativos são tão diversos quanto a imprevisibilidade do futuro leva-nos, e bem, a apostar em flexibilizações curriculares e perfis empíricos de ensino e aprendizagem. Vale de pouco quando tudo esbarra no muro dos exames.
Os rankings são o subproduto deste sistema anacrónico de avaliação que serve mais para classificar do que melhorar as aprendizagens. Ao não mudar as políticas educativas o Ministério contribui desgraçadamente para a sua existência, mas é a imprensa quem os constrói e publica. A sua inutilidade pedagógica é proporcional à propaganda gratuita que dão aos colégios privados. Porque esses são sempre os primeiros. Os rankings mostram isso, mas não explicam porquê. Para que servem, então? Há quem se divirta com corridas de cavalos, mas isso não é educação.

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