A
publicação dos chamados ranking das escolas faz todos os anos correr muita tinta
onde são emitidas as mais variadas opiniões sobre o assunto. Há uma contestação
muito forte que tem sobretudo a ver com a seriação em si mesma. O escalonamento
das escolas através dos critérios altamente discutíveis compara aquilo que não
é comparável e cria disfunções inadmissíveis. O que não se entende é que, sendo
alvo de tanta contestação, este anacronismo ainda não tenha acabado. Não é por
acaso que a direita os defende com unhas e dentes pois constitui uma forte
publicidade gratuita ao negócio do ensino privado.
Ontem
deixámos aqui a transcrição da opinião de Joana Mortágua retirada do Expresso deste
sábado e hoje apresentamos uma interessante opinião de um professor e pai (*) capturada
no “Público” de domingo.
Em primeiro lugar, quero agradecer ao jornal PÚBLICO este
exercício de liberdade, em segundo lugar, reconhecer que os seus profissionais
passaram horas e horas a analisar resultados para que todos nós conhecêssemos
os rankings escolares.
Caros jornalistas e leitores, permitam-me a provocação…
Qual é a diferença entre a escola 320 e a escola 381
(garanto-vos que nem fui ver quais são!)? Será que a escola 320 é melhor,
efetivamente, do que a escola 381? Atenção que ao dizer escola não me refiro a
um dado momento cristalizado num exame mas sim a toda a comunidade escolar
feita de alunos, professores, pais, encarregados de educação, funcionários e
diretores. É que os rankings, direta ou indiretamente, passam uma imagem
simplista e extremamente redutora - a escola 320 é melhor do que a escola 381.
Os rankings são imagem, os rankings são ego, os rankings são
humilhação, os rankings são uma parte ínfima da realidade. Não acreditam?
Pois bem… os rankings mostram o aluno que gastou centenas de
euros em explicações?
Os rankings mostram o aluno que esteve exposto ao frio e ao
calor, quer na escola, quer em casa?
Os rankings mostram o aluno que sofreu privações de todo o
género?
Os rankings mostram o aluno que assistiu ao pai bater na mãe,
aos irmãos que teve de cuidar, enquanto abdicava do seu tempo para se preparar
devidamente para o exame?
Os rankings mostram o aluno que teve como colegas alunos
indisciplinados ou professores que não conseguiram dominar a turma?
Os rankings mostram o aluno que esteve inserido em turmas
pequenas/grandes?
Os rankings mostram o aluno que não teve professor durante
semanas/meses?
Os rankings mostram o aluno que anulou a matrícula?
Os rankings mostram o aluno retido?
E podia continuar…
Lembro-me, como se fosse hoje, de uma conversa que tive com um
diretor que, tendo visto a sua escola subir em flecha nos rankings escolares,
disse: “Alexandre, preferia mil vezes não ter uma taxa de reprovação de 30% no
secundário, do que estar aqui a ser contactado pela comunicação social sobre o
brilharete de ser subido umas centenas de lugares no ranking”.
Este ponto é muito importante e seria muito interessante colocar
uma coluna com a percentagem de alunos retidos ou mesmo a percentagem de alunos
que concluíram a escolaridade obrigatória sem qualquer reprovação.
E o que dizer da comparação, incomparável, da classificação
externa com a interna? Talvez a população em geral desconheça, mas a
classificação interna resulta do somatório de uma parcela que avalia o
conhecimento - 60, 70, 80 % da nota total - a uma parcela que avalia atitudes e
valores - 40, 30, 20% da classificação total. A classificação externa, ou seja,
os exames, avaliam somente o conhecimento que, nessa situação, tem um peso de
100%. Então por que raio comparam as duas avaliações? Se nem os critérios de
avaliação interna são iguais entre escolas?!
Portanto, comparar o que não é comparável é um absurdo total,
uma falácia, ou como se costuma dizer na política, uma não verdade.
A escola é muito mais, mas mesmo muito mais do que uma pauta.
Enquanto professor, valorizo tanto aquele aluno que supera as suas dificuldades
para atingir uma classificação positiva como aquele que atinge uma
classificação elevada. Tudo depende do ponto de partida, mas ambos estarão de
parabéns!
Os rankings tornaram a escola escrava dos exames, tudo gira à
sua volta. Os rankings e os exames deturpam aquilo que é essencial e a
verdadeira obrigação da escola, ensinar/aprender, formando, indo ao encontro
das caraterísticas individuais dos alunos, tornando-os melhores e mais preparados
para a sociedade em geral. Os rankings e os exames tornaram-se um espetáculo
mediático numa sociedade que transformou a Educação num negócio, onde se
compara aqueles que têm os melhores ovos com aqueles que nem têm supermercado
para os comprar…
Os rankings estão a mais, prejudicam a escola, uma escola que é
de todos e devia ser defendida por todos.
(*) Alexandre Henriques
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